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Reminiscências de uma gente que fez

Genival Torres Dantas


Genival Torres Dantas*

Inicio de 1964, o Brasil estava num clima tenso, era o prenúncio de um movimento que viria a derrubar o presidente João Belchior Marques Goulart, viríamos a conviver com o regime de exceção imposto pela ditadura militar a partir de 31 de março do mesmo ano. 

E
já passava das 21 horas do dia 09 de fevereiro, num leito hospitalar da cidade do Rio de Janeiro, dava os últimos suspiros naquela noite de domingo, em pleno carnaval, aquele que tinha o maior prestígio entre todos os compositores da música popular brasileira, tanto dentro como fora do Brasil, Ary de Resende Barroso, simplesmente Ary Barroso. Os salões, com aquela notícia triste, por algum momento ficaram em silêncio, a mais festiva de todas as cidades brasileiras se sentia de luto, a escola de samba Império Serrano que vinha com o samba-enredo Aquarela Brasileira, se sentiu impotente e fragilizada pela notícia da morte daquele que tinha inspirado a escola naquela noite festiva e que se transformara em momento de luto e pesar. Apesar do clima todos sentiram a necessidade de se revestiram num espírito de superação e transformaram a dor na esperança de uma noite de brilho e alegria, mesmo que disfarçada, pois era assim que o já saudoso Ary Barroso desejava, se ali estivesse abrilhantando os salões e a passarela do samba carioca.

Partiu num momento de alegria, ele que fez da vida um poema musical nas letras inspiradas no amor que ele sentia pela terra brasileira e o seu time de futebol favorito, o clube de regatas flamengo. Ele, o compositor ovante, um fervoroso defensor da verdadeira música popular brasileira, um dos seus integrantes desde a década de 30, daquele século.

Ary Barroso encantou o legendário americano, (Walter Elias Disney), Walt Disney, que o contratou para compor as musicas de vários desenhos animados. Depois do grande sucesso mundial que Aquarela do Brasil fez, no desenho “Alô, Amigos”, que tinha como personagem principal o Zé Carioca, veio os sucessos “No tabuleiro da Baiana” e “Os Quindins da Iaiá”, no desenho “Você Já Foi à Baia?”

Com o sucesso e notoriedade alcançada o Ary Barroso, em 1944 foi para os EUA e passa a ganhar US$1000 dólares semanais, uma fortuna para a época e o desejo de muitos compositores, seus contemporâneos. No ano de 1946 candidata-se a uma cadeira na câmara municipal o Rio de Janeiro, pela UDN (União Democrática Nacional) e ganha em segundo lugar, perdendo o primeiro lugar para o político profissional Carlos Lacerda. Formado em Direito, cujo curso foi iniciado em 1923, aos 19 anos, só se formou em 1930, conseguiu a nomeação para juiz municipal de Nova Rezende (MG), Estado de sua origem, largando o emprego depois de 15 dias se declarando incompetente para a vida forense, voltando para a música e o rádio sua paixão endêmica.

E é no e para o rádio que Ary Barroso dedica sua vida, movido pela paixão musical e pelo futebol, se destaca com brilhantismo e grandiloquência nas locuções de vários temas, com atuação marcante na área esportiva, muito embora seu amor desmesurado pelo flamengo tenha criado uma série de embaraços, quando das narrativas das partidas desse time contra qualquer outro adversário. Foi criador de grandes programas de auditórios, onde lançou muitos artistas, cantores, que fizeram sucesso com suas músicas e de outros compositores, Ângela Maria e Lúcio Alves, foram dois grandes nomes que silenciaram o gongo por ele introduzido nos programas de auditórios para desclassificar candidatos que não lhe agradassem nas suas apresentações.

Essas múltiplas atividades eram todas bem administradas pela sua capacidade artística desenvolvida dentro da sua ótica musical. Foi dentro dessa realidade que o Ary Barroso foi e é reconhecido como um dos maiores nomes no rádio brasileiro. Em decorrência desse histórico cultural que o ex-presidente Lula, instituiu o dia 07 de novembro como o dia do radialista, transferindo a data de 21 de setembro, desde 1945, para a data de nascimento do Ary Barroso, homenagem justa e meritória.

E é nessa data que fazemos uma reflexão. Lembrando grandes nomes que fizeram o rádio nacional mais forte e consistente, dentre eles destacamos os imortais tanto para suas regiões, como para o Brasil como um todo:
Ivan Lima, um soteropolitano que trabalhou em rádio no Ceará e foi determinante, com a sua genialidade, para o sucesso da radiofonia pernambucana nos microfones esportivos das rádios clube de Pernambuco, Tamandaré e Rádio Globo Recife.

