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O MUNDO LÚDICO DO CIRCO: Magia, Graça e Beleza.

Prof. Vieira (Foto)
FRANCISCO VIEIRA*
Hoje tem espetáculo/ Tem sim senhor/ Hoje tem marmelada/ Tem sim senhor...”
Com este bordão que se tornou característico era anunciada a chegada de mais um circo. Motivo de festa na cidade, principalmente para a criançada. O anúncio não só movimentava como revolucionava a população, contagiando todos de ansiedade, desde os mais jovens até os mais idosos.
Lembro-me ainda: palhaços caminhavam suspensos em enormes pernas-de-pau e se agigantavam numa altura fora do comum. Numa altura colossal davam demonstração de equilíbrio desafiando a lei da gravidade. Eram habilidade e arte juntas contrariando os princípios científicos, isto é, a tendência natural das coisas. Assim, percorriam as ruas acompanhados de lindas garotas - verdadeiras belezas esculturais – malabaristas, mágicos, domadores que exibiam suas aptidões como atração e prenúncio do que seria apresentado a partir da estréia. Era uma maneira de garantir a presença do público e a certeza do aplauso – maior recompensa para o artista.
Dessa forma o homem de pernas-de-pau utilizando-se de um megafone chamava a atenção de todos, ao tempo em que recebia o indispensável apoio logístico da meninada que feliz engrossava as fileiras e acompanhavam o cortejo, muitos deles descalços e sem os consentimentos dos pais. Portanto, um grupo de participantes espontâneos que se manifestava numa felicidade sem concorrente e aos gritos completava o velho bordão: “hoje tem espetáculo/tem sim senhor/hoje tem marmelada/tem sim senhor/e o palhaço o que é?/é ladrão de mulher”. Finalmente, estava anunciada a chegada do circo; estava montado o gigante de lonas para a sua estréia. Com seu aspecto majestoso e estrutura monumental estava pronto para recepcionar os admiradores da arte. Enfim, era chegada a hora. E o circo estreava. Em sua volta, vendedores ambulantes ofereciam os mais variados produtos: sorvetes, picolés, balas, chocolates, pipocas - melhor aquela preparada no momento – e algo mais que pudesse controlar a paciência do espectador e distraí-lo.
Nesse ínterim, os espectadores começavam a chegar engrossando a fila. Enquanto alguns chegavam sozinhos outros se apresentavam formando casais. E, à medida que chegavam, tomavam seus devidos lugares se dividindo naturalmente conforme a condição financeira, posição social ou até mesmo a preferência da cada um. Naturalmente que alguns se acomodavam em camarotes, lugares de destaque, enquanto outros em cadeiras simples ou finalmente nas arquibancadas que nós chamávamos de poleiros, por conseguinte, lugar mais barato. Enquanto isso, alguns desprovidos de recursos financeiros, usavam de suas artimanhas e às escondidas entravam saltando a cerca de proteção burlando a atenção dos guardas ou conivente com eles. Nessa trama, como numa má sorte, alguns eram flagrados e numa cena humilhante postos para fora.
Bem, aí sim, no horário previsto começava o tão esperado espetáculo. Eram mágicos, malabaristas, trapezistas voadores, domadores, ilusionistas e outros todos assistidos por vedetes – cujas belezas enchiam os olhos e despertava a atenção dos homens, causa de ciúmes e brigas aos casais mais inseguros. Evidentemente que no elenco era indispensável a presença do palhaço – o artista do riso – que se intercalava entre as atrações fazendo o público gargalhar com suas peripécias. O palhaço, tido como ladrão de mulher manifesta-se como mensageiro da alegria, protagonista do riso. Ele rouba sim, a tristeza das pessoas. São mais que artistas, pois são capazes de transformar este sentimento em momentos de felicidade e descontração. Vestido a caráter: nariz longo e vermelho, roupa folgada e mal confeccionada, boca grande, botas enormes e por cima desencontradas. Enfim, com a cara pintada como um disfarce para esconder o homem que há em si e inibir os seus problemas, nessa transformação promove paz e alegria tornando todos iguais no mundo do riso.
Mas, o circo não se resume a isso. Seu sentido é maior, mais amplo. E, como se não bastasse, para coroar de êxito e ratificar sua grandeza a segunda parte se evidencia com a arte cênica. Compreende a exibição de peças teatrais que se dividiam entre dramáticas e que muito bem apresentadas contagiavam de emoções. A título de exemplo podemos citar: A escrava Isaura, O céu uniu dois corações, Sansão e Dalila, O Direito de nascer e outras, além do casamento do palhaço, destaque entre as comédias. Em síntese é a confirmação de que o papel do circo é infinito, pois sua amplitude vai além do sentido cultural e do encantamento. O circo nos leva ao imaginável nos fazendo sonhadores, pois emociona e diverte. É um mundo de alegria, magia e luz.
