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POMBAL, POR W J SOLHA

W.J.Solha (Foto)
W. J. Solha
Paulista de Sorocaba, passei no concurso do Banco do Brasil em 1962, com 21 anos, fui ao Rio – onde ficava a sede do BB na época – e, lá, diante de um grande mapa do país com o sertão nordestino crivado de “percevejos” coloridos, soube que aquelas eram as cidades onde havia vagas para os novos funcionários. Nenhuma me dizia nada. Foi quando vi o nome de Pombal e me lembrei da música famosa que falava de Maringá e de um tempo de alegria sem igual, etc etc. “Esta aqui”, eu disse ao encarregado das designações.
Perdido numa fase de indefinições, tendo abandonado a pintura por me considerar medíocre, posso dizer que ao chegar à terra de Leandro Gomes de Barros nasci de novo. O bom emprego me trouxe autoconfiança. A maioridade independente me fez um bem extraordinário. A sensação de pioneirismo, pois em Pombal não havia bancos, foi grande. E como não me sentir bem na cidade? Toda tarde um banho no rio, todo fim de semana uma cachaça com buchada à beira de um açude, toda noite a descoberta de uma pessoa fascinante, principalmente nas rodas de altos papos que rolavam pelas calçadas, marcadamente na Rua do Rio.
Em Pombal fiz grandes amigos, casei-me, estava tranqüilo e realizado... quando comecei a ter uma série de sonhos que Jung classificaria de significativos. Intrigado, registrei um deles no papel e o mostrei ao colega de agência, o José Bezerra Filho, que já escrevia, e Bezerra, empolgado com o texto, mandou-o a um amigo dele, professor de literatura na capital, que o publicou... e assim me tornei escritor. Aí senti uma intensa necessidade de ler... e foi quando a cidade mais me surpreendeu, pois as pessoas liam muito, muito. Do doutor Atêncio levei para casa muitas obras de filósofos e grandes economistas. Doutor Nelson me emprestou a Suma Teológica de Tomás de Aquino. Da biblioteca do colégio onde eu ensinava contabilidade, peguei a coleção de prêmios Nobel. Dona Queru me emprestou Jean Christophe, de Romain Rolland. Li uma enciclopédia e a coleção completa de Somerset Moghan, de Nena Queiroga.
Zé Bezerra tinha toda a literatura regional nordestina e devorei, graças a ele, todo o Jorge Amado, Guimarães Rosa, Zé Américo e Zé Lins, Graciliano, Euclides da Cunha. Graças ao Bráulio Tavares, que esteve na cidade lançando uma coletânea de cordéis de Leandro Gomes de Barros, conheci “A Batalha de Oliveiros contra o Gigante Ferrabrás”, de que acabei fazendo uma peça de teatro com o mesmo nome, montada em Brasília por Ricardo Torres. Ah, e havia a coleção de clássicos do gerente da agência (de que acabei sendo subgerente, depois de quatro anos como chefe da carteira agrícola). Dele devorei Shakespeare, Dostoiévsky, Tolstoi, Dante, Homero, Goethe, etc, etc. Passei um tempo dormindo de meia-noite às três da manhã pra poder botar a leitura em dia.
Aí chegou um colega – Ariosvaldo Coqueijo – querendo montar uma peça sobre a morte do estudante Édson Luís. Isso fez com que me tornasse teatrólogo e, em seguida, ator. Foi assim que nasceu “O Vermelho e o Branco”, feito com a estudantada pombalense, levada ao palco junto de uma peça feita pelo Bezerra, “Canudos”.
Já produzindo contos, romances e teatro, o cinema veio como decorrência natural... e lá fomos nós produzir “O Salário da Morte”, que deve sair até o fim do ano, agora, em DVD (se sair o financiamento solicitado pelo Bezerra ao FIC Augusto dos Anjos ).
Assim, devo a Pombal a realização de um longa-metragem ( pois quase todo mundo da cidade entrou com dinheiro para produzi-lo ), devo aquela minha primeira peça, devo minha estréia como ator de palco e cinema ( pois fiz o papel de pistoleiro, no filme ), devo a origem de meu livro “A Canga”, que nasceu como peça de teatro apresentada lá, devo até a mulher – Ione – e os filhos (Andréia e Dmitri, todos dois pombalenses).
Na verdade... antigamente uma alegria sem igual dominava aquela gente da cidade de Pombal. Lá eu era feliz... e sabia disso.
João Pessoa, 11/09/2005
POMBAL, POR W J SOLHA POMBAL, POR W J SOLHA Reviewed by Clemildo Brunet on 9/02/2009 07:51:00 AM Rating: 5

Um comentário

José Soares disse...

Caros Solha e Coqueijo (espero que ainda esteja vivo),resgatando a memória histórica, gostaria de lembrar que tive o privilégio de assistir a peça que vocês apresentaram em Catolé do Rocha, nos idos dos anos de chumbo. Vocês foram brilhantes!

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