banner

ESTADO: DEPRECIAÇÃO SALARIAL

Ignácio Tavares
Ignácio Tavares*

No inicio deste milênio aposentei-me como funcionário público do Estado. Por mais de três décadas estive a prestar serviços, como técnico em pesquisa e planejamento, à disposição da Secretaria de Planejamento. Na minha trajetória, como funcionário público presenciei bons e maus momentos, no que diz respeito o equilíbrio das contas do Estado.

Até o ano de 1983, o Estado, manteve rigorosamente em equilíbrio as suas contas de receitas e despesas. Não havia qualquer desajuste entre os dois lados da equação financeira. Esta equação era perfeita, na exatidão dos números orçamentários, conforme as avaliações realizadas no fim de cada exercício administrativo. Em alguns momentos até houve transferência de sobra recursos orçamentários de um exercício para outro.

Nos ciclos administrativos seguintes, digo a partir de 1983, tudo mudou, pois, a justeza da equação, a envolver receitas e despesas entrou em estado de desequilíbrio. Esse desajuste aconteceu, de forma mais acentuada em 1989. Foi o mais trágico momento da administração estadual.

Pra se ter uma idéia da dimensão da crise instalada naquela ocasião, basta lembrar que Estado esgotou totalmente a sua capacidade de pagamento. Simplesmente não havia dinheiro no tesouro sequer para atender as mínimas despesas de custeio da máquina administrativa.

Foi uma fase dificílima, pois o Estado faliu. As receitas eram expropriadas pelos bancos credores antes que chegassem aos cofres do Estado. Assim sendo, não havia como honrar os compromissos assumidos junto às construtoras, fornecedores, bem como, o pagamento da folha de pessoal.

Em razão dessa situação, o Estado perdeu o crédito junto as instituições financeiras públicas e privadas. Noutras palavras, ao perder a capacidade total de endividamento, como conseqüência reduziu a zero as expectativas de novas operações de crédito de curto prazo, do tipo “antecipação de receitas”, posto que, por vezes seguidas não foi possível honrar os compromissos assumidos com todos os bancos, com os quais realizava esse tipo de operação.

O Estado parou, pra não dizer quebrou. Assim sendo, entre tantas conseqüências maléficas, negativas, a mais grave foi o encerramento das atividades do Banco do Estado, por conta das sucessivas práticas de “Saque a Descoberto”.

O que isso então? O governo autorizava o Banco a pagar a folha de pessoal sem devida cobertura orçamentária. Noutras palavras, o Banco pagava, mas o Estada não fazia a transferência dos recursos equivalentes ao valor da folha de pagamento.

A conseqüência era que, os depósitos a vista, investimentos diversos, inclusive poupanças, ficavam descobertos. Os saques diários realizados pelos clientes ficavam a depender dos novos depósitos realizados. Como o banco não inspirava mais confiança as operações de depósitos e investimentos diversos caíram a níveis desprezíveis.

Em virtude dessa situação, o Banco Central não pensou duas vezes: mandou encerrar as atividades do Paraiban. Foi uma situação de Deus nos acuda. Diante desse impasse o único aceno do governo aos credores era do tipo: devo sim, pago quando puder.

Em 1991, mudou o governo. Ao iniciar o novo ciclo administrativo, o governo que assumiu, se quis por ordem na casa, teve que aplicar um “Choque de Alta Voltagem”, no sentido de restabelecer o equilíbrio fiscal, sem o qual dificilmente seria revertido o caos administrativo instalado no governo anterior.

Sem dúvida a operação de reequilíbrio das contas do Estado foi um parto doloroso. Além da demissão de funcionários excedentes, foi estabelecido um teto salarial, acima do qual nenhum funcionário de carreira podia ser remunerado.

Não há registro na historia administrativa da Paraíba de uma crise de tamanha dimensão. Muitas dívidas a saldar, porém, sem nenhum centavo no tesouro do Estado. Pra se ter uma idéia havia seis folhas de pessoal atrasadas, além dos restos a pagar a fornecedores, empreiteiras, credores, resultantes de compromissos assumidos em razão dos serviços prestados na construção de obras diversas.

As medidas com vistas a equilibrar as contas do Estado estenderam-se por mais de um ano. Enfim, foi restabelecido o equilíbrio. O preço que o funcionalismo pagou foi uma brutal queda no salário médio, em particular do pessoal de nível superior.