Pombal foi palco de grandes circos, desde os mais simples aos mais bem estruturados. Foram circos de diferentes níveis que deixaram marcas e lembranças jamais esquecidas. Lembro-me perfeitamente: os primeiros eram armados na rua de baixo e depois na rua Francisco Bezerra, mais precisamente, defronte ao Centro Municipal de Educação ou ainda no pátio da estação. Foram tantos que é impossível enumerá-los sem cometer o pecado da omissão. E, diante dessa impossibilidade, faço referência a alguns sem desmerecer os demais. Assim, mergulhado nesse oceano de recordações, lembro-me inicialmente do Circo Búfalo Bill que nos idos de 50/60, conquistou a simpatia da região pela sua qualidade artística. No elenco se destacava o casal galã Charles e Mércia, a dupla caipira Quita e Brocoió que muito se eximia no humor e na música e ainda Pindoba, palhaço e anão, portanto, agradava em dose dupla. Como esquecer o Circo Bartollo com sua majestosa estrutura e o palhaço Banzé mostrando-se perfeito na dublagem de Roberto Carlos.
Realmente é impossível não lembrar o Circo Umuruarama com o palhaço Batatinha. Permaneceu em Pombal o tempo recorde de 45 dias – tempo suficiente para adquirir nova cobertura. Fato inusitado. Enfim, lembramos o circo Paris, Ringle, Continental, Garcia, Portugal, Thiane, Americano, Borborema e muitos outros de igual valia e que deixaram muitas lembranças. Conseqüentemente, nesse emaranhado de lembranças permanecem vivas em nossas memórias os palhaços Banzé, Facilite, Chambrego, Batatinha e outros.
O circo está intimamente ligado a história da humanidade, pois sua origem remonta aos tempos mais antigos. Muitos dizem ter surgido na China devido a descoberta de pinturas de acrobacias com mais de cinco mil anos. Sabe-se também que na antiga Roma, sob a influência grega, o circo era uma área circular construída exclusivamente para shows, principalmente, corrida de bigas (tipo de carro romano com duas rodas e puxado por cavalos em dupla), exibição de animais adestrados e luta entre gladiadores, prática que enchia de vaidade e orgulho o ego dos imperadores e sua corte. Com a queda do império romano o circo sofreu vertiginosa decadência que culminou com o seu desaparecimento, restando apenas alguns artistas itinerantes.
Enquanto isso, no Brasil, o circo iniciou sua história no Séc. XIX, por meio de algumas famílias oriundas da Europa, assim como os ciganos que também vieram de países europeus onde eram perseguidos e aqui fizeram as primeiras apresentações.
Como uma medida de justiça e reconhecimento ao seu imensurável valor artístico, o circo tem seu dia especial – 27 de março – data em que se comemora o nascimento do palhaço PIOLIN, nascido em Ribeirão Preto – SP e que fora consagrado como um dos maiores artistas do riso por sua alegria contagiante e acentuado poder de criação. Além do mais, o circo tem recebido importante apoio e incentivo – ainda pouco para a sua importância - por parte dos poderes públicos, graças ao que resultou em 1.977, em São Paulo, a criação da Escola de Circo Piolin – primeira instalada no Brasil e posteriormente em 1982, a Escola Nacional do Circo no Rio de Janeiro.
Entretanto, é evidente que o circo sofreu mudanças ao longo de sua história tendo adquirido uma nova conotação. A ele foram inseridas outras linguagens, tais como a dança e o teatro, se bem que a música sempre fez parte da tradição circense.
Assim, com este breve relato, fica expressa a minha admiração e respeito ao circo. É patente o meu reconhecimento - daí, minha homenagem – pela sua importante e relevante colaboração a nossa cultura no aspecto físico-corporal e, sobretudo, pela eficácia como instrumento para uma vida de melhor qualidade.
Como fã incondicional almejo que o circo continue sempre ativo na arte e entretimento, qualidades que diverte um número incalculável de pessoas desde o seu surgimento. Que o mundo lúdico do circo mantenha forte seu caráter fantástico que envolve várias gerações num só tempo: pais, filhos e netos.
Bem, vou parar por aqui, pois de repente me vejo criança. Em que pese ser a saudade um sentimento de dupla ação que exprime melancolia e prazer, resisto aos seus efeitos, daí, como saudosista assumido prefiro lembrar disposto a arcar com as conseqüências da recordação.
Que se dê ao circo especial atenção. Que se confirme sua pujança, o que lhe fez resistir e crescer com o tempo em consonância com a evolução e ratificar absoluto ser ainda a melhor forma de entretimento para quem gosta de diversão e admira a arte.
Enfim, conclamo a presteza de todos pela preservação do circo, este mundo alucinante que reúne magia, graça e beleza.
Que as cortinas nunca se fechem.
Viva e ajude a manter o circo vivo.
*Professor e ex-Diretor da Escola Estadual João da Mata de Pombal.
O MUNDO LÚDICO DO CIRCO: Magia, Graça e Beleza. O MUNDO LÚDICO DO CIRCO: Magia, Graça e Beleza. Reviewed by Clemildo Brunet on 4/01/2009 07:47:00 PM Rating: 5

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