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POMBAL IDEAL CLUBE: UM PASSADO PRESENTE.

Prof° Francisco Vieira


Eu mal acabara de completar onze anos quando surgiu o Pombal Ideal Clube, sodalício mais antigo da cidade. Assim como o Cine Lux e o Bar Centenário, o clube também se tornou parte integrante de nossa história.   

O prédio que fora construído com fins comerciais passou por várias mudanças físicas e funcionais até tornar-se o mais conceituado clube social do lugar. De lá até então, foi casa de mercado, empresa de luz, oficina, câmara de vereadores e até residência. Curioso é que a moradia era utilizada também para os ensaios do Reisado – grupo folclórico de Pombal – que aconteciam nos períodos noturnos, sempre regados à base de cachaça. Sob a força da bebida os ânimos se acirravam acabando invariavelmente em brigas e
às vezes até prisões.

Embora não tenha acompanhado sua história desde o início, presenciei grande parte de sua trajetória, condição que me permite relatar com propriedade alguns fatos que não se perderam no rol do esquecimento, senão vejamos. Era visível aos olhos de quem cruzasse o centro da cidade a oficina de Genival de Aníbal. Lá estavam carros para consertos bem as vistas em meio a uma parafernália de material obsoleto. Ao mesmo tempo se ouvia o batuque ritmado de martelos no processo de desamassamento. Ouso até afirmar, com um pouco de maestria a batucada acabaria em música. Afinal, no Brasil tudo acaba em samba.

O imóvel com suas janelas voltadas para a rua do comércio eram grandes e largas; o tamanho suficiente para que Pretinho, meu irmão, pudesse se esconder todas as manhãs para “matar” aula, onde permanecia até o final do expediente. Sua artimanha durou apenas o tempo de chegar ao conhecimento dos pais tendo lhe custado uma coça como castigo.
           
Fundado em 1961, o clube iniciou a construção de sua sede após sete anos, tornando-se mais tarde um marco referencial para a população. Seu quadro de sócios formado de comerciantes, fazendeiros, profissionais liberais, funcionários e até autoridades, deram ao Pombal Ideal Clube status aristocrático, senão, tanto quanto a acepção da palavra, mas, evidenciando o caráter elitista, por isso, considerado “clube de ricos”. Seu objetivo primordial consistia no agrupamento da comunidade e promoção do convívio social. Seus diretores, pessoas influentes da sociedade estabeleceram normas rígidas e ás vezes preconceituosas, onde “gente de cor” era barrada privando o acesso aos bailes. Quer fosse presidente Nicácio ou Hamlet Arnaud, Dr. Saraiva, Carrinho, Teinha Formiga e outros que me fogem da memória, se mantinham firmes na defesa dos objetivos do clube, primando pela moralidade, portanto, dignos do nosso reconhecimento, pois a história é construída de partes onde cada um tem sua parcela.
           
Contudo, toda vigilância não foi capaz de evitar um fato curioso. Consta que numa festa, um conceituado deputado de cidade vizinha, aproveitando-se de sua posição adentrou o clube acompanhado de mulher de procedimento duvidoso. Sentindo ameaçada a dignidade da sociedade pombalense, a diretoria de maneira discreta convidou o político a retirar-se sob a alegação de que sua companheira era suspeita. Após aceitar o convite, o parlamentar assim argumentou: “suspeitas são as que estão aí, porque esta é p_ _ _ mesmo”. O caso é, senão irônico, pelo menos hilariante.
           
O Pombal Ideal Clube foi palco de grandes eventos, principalmente festas dançantes, entre as quais de debutantes, realizadas com requinte e glamour. Arrojadas promoções foram ali realizadas proporcionando a sociedade momentos inesquecíveis. No que tange a bailes e shows, tivemos a participação de conceituadas orquestras, grandes conjuntos e renomados cantores com destaque no cenário artístico nacional. Enumerá-los seria impossível, contudo, podemos citar: Nelson Gonçalves, Waldick Soriano, Roberto Muller, Cláudia Barroso, Trios Irakitan e Nordestino. Com destacada apresentação tivemos ainda Renato e Seus Blue Caps e The Fevers, ambos colocados entre os melhores conjuntos da Jovem Guarda - movimento que dominou a juventude nos anos 60 - além das orquestras Super Oara, Ogírio Cavalcante e outras. Nesse contexto, inclui-se a participação de “Os Águias”, conjunto pombalense que dominou na região cerca de dez anos devido sua qualidade musical e talento artístico de seus músicos.
           
