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ERIC HOBSBAWM E A PRIMAVERA ÁRABE

Eronildo Barbosa
Eronildo Barbosa*

Um dos mais importantes intelectuais vivos do mundo, Eric Hobsbawm, 90 anos, historiador, brindou seus novos e velhos leitores, nesse final de ano, com uma análise muito esclarecedora sobre os acontecimentos políticos que vem ocorrendo no mundo árabe.

Seu ponto de vista, ancorado no método dialético, indica que continua enxergando como poucos as mudanças que o mundo vivencia. Segue sendo uma destacada autoridade no estudo das revoluções. Suas obras, no essencial, têm como centro a luta dos homens objetivando criar novas relações sociais e de produção.

Vários periódicos publicaram no último dia 31 de dezembro, inclusive o Jornal Folha de São Paulo, uma longa entrevista concedida por Eric Hobsbawm onde ele se diz “contente e aliviado” com o que está acontecendo em alguns países do mundo árabe, com a chamada primavera árabe.

Ele comparou o que vem ocorrendo nessa região com os movimentos econômicos e políticos que aconteceram na velha Europa, a partir do dia 18 de brumário (dezembro) de 1848, que ensejaram, na prática, mudanças liberais importantes na ordem vigente daquelas sociedades milenares.

As manifestações se iniciaram na França, mas, em pouco tempo, varreram quase toda a Europa. No início - conforme nos ensina o experimentado historiador em seu livro A Era das Revoluções - esses movimentos foram aparentemente sufocados pela burguesia que tinha conquistado a hegemonia dos principais Estados daquele continente, porém, no longo prazo, trouxeram avanços siguinificativos.

Essas lutas abriram uma temporada de mudanças políticas relevantes em que novos agentes sociais passaram a participar ativamente da vida dos seus países. Inclusive os trabalhadores por meio dos seus partidos e sindicatos. As teses liberais burguesas enterraram as idéias que ancoraram o feudalismo e o despotismo esclarecido. O voto universal e a separação dos poderes são produtos desses embates.

Ao se reportar às revoluções de 1848, Hobsbawm mandou um recado aos que se interessam pelo tema, ou seja, pelos problemas do Egito, em especial, notadamente a pouca disposição do exército para realizar as eleições e promover as reformas exigidas pelo povo nos seus protestos. Isso não pode ser visto como um grave retrocesso, mas como parte do processo de mudanças, a exemplo de 1848, em que as transformações aconteceram de forma processual. Avanços e recuos fazem parte da história humana. Foi assim que ela chegou até o tempo presente.

Hobsbawm não está dizendo que a história se repete. Apenas que aspectos das manifestações de 1848 podem estar presentes nos acontecimentos de 2010. Embora com outro elenco e com outras formas de luta, o comum entre ambos é que são coisas feitas pelos homens. O motor da história, como afirma o velho Karl Marx, é a luta de classe. É isso o que está ocorrendo no mundo árabe. E foi isso o que ocorreu anteriormente na Europa.

O professor Hobsbawm percebeu que o velho proletariado que lutou na Europa e em outros países do mundo não está presente nas manifestações árabes. Os partidos clássicos de esquerda também não tiveram papel relevante nesses episódios. Ele alerta que "a esquerda tradicional estava orientada para um tipo de sociedade que já não existe mais ou está deixando de existir”. A âncora é o proletariado. Só que este vem diminuindo de tamanho no mundo em função das novas tecnologias e das mudanças no processo produtivo como um todo.

Assim, outros agentes sociais estão dando continuidade aos movimentos revolucionários como podem. As classes médias e os estudantes árabes estão cumprindo seu papel com o grau de consciência política que possuem. Até porque a luta de classe não acabou. A divisão entre pobres e ricos continua. Cada tempo histórico tem seus desafios, seus protagonistas e seus métodos.

Aliás, o uso da internet pelos movimentos sociais foi saudado com muito entusiasmo por Hobsbawm.

Reputo como muito importante essa entrevista. Desejo, como Hobsbawm, que os árabes continuem trilhando seu caminho de lutas e conquistas. Que as potencias imperialistas ocidentais e outras deixem que eles sigam o caminho que permita a construção de sociedades ricas e felizes. Livres de tutelas religiosas e outras.

Feliz ano novo para os amigos e os leitores desse democrático e importante espaço de debate político.

*Eronildo Barbosa é doutor em educação e autor do livro Sindicalismo em Mato Grosso do Sul- 1920-1980. Email EronildoBrasil@hotmail.com
ERIC HOBSBAWM E A PRIMAVERA ÁRABE ERIC HOBSBAWM E A PRIMAVERA ÁRABE Reviewed by Clemildo Brunet on 1/04/2012 10:49:00 PM Rating: 5

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