banner

QUE FALTA DE BOM GOSTO

PROF. FRANCISCO VIEIRA*
O gosto é um sentimento comum que consiste na satisfação ou prazer de apreciar algo ou alguma coisa. Sabe-se, entretanto, que se manifesta nas pessoas de formas diferentes, bem particular. Assim, o que agrada uns pode desagradar outros; o que pra você é mau gosto, para outros é maravilhoso ou no mínimo normal. Em que pese o adágio: “questão de gosto não se discute”, ser um pensamento que implica em respeitar a diversidade de idéias, infelizmente, há certos gostos estranhos que caracterizam verdadeiros absurdos.
Fazendo uma relação do tema enfocado com a música nos dias de hoje, observamos um quadro no mínimo preocupante, pois é evidente o mau gosto das pessoas no que se refere à preferência musical. É lamentável, mas a música de boa qualidade, aquela que toca naturalmente o emocional, sem nenhuma explicação, justificável ou convincente, vem desde muito tempo cedendo espaço para gravações que surgem diariamente aos montes, todas desprovidas da menor expressividade. Na verdade se constituem uma afronta a nossa cultura e um atentado aos bons costumes.
Estudo científico norte-americano bem recente comprova que a pessoa ouve o que pensa. Comparando, pois o gosto musical de alguns estudantes constatou-se a coincidência de resultados relacionados ao nível musical de sua preferência. Verificou-se, portanto, a obtenção de altas notas nos que ouvem Beethoven e inversamente, isto é, notas baixas nos adeptos de Lil Wayne, respectivamente, o que poderia se chamar de chic e brega em matéria de música aqui no Brasil. Sabe-se, entretanto, que exames dessa natureza medem apenas a condução do indivíduo na escola, por conseguinte, não representa sua inteligência nem muito menos a genialidade. Contudo, é por demais preocupante, já que a questão se refere à influência que a qualidade musical pode causar no comportamento humano. Mais preocupante ainda é o fato de que a música de má qualidade provoca um ciclo vicioso, alienador, sem fim, que acaba inesperadamente levando a pessoa a ouvir e valorizar coisas do tipo Latino, Lacraia ou algo semelhante.
Na verdade, nossa música vive uma crise sem precedentes. Padecemos as conseqüências de interesses vis da indústria fonográfica em coloio com os meios de comunicação; sofremos os efeitos da insanidade econômica, que valorizando os lucros em detrimento ao talento descartam e subestimam o que temos de melhor. O que vemos são bandas de pagode – falsos sambistas – forró e afins, sem a menor autenticidade musical e artística. E, o que é pior: em avançada ascensão, pois a mídia lança pseudo-artistas que se dizem cantores – de péssima qualidade – e cantando composições do mais baixo nível se tornam ídolos de um público de mau gosto, que se satisfaz com tão pouco, com o mínimo, como o nada, com o pior. Paralelamente, artistas de renome, ídolos do passado, procuram às duras penas nos dias atuais um lugar ao sol. A título de exemplo, Moacir Franco trocou a música pelo humorismo e, pasmem Agnaldo Timóteo, para vender seus discos percorre as ruas do Rio de Janeiro, como um peregrino. É artista e camelô ao mesmo tempo
De fato, a crise existe, atingindo de forma generalizada e sem discriminação todos os gêneros musicais. Até mesmo a linha liderada por Gil e Caetano, também sofre suas conseqüências. Esse gênero, que fora popularizado no passado e sobreviveu como uma fortaleza a recessão imposta pela ditadura, hoje, acha-se submissa à libertinagem e a degradação da língua portuguesa se declinando aos níveis mais baixos da promiscuidade cultural. Assim, a MPB, como música de qualidade, está à margem da preferência, portanto, vítima do sucateamento e do mau gosto musical, foi lançada a segundo plano, ao último ou a nenhum. Propositadamente me vêm à lembrança os memoráveis festivais que revelaram talentos que se imortalizaram como: Elis Regina, Vandré, Chico Buarque, Edu Lobo, Gonzaguinha e tantos outros que pela qualidade de suas composições foram rotulados e injustamente perseguidos pelo regime militar.
Infelizmente o brasileiro é cúmplice desse processo de destruição; é responsável quando descarta nossos valores em troca de outros sem o menor teor expressivo. A propósito, enquanto no Brasil se faz filas quilométricas para assistir Madona, expurgo cultural ao lado de Michael Jackson para Ariano Suassuna, a Bossa Nova, movimento musical brasileiro ainda representa muito bem o país pelo mundo, tocando na América do Norte, Canadá, México e outros países. É contraditório e inexplicável.
A música em sua essência é mais que uma arte; é Divina. Ela toca o emocional, pois fala de amor, de paixão, fala de tudo que é sentimento. Sua dimensão é infinita. Cada uma lembra algo, marca um relacionamento, um fato, um momento. É a melhor maneira de recordar. Até mesmo a música brega, como gênero popular, na pureza e simplicidade de suas mensagens tem seus méritos – reconhecidos por uns e criticados por outros – pois é cultura, expressão e retrato sentimental do povo. Música, não é uma composição qualquer - qualidade é preciso. E, qualidade, exige: originalidade, criatividade, letra, harmonia e mensagem. São requisitos fundamentais que se completam com uma voz vibrante, agradável.
Diante desse quadro não podemos cruzar os braços em sinal de acomodação e compartilhamento, atitude que caracteriza omissão, que significa fraqueza, covardia. Seria ainda abreviar o tempo de vida de algo que está debilitado ou a falência total do que se acha em decadência. E, mais ainda, seria jogar ao léu a riqueza cultural que dispomos em forma de música e dança, ambas, manifestações rítmicas que sensibilizam, emocionam, comovem e encantam – o próprio êxtase. Longe de mim qualquer imposição ou influência vã; antes o respeito à variedade de pensamentos, pois como averso ao radicalismo, não me permito exigir dos outros a mesma visão. Contudo, mesmo respeitando a posição de cada pessoa, em especial a diversidade de gostos, alguns são extraordinariamente extravagantes, sem nexo, sem sentido – pra não dizer ridículos. Seguindo essa lógica, o que dizer do gosto de ouvir músicas como: “Eguinha Pocotó, Creu, Maionese, Baba Baby, Dança do Quadrado” e outras no mesmo nível de mediocridade e vulgaridade. É gostar do que não tem gosto. É que nossa cultura consumista se manifesta em diversos aspectos, inclusive na música, onde se mostra vazia, permitindo ao homem aceitar de bom grado o que há de mau gosto.
Para vencer o mal a maneira mais eficaz é combatê-lo não deixando que ele cresça. Prevenir é preciso; evitar é necessário, pois do contrário outros “Creus e Eguinhas Pocotós” virão, outros Latinos e Lacraias surgirão, para poluir as mentes sãs, maculando a Música Popular Brasileira. Caso contrário continuaremos sentenciados ao desprazer de ouvir eternamente a nossa volta esse tipo de mau gosto. Dessa forma, entre outras coisas teria o prazer de não mais exclamar: QUE FALTA DE BOM GOSTO!
*Ex-Secretário de Administração e Ex-Diretor da Escola Estadual João da Mata.
Pombal, 30 de maio de 2009.
QUE FALTA DE BOM GOSTO QUE FALTA DE BOM GOSTO Reviewed by Clemildo Brunet on 5/31/2009 09:05:00 PM Rating: 5

Nenhum comentário

Recent Posts

Fashion