E, como se não bastasse, o clube foi também protagonista de grandes carnavais que fizeram da Festa de Momo seu ponto alto pela organização. Lembro-me: quatro dias e noites repletas de foliões, solitários ou em grupos, com destaque para os blocos “Formigão”, “Antártica” e “Do Sujo”, que davam a festa um toque especial, fazendo do carnaval pombalense um dos melhores do sertão.  
           
A saudade me convida a fazer uma viagem de volta às décadas de 60/70, período que asseguro ter sido a fase áurea do clube, tempo que passou e eu não esqueci. E, como te esquecer, se participei da grande maioria de suas festas. Como não lembrar se nelas vivi os melhores momentos de minha vida, despertando para os prazeres da juventude, até então tidos como tubu.  A propósito, participei das primeiras festas com a família de Maurício Bandeira, quando o clube iniciava sua construção. Assim, vieram as primeiras paqueras e namoradas e mesmo tomado pela timidez, comecei a marcar os primeiros passos das danças da época: boleros, sambas, valsas, rumbas, mambos e outros, hoje quase em total em desuso – o que é lamentável.  

Dançar aos finais de semana no Pombal Ideal Clube tornou-se uma rotina prazerosa para jovens e até idosos. Em grupos de amigos – Mundinho e Fitita Canuto, Pretinho (meu irmão), Joaquim Bandeira (Biú), Assis Freitas, Zé Inácio, Titico Barbosa - depois do “aquecimento”, com algumas doses, estávamos prontos para a festa e dispostos a cumprir a rigorosa disciplina imposta pela diretoria. A propósito, pelo menos nos principais eventos era estabelecido o traje a rigor: longo-fino para as mulheres e passeio formal para os homens, os quais deviam assim permanecer toda a noite. Aí, com ares de gracejo se dizia que “alguns paletós dançavam emprestados, enquanto seus donos dormiam o sono dos inocentes”. No intervalo valia a pena atropelar-se na multidão para conseguir – nem sempre possível - um cachorro-quente em Lafaiete e após o baile saborear o caldo no Restaurante “Manaira” de Cabine.
           
O Pombal Ideal Clube foi ainda palco de muitos romances. Alguns namoros ali se firmaram acabando em casamento enquanto muitos se findaram e outros tantos sequer começaram, pois não passaram de sonhos ou paixões frustradas. Com a devida vênia, eu e Lenice fomos personagens coadjuvantes desse cenário de romantismo e paixão. Ali amamos o que era possível amar. Ali conhecemos os dois extremos: o bem e o mal; sorrisos e lágrimas; mágoas e perdão. Enfim, algumas brigas – que ninguém é santo – mas que acabavam sempre em reconciliação.

A história do clube seria outra, no mínimo brilhante, se dois assassinatos não tivessem ali acontecido, ofuscado todo seu esplendor. Sem entrar no mérito lamentavelmente duas vidas foram ceifadas em suas dependências maculando sua trajetória e enodoando de sangue os seus salões. Afinal de contas, nem tudo são flores.

Com pesar, após 50 anos o Pombal Ideal Clube não é mais o mesmo. O clube que fora no passado uma referência tornou-se saudade de uma época sem volta. Hoje são lembranças de memoráveis carnavais, animados folguedos juninos, requintadas festas de debutantes, inesquecíveis natais e réveillon, além de muitas histórias. Com certeza muitas imagens ainda refletirão na mente dos seus frequentadores e funcionários. É que os tempos mudaram e com ele os ritmos. Os clubes perderam espaço para as promoções públicas que por serem gratuitas aglomeram multidões onde a liberdade não tem limite. É lamentável, mas não se faz festa como antigamente, pelo menos ao nosso estilo.

Embora o PIC não sendo o clube de outrora, continua lutando pela sobrevivência. Contudo, será sempre uma história viva. Mesmo que os insensatos o deixassem seguir o mesmo destino do Cine Lux e Casa do Altinho, que condenados à demolição destruíram parte de nossa história; mesmo que tivesse esse triste fim, continuaria – e continuará - para sempre: UM PASSADO PRESENTE.

Pombal, 08 de fevereiro de 2013

*Professor, ex-diretor da Escola Estadual “João da Mata”, ex-secretário de administração do município de Pombal.

POMBAL IDEAL CLUBE: UM PASSADO PRESENTE. POMBAL IDEAL CLUBE: UM PASSADO PRESENTE. Reviewed by Clemildo Brunet on 2/09/2013 06:49:00 AM Rating: 5

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