CINEMA DA CIDADE
Severino Coelho Viana |
Por Severino Coelho Viana*
No meio da turbulência
diária vez por outra surge uma chispa de uma boa ideia, quando há poucos meses,
a Presidente Dilma Rousseff sancionou a lei n° 12.599, de 23 de março de 2012,
criando o Programa Cinema Perto de Você e o Projeto Cinema da Cidade, que a
nosso sentir, esta ação governamental é uma forma de reviver o passado cultural
nos bairros das metrópoles e nas cidades interioranas. Os mais antigos
reacenderão as brasas incandesces do saudosismo, enquanto os mais moços manterão
a chama viva de preservação da cultura de um bom tempo que jamais deverá ser
sepultado.
Uma leitura dinâmica sobre a
vigência da nova lei, o nosso pensamento se voltou para o sertão paraibano,
relembrando os velhos e bons tempos da cidade de Pombal, com o Cine Lux;
Cajazeiras, com o Cine Apolo XI; Sousa, com Cine Gadelha; e a cidade de Patos,com o Cine São Francisco.
Relembramos que, no auge de
nossa adolescência, no tempo em que frequentávamos essas salas, no Cine Lux na
cidade de Pombal, ficávamos esperando ansiosamente o início da projeção
cinematográfica com o frio de emoção que começava com o balançar dos pés e
terminava com a respiração ofegante. Então, quando a exibição finalmente
começava, só se ouviam suspiros. Ir ao cinema era mais do que mágico. Muitos
dos cinemas de calçada preencheram nossa infância com sonhos e fantasias.
Acabaram, porém, tornando-se economicamente inviáveis, frente à concorrência
das salas de shopping, dos videocassetes e DVDs. Depois do fechamento desses
cinemas, muitas comunidades ficaram tristes e sem opções de entretenimento, no
caso das cidades acima mencionadas que perderam aquela bonita movimentação das
pessoas em busca de um bom filme para assistir, ora revivendo os fatos
históricos, as formas de amores inesquecíveis, assimilar as ideias inovadoras
de projeção para o futuro ou a vida selvagem de um Tarzan, com a construção,
revitalização ou implantação de complexos de exibição cinematográfica.
Desde o surgimento do cinema
– com a invenção do cinematógrafo pelos irmãos Lumière, em 1895 – os cinemas de
calçada tiveram profundas relações com nossas cidades. O exemplo mais recente
no Brasil verifica-se em Porto Alegre, parece que a geração do momento atual
está entendendo a importância desta reminiscência cultural, com a restauração
do cinema Capitólio, que se tornará a Cinemateca Capitólio, e do Imperial, que
fará parte do Centro Cultural da Caixa Econômica Federal. Os centros da maioria
das capitais brasileiras estão em decadência, e a vigência desta nova lei
torna-se um passo importante para a revitalização desses locais que podem ser a
volta do trânsito das pessoas em busca de cultura. Quem sabe um “cineminha” não
dá novo ânimo para a vida nas cidades? Sem nenhum problema pode ser acompanhado
de pipoca e guaraná! A criançada adora! E adultos também!
O Cine Lux não era um
patrimônio privado, especificamente, mas um patrimônio histórico-cultural.
Pombal foi uma das primeiras cidades do sertão da Paraíba a possuir um cinema
com a sua estrutura de funcionamento e acomodações dos grandes cinemas do
Brasil. Tudo começou no ano de 1953, quando o construtor Chiquinho Formiga
construiu o Cine Lux, um grande prédio com excelentes condições para projeções
cinematográficas, sendo o local aproveitado para show, teatro, conferências,
debates políticos etc. Em 1956, o cinema é vendido para Afonso Mouta, que
exibiu seu primeiro filme, denominado: “A Mulher que Perdi”, uma película
mexicana, e, logo em seguida, inaugurou as projeções em cinemascope com o
filme: “Os Cavaleiros da Távora Redonda”. A tela grande agora era o orgulho e o
comentário da população pombalense, que tinha no cinema uma nova abertura para
o conhecimento visual dos costumes, da vida social e comportamento de muitos
países nunca antes vistos. No início, a energia era a motor diesel, instalado
no próprio prédio, e o barulho do mesmo sempre denunciava para toda a
vizinhança o início e o término de cada projeção. Porém, o grande sucesso,
devido à compreensão do público em geral, foi na exibição do primeiro filme
brasileiro: “Metido a Bacana”, com Anquito e Grande Otelo. As exibições de
sessão matinal, vesperal, matinês e, naturalmente, com as sessões noturnas, que
era o horário nobre das exibições, marcado pela suavidade da música ambiente e
o silêncio da plateia. Os filmes de rei, amor, Oscarito, Anquito, Grande Otelo,
Zé Trindade, Mazzaropi, as matinês com os gritos de Tarzan, western com índios
e as grandes películas mexicanas, influenciavam claramente os frequentadores.