Luiz Jatobá, o médico, locutor, jornalista, de voz privilegiada, atuou na locução radiofônica e cinematográfica, tendo atuado na CBS (Columbia Broadcasting System), sendo o locutor brasileiro a dar notícias sobre a segunda guerra mundial, trabalhou ainda na Metro Goldwin Mayer, apresentando os trailers cinematográficos. Atuou na TV Globo ao lado de Hilton Gomes e Nathalia Timber apresentando o “Jornal da Globo”, e com Léo Batista apresentou o Jornal Hoje. Por perseguição política, época do golpe militar, migrou para os EUA.

Outro nome que ficou na história do rádio brasileiro foi o do Hélio Ribeiro, nome artístico do paulistano José Magnoli, falecido em 6 de outubro de 2000. Foi narrador da Twentieth Century Fox, Columbia Pictures, Universal International dos EUA, Metro Goldwyn Mayer e da Paramount Pictures. Trabalhou em várias emissoras de rádio, mas foi na Rádio Bandeirantes, de São Paulo, que se imortalizou com suas crônicas de opinião para o “Jornal do Meio Dia”. Seu último trabalho para o rádio foi na Rádio Globo de São Paulo com o programa “O Poder da Mensagem” em 1965. sua voz baritonada inspirou o também  saudoso e extraordinário colaborador do rádio brasileiro, Chico Anísio, a criar o personagem de grande sucesso para a televisão, Roberval Taylor.

Outro nome que deixou saudades na memória do rádio foi o Antonio Carvalho Filho, levava o nome artístico apenas de Antonio Carvalho. Mineiro de Lavras, faleceu em 17 de maio de 2008. Iniciou suas atividades no rádio na sua cidade natal e se transferiu para São Paulo para poder concluir o curso de Direito e com objetivo principal de ingressar na Rede Bandeirantes de Rádio, assim o fez, depois de trabalhar na Rede Jovem Pan, antiga Panamericana. Foi o grande apresentador do programa Bandeirantes frequência Balançada, das 21 às 23 horas, de segunda à sexta-feira, desde 1972 ficando no ar por 13 anos, e nas manhãs dos domingos apresentava o Arquivo Musical, cujo programa fui seu ouvinte incondicional. Jornalista, Locutor, Filosofo, apresentou outros programas de grande sucesso na própria Bandeirantes, suas palvras para reflexão ficaram na histório do rádio paulista. Abaixo alguns exemplos das suas citações:

1 - A vida é a balança para todos, mas poucos conseguem ser fiel de sua própria balança.                           2- Equilíbrio e harmonia perfeitos neste momento cósmico significa só estagnação.
3 - Gerar fenômenos impressiona os ignorantes, evoluir a mente impressiona os sábios.
4- A ordem cósmica é a evolução da capacidade de raciocínio de cada um.
5 - Há mais sabedoria num pequeno grão de areia do que no cérebro do melhor de nós.
6- O que sai pela boca de cada um geralmente é mais nocivo do que o que entra.
7- Para o miserável faminto, não há restos; ha apenas comida

Em termos de locução feminina temos a voz mais conhecida internacionalmente, e a mais linda voz do Brasil, a carioca Íris Lettieri, hoje com 71 anos, nasceu em 26 de agosto de 1941, que tão bem representa a mulher brasileira nesse mercado de trabalho. Foi a primeira mulher a atuar como locutora de telejornais do País, trabalhou nas antigas TV Tupi do Rio, TV Manchete. É locutora oficial do Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro (Antonio Carlos Jobim-Galeão) e o Aeroporto Internacional de São Paulo (Congonhas).

Não poderia deixar de citar as minhas reminiscências no sertão paraibano, quando escutávamos, nem mesmo era rádio, mas, serviço de alto-falante, que conseguia prender a atenção da comunidade pombalense na sua principal voz, Clemildo Brunet de Sá. Na época um garoto que comandava a radiofonia local, ainda menor de idade, mas com um talento invejado por muitos veteranos. Soube com dedicação, responsabilidade e persistência implantar um sistema de rádio local e formar profissionais que orgulham a terra de Maringá, a ternura sertaneja, Pombal-PB.

A todos os profissionais, citados ou não, o meu respeito e gratidão pelo trabalho e a luta impar desses herói dos microfones espalhados em todo território nacional, para que o radio brasileiro tenha se transformado num mercado de trabalho tão promissor e de um setor de comunicação de muita respeitabilidade, se superando a cada dia, mesmo com o advento da TV e a recente internet.

*Escritor e Poeta

Reminiscências de uma gente que fez Reminiscências de uma gente que fez Reviewed by Clemildo Brunet on 11/09/2012 09:41:00 PM Rating: 5

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