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"O CAMPINHO DO GINÁSIO DIOCESANO"

Eronildo Barbosa (foto)
Por Eronildo Barbosa*
Estive em Pombal na semana passada. Fui matar a saudade dos amigos e familiares que não via há algum tempo. Minha passagem pela terrinha foi rápida, porém, suficiente para visitar vestígios de alguns lugares mágicos que tiveram grande importância na minha e na juventude de muita gente. A minha idéia é escrever alguns artigos sobre Pombal para que as novas gerações conheçam parte da história do município pelo olhar daqueles que viveram nele na década de 1970. Que assistiram a chegada da água encanada, da televisão, do rádio, das rodovias asfaltadas, do colégio estadual, do telefone, além de terem curtido os programas do Lord Amplificador e dançado ao som dos Águias no Pombal Ideal Clube.
Na verdade estou seguindo os passos de uma nova safra de pesquisadores da cidade como Wertevam, Jerdivam, José Tavares, Werneck, Luizinho, entre outros, comprometidos com o resgate da história oral e documental da sua terra. Escolhi, nessa oportunidade, o “campinho” do ginásio para tecer algumas considerações sobre as centenas de tardes que passei ali, ao lado de outros moleques da minha idade, cuja preocupação principal era se divertir jogando bola. A política não tinha entrado ainda no meu sangue. No início da década de setenta, para nossa turma, o campinho do ginásio era a mais importante praça de esporte da cidade.
Quem passa hoje pela lateral do antigo ginásio, agora Colégio Polivalente, não sabe que, todas as tardes, após às 15 horas, dezenas de jovens se reuniam ali para viver as emoções que só uma partida de futebol pode oferecer. A clientela era formada por adolescentes na faixa dos 13 aos 15 anos, mas participavam também atletas mais velhos, aqueles que não conseguiam vaga para jogar na quadra do ginásio, onde se reuniam os amantes do futebol de salão, entre eles, o diretor do ginásio, Padre Martinho Salgado, dono de uma discreta habilidade dentro das quatro linhas.
A nossa cancha, como chamavam os locutores da época, tinha algo em torno de 30 metros de fundo, por 15 de largura, era de terra batida, embora em alguns lugares tivesse restos de grama. As traves eram de pedras, mas serviam também as nossas sandálias, hawaianas, ou nossas camisas já que todo mundo jogava nu da cintura para cima. Os jogadores que vinham do centro da cidade entravam no campo por uma abertura que existia no antigo muro, antes, pórem, tinham que ultrapassar um riacho que margeava nossa arena (hoje ele corre dentro de uma galeria) se equilibrando em cima de pedras. Esse esforço era parte do processo de aquecimento dos boleiros. A bola não era de couro. Jogávamos com uma de plástico, muito boa, pesada, cuja marca eu acho que era Rivelino, entretanto, Dedé, meu primo, que mora em João Pessoa, jurou de pé junto que a marca era Canarinho. O problema é que ela não podia ver uma arame farpado ou espinho, coisas que não faltavam nas imediações do campo. As partidas tinham duração de quinze minutos, ou saía antes o time que tomasse dois gols. A equipe que ganhava continuava no jogo até perder ou desistir pelo cansaço. Dezenas de jogadores ficavam sentados na base do muro esperando a sua hora de entrar. Nesse interregno, entre outras coisas, aproveitavam para dar o famoso “nó de jabá” nas camisas dos que estavam em campo. Os mais grosseiros faziam xixi no lugar do nó o que dificultava ainda mais o desatamento. Não havia árbitro. Os jogadores é que definiam o que era falta e o que não era.
Havia alguma confusão, mas algo infinitamente menor dos que os jogos com juiz e bandeirinha que assistimos hoje. A vontade de continuar jogando era bem maior que qualquer falta sem maior comprometimento. Não tinha essa história de cair. O que queríamos era fazer gols. Todos sonhavam em ser um jogador de futebol como diz a bela melodia (é uma partida de futebol) da banda Skank. Havia algumas pequenas desavenças, é verdade, mas tudo no limite da ética peladeira. Terminava o jogo, terminava a “treta”. Qualquer diferença era resolvida ali mesmo. Do campo, só levávamos a vontade de voltar no outro dia, na mesma hora,com as mesmas pessoas, para fazer o que mais gostávamos: correr atrás de uma bola. Cada time era formado por cinco jogadores. Os craques, aqueles que todo mundo queria ter no seu time eram Tostão, Butijinha, Durão, Pacote, Memem, Preto, Careca e o negro Gato, pessoa boníssima e ótimo atleta.
Em outro nível, mais baixo, destacavam-se Diar, Didi, Kaka, Miguel, Marinho, Wilson, Dema, Macaco, Odilon, o autor, Zé de Margarida, Dabelo, Jurandir, Sousa, entre outros que o tempo, lamentavelmente, conseguiu apagar da minha memória, mas não do coração. A turma que chegava mais cedo, o autor entre eles, depois de algumas partidas ainda tinha disposição para ir assistir o final do treino do São Cristóvão no campo do Aveloz, antes, ainda mexia com os animais do circo que geralmente ficava armado nas imediações do ginásio. Não esquecia de localizar o melhor lugar para varar a cerca do circo, à noite, e, assim, assistir o espetáculo na “faixa”.
No campo do São Cristóvão vibrávamos com as jogadas de Ridinei, Condida, Mosquito e Panela, com os requebros de Vandeca, além das defesas do “nêgo” Adelson, que mesmo com baixa estatura, foi um dos mais festejados arqueiros da história de Pombal. Aliás, contam os mais velhos que, muitas vezes, na noite anterior ao jogo, a policia prendia “nêgo” Adelson, a pedido dos cartolas do São Cristóvão, só o liberando momentos antes do jogo. Esse recurso, condenável evidentemente, era adotado para evitar que ele enchesse a cara de cachaça no dia do jogo.
Voltando ao nosso campinho, quando o jogo terminava por volta das 17:30 horas, muitos iam beber suco ( que mais parecia tinta) no bar do Lelê, comer pão com creme na bodega do Toinho, ou tomar banho nas três pedras do rio, lugar que, até hoje, nunca consegui encontrar outro igual.
Esse campo de futebol, como outras coisas de Pombal, apesar de estar muito longe, moro em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, continua nas minhas lembranças, alertando-me, sempre, como um fiel guarda, que minhas raízes, fortes e boas, estão sediadas na terra de Maringá. Até o próximo. Um forte abraço aos velhos boleiros do campinho.
*Professor universitário. Campo Grande - Mato Grosso do Sul.
Em, 16/04/2009.
"O CAMPINHO DO GINÁSIO DIOCESANO" "O CAMPINHO DO GINÁSIO DIOCESANO" Reviewed by Clemildo Brunet on 4/17/2009 04:27:00 AM Rating: 5

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