Na direção de Galdino Mouta, foram exibidos os melhores filmes do cinema
mundial, lembrando que durante as projeções cinematográficas ele estava sempre
a caminhar, entre a plateia, com uma lanterna na mão, mantendo uma forte
disciplina, que, apesar de tudo, não deixou que muitos filhos de Pombal, hoje,
sejam resultados dos namoros e casamentos iniciados no “escurinho” do Cine Lux.
Em 1983, a direção do cinema passa para José Cleôncio Mouta. São novos tempos,
da grande influência da televisão com seus filmes, as badaladas novelas, o
vídeo cassette... e o Cine Lux vai perdendo seu público, evidencia-se a cada
ano o seu declínio. Deixa de exibir filmes diariamente e alterna as projeções
nos dias da semana, sem resultados compensatórios; e, sem nenhum incentivo,
fecha suas portas em 1989. Localizado na Rua Jerônimo Rosado com esquina para a
rua: João Pereira Fontes, o Cine Lux foi um grande marco na vida sociocultural
de Pombal.
Certa vez Jerdivan Nóbrega
de Araújo falou: “O sinal de luz avisava que o filme estava para começar. Galdino,
sempre inquieto, recolhia um a um os ingressos. Lá dentro, avisos de não fume
de todos os lados e o silêncio mágico dos espectadores que aguardavam os três
últimos sinais de luz. Depois de quinze minutos do início da exibição, as
portas se fechavam e ninguém mais entrava. Era a disciplina que na época
reclamávamos da sua rigidez e hoje lamentamos a sua falta”.
O professor, Francisco de
Assis Vieira Nunes, no seu artigo publicado em, 07/05/2011, assim se expressou:
“Hoje, vinte e dois anos depois, o Cine Lux ainda permanece vivo em nossas
lembranças, tal qual uma chama que crepita trazendo doces recordações de um
passado que gostamos de reviver. É um misto de ventura e tristeza, emoções,
humor e felicidade. Enfim, um conjunto de sentimentos que as palavras não
definem. Tudo se resume em saudade, esse sentimento nostálgico decorrente de
algo marcante”. E continuou o seu raciocínio: “O Cine Lux foi durante décadas a
maior atração noturna da cidade, o lugar que convergia à população todas as
noites. Era uma agradável rotina. Os filmes exibidos agradavam a todos:
crianças, jovens e adultos. Gregos e troianos se satisfaziam com os variados
gêneros que iam desde os épicos como: Rei dos Reis, El Cid, Ben Hur, até os
bang-bang e as chanchadas brasileiras, ricas em humor. Eram produções de estilo
cômico mescladas com toques de romantismo e participação dos grandes cantores
da época, capazes de descontrair os mais sisudos. De fato, era impossível
resistir à dupla Ankito e Grande Otelo, Zé Trindade, Oscarito, Mazzaropi. Foi
também palco de shows de renomados artistas. Por lá se apresentaram Luis
Gonzaga, Marinês, Cel. Ludugero, Bievenido Granda (cubano), José Augusto – O
Sergipano - José Ribeiro, Roberto Muller, Os Cantores de Ébano, Miguel Ângelo,
Noca do Acordeon e Ronaldo José – ex- aluno do Ginásio Diocesano. E, como se
não bastasse, ainda cedeu seu espaço para grandes eventos sociais, entre os
quais, a colação de grau da primeira turma concluinte do extinto Ginásio
Diocesano de Pombal no ano de 1958, que teve o Deputado Federal Janduy Carneiro
como paraninfo. Serviu ainda para realização de Festival de Calouros, Grêmio
Literário, teatro, palestras e as memoráveis convenções municipais de partidos
políticos”.
A nossa ideia seria provocar
uma reunião entre poder público e iniciativa privada, com a presença de todas
as correntes dos produtores culturais de Pombal a fim de saber se era possível
a viabilidade e revitalização do Cine Lux para o retorno do chamado cinema de
calçada.
João Pessoa, 19 de setembro
de 2012.
*Promotor Público em João Pessoa, autor de vários livros e escritor pombalense.
scoelho@globo.com
CINEMA DA CIDADE
Reviewed by Clemildo Brunet
on
9/19/2012 08:52:00 AM
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