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POMBAL - SEU PASSADO FAZ HISTÓRIA I

Francisco Vieira*
Hoje, reabri o baú das recordações onde penetrei profundo. Numa longa viagem retornei às origens. Ai vasculhei o passado trazendo à tona fatos e lembranças que ainda permanecem vivos na memória.. É que as origens são como raízes; se firmam na base para sustentar e alimentar a história, vínculo do qual não podemos nos desvencilhar. Ninguém foge às origens. Até mesmo distantes elas estão presentes na lembrança. O tempo não apaga.
Segundo a ordem natural das coisas o passado está no presente e este no futuro. Assim como o ontem, o hoje será saudade amanhã. No futuro, tudo será passado. Sem passado e presente o futuro inexiste. Passado, presente e futuro são tempos distintos que juntos constroem a história. Mergulhando encontrei logo de cara muito bem guardadas as memoráveis campanhas políticas entre “Carneiros” e “Pereiras” na disputa pelo poder. Duas famílias tradicionais que mesmo adversárias, se respeitavam mutuamente. A divergência era ideológica, isto é, apenas no discurso, pois na prática era artigo paternalismo de sempre – o favor em troca de voto - o toma lá, dá cá. É que político não dá ponto sem nó. Mas, o bom é que nunca se registrou uma agressão física entre os protagonistas. Briga, só entre os eleitores mais entusiasmados, e, assim mesmo, sem maiores conseqüências.
No início UDN e PSD e depois da reforma ARENA comandada pelo Dep. Chico Pereira – O Cacique Branco do Sertão e MDB, sob a liderança do Dr. Avelino Elias de Queiroga – O Bolinha – médico competente, dedicado à pobreza e seguidor do Senador Ruy e Deputado Janduy Carneiro. No encerramento o povo em passeatas e comícios relâmpagos “varava” à noite. De um lado, representando seus ídolos, os adeptos conduziam galhos de pereiros e do outro, bolas gigantes e rosários de vidros – “a frasqueira” – ou seja, a ralé, como era chamada pelos adversários sempre animados por orquestras improvisadas sob a batuta dos maestros Seu Eliseu Veríssimo, Manoel Donária, Tié e outros.
Continuando a viagem, como estudante, lembrei-me melancólico do Ginásio Diocesano de Pombal. Que bom era vestir a sua farda caqui ou de gala e exibir as iniciais GDP em cor branca, bem visíveis no quepe e desfilar com garbo no Dia da Independência. Sentia-me orgulhoso, mesmo com o sapato apertando, cheio de calos e sob o comando de Prof. Arlindo Ugulino que dava ordem unida com intensa rigidez militar. Ainda mais. Como era constrangedor cumprir à risca a disciplina do Diretor Mons. Luiz Gualberto de Andrade e ter que obrigatoriamente assistir a missa dominical, sempre às sete da manhã, completamente fardado. Faltar, nem pensar. A ausência custava suspensão na certa. Era nada mais que uma forma repressora de evangelizar.
Nesse percurso lembrei-me dos velhos carnavais. A população dividida entre o Pombal Ideal Clube que comportava a elite e a Sede Operária que agregava a classe menos favorecida. Era ricos e pobres separados num só objetivo: diversão. A tarde dava gosto ver o corso. Das calçadas assistíamos a tudo. Era jeeps, caminhonetes e até caminhões percorrendo as praças Getúlio Vargas e Centenário sempre em sentido anti-horário. Famílias inteiras fantasiadas de pierrôs e colombinas faziam incontáveis voltas entoando as marchas e frevos da época. Lembro-me ainda de Manoel e Maurício Bandeira, Hamlet e Nicácio Arnaud, Zé Maria Assis, Aureliano Ramalho, Antonio Bezerra, Dr. Atêncio, Nadir Pereira e muitos outros. Enumera-los é impossível. Enquanto isso, os mais irreverentes eram comandados por Hermínio Neto que desfilava em carro aberto, cheio de pinturas extravagantes destacando a frase: “mãe, tenha distância”. Na verdade todos se distanciavam temendo suas peripécias no volante.