Não se pode negar que inflação elevada naquela época foi decisiva para o restabelecimento do equilíbrio das contas do Estado. É fácil explicar o porquê dessa afirmativa. A inflação além de inflar as receitas servia de base para as correções salarias. Para as correções salariais foi adotado um “Índice Corretor” correspondente a 80% da inflação observada a cada trimestre passado.

Vejamos: em razão da defasagem entre a inflação e correções, a massa salarial do funcionalismo, em valores reais, decrescia a cada trimestre. Isso contribuiu para o que governo reduzisse cada vez mais os encargos com a folha de pessoal. Desse modo foi estabelecido o equilíbrio das contas à custa de uma brutal redução salarial em valores reais.

Para ilustrar melhor a magnitude das perdas salariais, tomamos com base o salário de um técnico de nível superior naquela ocasião, cujo valor era equivalente a sete salários mínimo e meio. Essa relação em pouco tempo caiu para três salários mínimos e meio, o que representava uma perda equivalente a pouco mais de cinqüenta por cento

As perdas persistiram nos anos subseqüentes, principalmente depois da instituição do plano real, quando as correções salariais foram zeradas, em particular no período administrativo 1995/2002.

Não se pode negar que algumas categorias conseguiram ganhos reais em razão da força corporativista que ostentavam e ainda ostentam. Da mesma forma outras categorias obtiveram ganhos salariais, por força maior da lei, como é o caso do Judiciário, Ministério público e Tribunal de Contas do Estado, bem como os assalariados baseados em salário mínimo.

As demais, é mais do que lícito dizer que, ainda hoje, muitas categorias funcionais carregam sobre os ombros pesadas perdas alarias impostas ao longo do tempo, por conta da defasagem entre correção salário e a inflação corrente. Convém ressaltar que outro fator responsável pela redução da média salarial foi o excesso de nomeações que inflaram a folha de pagamento.

Na década e oitenta a economia nacional quase que paralisou a geração de novos empregos. O setor público absorveu grande parte da mão de obra excedente no mercado de trabalho, por razões estritamente política. Foi a década do empreguismo no setor publico particularmente nos estados e municípios.

Nunca se nomeou tanto em tão curto espaço de tempo. Como as receitas não cresciam em valores reais, a solução foi reduzir a média salarial para poder pagar os novos funcionários ingressos na folha de pagamento. Assim sendo, nos últimos trinta anos o número de funcionários cresceu acima do que o Estado realmente podia contratar.

Essa situação inviabilizou a definição de uma referencia salarial de padrão dignificante, por classes de atividades, que poderia atender os reais anseios dos funcionários em atividade, bem como a todos quanto desejarem ingressar quadros da administração pública estadual ou municipal.

Estas são as razões históricas porque o Estado paga tão mau a maioria dos funcionários. De um modo geral se a média salarial é baixa, no âmbito do executivo estadual, há salários que fogem a regra. Refiro-me aos funcionários do fisco cuja remuneração, em alguns casos são superiores a dos auditores do Ministério da Fazenda. Nada contra, por isso desejo sucesso nas suas reivindicações, que são legais por estar forma da lei, por isso são mais do que justas.

Por outro lado lamento os baixos salários recebidos pelos funcionários da educação, saúde, segurança pública, bem como os técnicos de níveis superiores. Estes pedem muito pouco em cima de uma base salarial historicamente defasada, aqueles pedem pouco, mas em cima de uma base salarial invejável.

Em resumo, a grande maioria dos funcionários, ao longo do tempo perdeu grande parte da sua base salarial, enquanto uma minoria ganhou até demais. Que se faça justiça social, beneficiando mais os que estão na base da pirâmide salarial do Estado. Também é mais do que justo que, os que estão posicionados no vértice da pirâmide, percam um pouquinho em benefício daqueles que se consideram injustiçados. Apenas isso e nada mais.

João Pessoa, 19 de Novembro de 2011

*Economista e Escritor
ESTADO: DEPRECIAÇÃO SALARIAL ESTADO: DEPRECIAÇÃO SALARIAL Reviewed by Clemildo Brunet on 11/19/2011 07:26:00 AM Rating: 5

Nenhum comentário

Recent Posts

Fashion