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UMA NOVA VIDA PARA ZÉ LINS DO RÊGO.

Por Paulo Abrantes*

A chama da vocação, quando ativada, promove uma pequena e curiosa explosão nos sentimentos das pessoas. Há mais gente que entende a vocação literária como uma expressão do espírito humano, tal qual a música e as artes plásticas. Com José Lins do Rêgo, não foi diferente. Por influência do sogro, foi nomeado Promotor Público em Manhuaçu, Minas Gerais, considerando-se uma atitude inteiramente oposta ao seu temperamento.

Zé Lins era um homem vibrante, de espírito efervescente, participava ativamente da vida cultural de seu tempo. Atencioso com todos que o cercava, seu jeito extrovertido e de humor contagiante o levava aos estádios de futebol para torcer pelo Flamengo, o time de sua paixão. Pois bem, vendo que ele não tinha nascido para advogar, Naná, sua esposa, é a primeira a aconselhá-lo a deixar o cargo e, pouco tempo depois, eles vêm para o Rio de Janeiro, onde ganham o segundo e igualmente lindo presente de outra filha: Maria da Glória.

José Lins do Rêgo
Nomeado Fiscal de Bancos em Alagoas, José Lins do Rêgo ali ficou com a família durante dez anos, e em 1932 escreveu o seu primeiro romance “Menino de Engenho”. O primeiro de uma série fértil, inspirada e profundamente humana, que lhe viria dar um enorme e merecido destaque na literatura brasileira. Este romance de estréia foi publicado com dificuldade, todavia logo foi elogiado pela crítica.

Encantada com o trabalho do marido, Naná o anima entusiasticamente a publicar o livro e concretiza esta idéia vocacional que se tornara fixa, retirando das economias do casal o dinheiro necessário para o pagamento da edição.

Em conversa com o jornalista José Luiz Lins, primo de Zé Lins e, meu vizinho,   me contou que Naná, desde que se casou, vendo que o marido era um sonhador, um homem inteiramente dedicado às letras, alheio completamente aos problemas da vida prática, assumiu a direção das finanças como um verdadeiro e eficiente “Ministro da Fazenda”, do casal.

Assim, tudo que dependeu sempre de organização ou vigilância aos interesses, estava sob seus cuidados, exatamente para que ele, livre de preocupações, pudesse viver entre seus personagens. Sendo a maior admiradora do marido, não interferiu nunca no seu trabalho literário; tinha ele assim inteira liberdade de pensar e de escrever o que bem entendesse. Os livros, no entanto, não iriam para o prelo sem que os lessem todos e tivessem a sua opinião a respeito.

Acompanhava todas as suas atividades literárias com enorme e sempre renovado interesse. Seus triunfos, suas glórias, suas preferências futebolísticas; deles participava como se também fossem seus próprios.

Em Alagoas, a bênção de Deus novamente desce sobre o lar feliz, com a chegada da terceira filha: Maria Cristina.

Em 1935 mudam-se novamente para o Rio. A sua maior preocupação passa a ser, a formação moral de suas filhas (que crescem plenas de vivacidade e graça), o que consegue plenamente, dando-lhes esmerada educação e sábios conselhos.

No Rio casaram-se suas três Marias, senhoras Henrique de Carvalho Simas, Carlos de Campos Veras e Ilídio dos Santos. Os três netos enriqueceram ainda mais a família; Adriana e José de Carvalho Simas e Cláudia de Campos Veras, nascida na Grécia, onde seu pai servia como diplomata.

“Naná, traz uma

Nova vida para

Zé Lins do Rêgo”.

Dizia o primo, José Luiz Lins, que o apoio de Naná, proporcionou uma nova vida para Zé Lins do Rêgo, e para quem freqüentava a casa do casal era um privilégio. Naquele recanto da Lagoa, naquele ambiente repleto de livros, de quadros, de recordações do Norte, mas sobretudo, pleno de uma simpatia contagiante, é o que melhor se podia avaliar do que representava ser amigo de um tão encantador casal.

José Lins e José Américo
José Américo, que foi uma das suas maiores dedicações na vida, descreveu assim esse aspecto: “Sua mais bela história não será somente da literatura brasileira, mas das grandes amizades que glorificam um coração humano”.

Alcides Carneiro nos contou em pronunciamento, que um dia encontrou-o na rua. “Sem qualquer saudação, como num fim de conversa, perguntou-me com o vozeirão inconfundível: “Sertanejo da Paraíba, você tem medo de alguma coisa?”.

Respondi com a facécia de um escritor francês: “Tenho medo de duas coisas: navalha e apelido”. Ele entrecortou uma gargalhada e retrucou: “Pois eu só tenho medo de doença”. Era esse, verdadeiramente, o seu único medo, que ele acabou vencendo bravamente, paraibanamente. Parece até que a própria doença é que terminou por se intimidar, tantas vezes estacou ante sua disposição, tantas vezes esmoreceu ante sua resistência.

Meus senhores, meus conterrâneos. Não recordemos mais. Recordar não é viver, porque recordar é viver de lembrança, e viver de lembrança é morrer de saudade. No último adeus que lhe dei, com a unção de quem rezasse e ouvisse rezar nos degraus da eternidade, pedi a todos os amigos que continuássemos a falar de José Lins do Rego como se ele estivesse vivo, se desencontrando de nós, nos longos desencontros das grandes cidades”.

Seus livros são adaptados para o cinema e traduzidos na Alemanha, França, Inglaterra, Espanha. Em 15 de setembro de 1955, foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras para a cadeira 25. Em 1957, José Lins do Rêgo morreu (aos 56 anos).

* É Engenheiro Civil e Escritor.
UMA NOVA VIDA PARA ZÉ LINS DO RÊGO. UMA NOVA VIDA PARA ZÉ LINS DO RÊGO. Reviewed by Clemildo Brunet on 8/17/2010 03:10:00 AM Rating: 5

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