Havia ainda os blocos: “De Sujo, Fuleragem e Foiará” e alguns palhaços que caminhavam solitários e mascarados aterrorizando as crianças. Enquanto isso, à noite os blocos “Formigão” e “Antártica” disputam espaço e a simpatia do público. Faziam mistérios até das fantasias. O encerramento acontecia na manhã da quarta-feira de cinzas no centro da cidade. Ali, todos os foliões de todos os clubes se encontravam e marcavam os últimos passos se despedindo de mais um carnaval que já deixava saudades.
Indo mais profundo no baú lembrei-me de forma bem particular da Família “Espalha” em serenata. Tudo acontecia na residência do casal João Espalha e Zaída, onde eu tinha acesso garantido. Não era doido, mas tinha passagem livre, pois era amigos dos seus filhos mais novos: Joãozinho e Arereu. Era a família in concert. Dava gosto ver Bideca, Chico de Dora, Leonardo e Chico de João Espalha – este recém-chegado do Rio de Janeiro e trazendo as últimas novidades musicais. E, como se não bastasse, a aptidão musical se estendia também ao sexo feminino. Ai se destacava Zoraide com sua voz melodiosa e afinada. Sem dúvidas uma das mais belas que conheço. Sem exagero, não ficava devendo a nenhuma das grandes artistas da época. Era um conforto para os nossos ouvidos.
Com tristeza lembrei-me também da Brasil Oiticica, hoje desativada e transformada em ruínas. Contemplo sua enorme chaminé que se desponta gigante, porém fria, devido à inércia de suas máquinas. Pelo menos não polui e nem contribui para o aumento do buraco na camada de ozônio. E não ouço há tempo o inconfundível apito de sua sirene determinando e regendo com precisão britânica, tal qual o Big Ben, o horário de trabalho dos operários e orientando a população.
Aprofundando-me mais ainda na longevidade lembrei-me das enchentes do Rio Piancó. Pleno inverno. Ao anoitecer, nuvens escuras despontavam no “nascente”. Relâmpagos e trovões anunciavam mais um temporal que logo chegaria para atormentar a população ribeirinha. Era a certeza de mais uma noite mal dormida para os moradores das Ruas de Baixo e do Açougue onde a água já penetrava no quintal das casas. Os mais precavidos e temerosos retiravam seus pertences com ajuda da Prefeitura, de amigos, parentes ou voluntários. Paralelo a tudo isso as devotas de Santa Bárbara, protetora das tempestades se reuniam em oração. Ali, numa demonstração de fé e crendices causadas pelo desespero, defronte a pequena imagem posta à margem do rio, pediam contritas para a água abaixar. Ai chega de repente um primo completamente embriagado e diz em tom irônico e debochado: “vocês tirem essa santa daí, senão ela morre afogada”, causando entre as beatas. E, para inflamar, a população que marcava presença constante na beira dàgua criava histórias do tipo: “o açude de Coremas está perigando arrombar”. E, reforçavam a mentira: “que o engenheiro tinha telefonado para Dr. Avelino”. Eu, na santa inocência de criança, alheio a gravidade da situação, desejava que tudo isso acontecesse. Quanto maior e mais demorada fosse a enchente melhor seria. Coisa de criança. Como achava espetacular ver a chegada das canoas de Olinto e João Orlando chegarem superlotadas e remadas pela habilidade de canoeiros como “Mestre Álvaro” e outros. Era coisa de cinema. Mais espetacular ainda era ouvir meu avô materno dizer que a maior enchente deu-se em 1917, tendo a água alcançado o castelo da rua do rio, próximo ao açougue.
Os fatos aqui narrados em síntese são fragmentos ou retalhos de uma história da qual nos orgulhamos e que está gravada na memória de cada pombalense. Ressurgindo fatos e relembrando pessoas, num gesto de fidelidade às origens enaltecemos seus valores e perpetuamos essa história. Os fatos são tantos que é impossível contá-los de uma só vez. Portanto, aguarde o próximo capítulo. Novos episódios virão. É a confirmação de que em POMBAL – SEU PASSADO FAZ A HISTÓRIA. Pombal, 24 de julho de 2009.
*Professor, Ex-Secretário de Administração e Ex-Diretor da Escola Estadual João da Mata.
POMBAL - SEU PASSADO FAZ HISTÓRIA I POMBAL - SEU PASSADO FAZ HISTÓRIA I Reviewed by Clemildo Brunet on 7/25/2009 11:07:00 AM Rating: 5

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