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ASSIM NASCEU NOSSA TERRA, BEM COMO O NOSSO POVO

Ignácio Tavares
Ignácio Tavares*

Quem fomos e o que somos?  Neste momento em que se comemora mais um aniversário da terrinha vale a pena reeditar este texto que fala sobre a nossa origem e bem como a nossa formação étnica, desde os primórdios da ocupação da das terras do sertão.

Após o extermínio das nações indígenas, no sertão paraibano, iniciou-se a instalação das fazendas de gado. Foi a opção da Coroa Portuguesa para poder ocupar as terras da região, bem como gerar recursos financeiros para fortalecer o seu combalido tesouro, logo após libertar-se do jugo Espanhol. Não havia outra saída, posto que, o ouro que tanto esperava encontrar na região, na verdade, nunca existiu.

É importante ressaltar que, como parte do projeto de ocupação há indícios de que, o senhor Domingos Jorge Velho, esteve na região antes da presença de Teodósio de Oliveira Ledo. Ressalte-se que o senhor Domingos era um eficiente serviçal da Coroa. Esteve à frente de ousados projetos de conquistas e ocupação, com finalidades diversas.  Convém lembrar que foi este cara que em 1694 destruiu o Quilombo de Palmares e em 1695, conseguiu prender e
assassinar o bravo Zumbi dos Palmares. Que belo currículo, hein?

A sua presença no sertão tinha o objetivo encontrar vestígios de ouro. A prospecção era realizada, num primeiro momento, através da observação da presença do precioso metal, nos pingentes, ornamentos e adereços dos nativos. Depois de cumprir a missão nenhum ouro foi encontrado pelo famigerado bandeirante.

Os Tapuias (Pegas) não conheciam o precioso metal.  Foi total desencanto, para Domingos Jorge Velho, depois de enfrentar grande risco num ambiente desconhecido, sobretudo hostil. Com efeito, essa entrada fracassada sinalizou que não havia ouro no sertão paraibano, pelo menos naquele momento. Daí então entra em cena o projeto de ocupação a fim de aproveitar as vastas áreas de terras disponíveis para a exploração da pecuária de forma extensiva.
Para por em prática o referido projeto fazia-se necessário expulsar os legítimos donos das terras do sertão: os Tapuias. Assim foi feito depois de muita resistência, porem, sem muito sucesso. Em poucos anos a área estava livre e liberada para a implantação dos grandes currais.

O projeto não funcionou tal qual como se esperava. A política de ocupação das terras do sertão tinha como referência a experiência bem sucedida no rio Grande do Sul, cuja ocupação fundamentou-se na instalação dos grandes currais. O sucesso do projeto de ocupação do extremo sul deveu-se a fertilidade natural do solo, bem como a regularidade das chuvas, condições necessárias para o desenvolvimento das pastagens.

Ademais, a elevada densidade populacional da região contribuiu para criação de um mercado consumidor de carne, entre outros produtos de primeira necessidade, de grande escala. Com efeito, repito, pode-se dizer que foi a existência de mercado, afora do ambiente favorável, que viabilizou a política dos currais no extremo sul da colônia.

Desse modo foi de absoluto sucesso a exploração da pecuária extensiva no Rio Grande do Sul e províncias vizinhas. Ademais, para consolidação e à expansão dos currais, instalaram pequenas unidades de processamento de carne, cuja denominação persiste aos dias de hoje, “as charqueadas”, com o propósito de prolongar a vida útil da carne bovina.

Com o passar do tempo o charque¨, como era conhecida no sul, bem como ¨jabᨠpelos nordestinos, passou a ser produzida em grande escala, a fim de atender as necessidades de consumo da população do extremo sul da colônia. A produção excedente era exportada para as demais regiões.

Com efeito, a consolidação da política dos currais não foi possível no sertão por várias razões. Entre as quais, a densidade populacional rarefeita, o regime intermitente das chuvas, por conseqüência as pastagens escassas, o baixo poder aquisitivo da população local. Noutras palavras, alem do ambiente impróprio à prática uma pecuária extensiva em larga escala, não havia mercado, nem mesmo nas proximidades, para consumir, a carne produzida em seu estado natural, de forma comercial.

Os grandes mercados, de alta densidade populacional, distanciavam a centenas de quilômetros. Esses centros localizavam-se nos litorais, onde estavam os consumidores de maior poder aquisitivo. Assim sendo era impossível chegar até lá, por conta da falta de estrada e meios de transportes apropriados para conduzir a carne em condições ótima de consumo.

Da mesma forma, a venda do animal em pé pra abate era inconcebível em razão da falta de segurança para conduzir os animais por longas distâncias, assim como o transporte do dinheiro resultante das operações de compra e venda.

Com efeito, a tentativa de transformar o sertão num grande centro produtor de animais para abate, fundamentado na grande propriedade, com o objetivo de abastecer os aglomerados urbanos em formação, não prosperou, pelas razões expostas. Com certeza o entrave maior foi a grande distância entre os centros produtores e os mercados consumidores da província.
O litoral era distante e inacessível por conta das barreiras impostas pelos contrafortes da Borborema. Em razão desses diversos obstáculos, repito, o projeto foi à falência. A conseqüência foi o fracionamento das grandes propriedades, depois vendidas ou doadas às famílias que resolveram estabelecer-se na região.

Para o saudoso historiador Wilson Seixas, o que levou a política dos currais a falência foi à falta de circulação de dinheiro. Os impostos eram pagos em quilos de carne por cada animal abatido. Segundo Wilson, o imposto era conhecido como a derrama da carne¨, uma alusão a “derrama do ouro” que vigorou nas Minas Gerais dos tempos coloniais.

Os fiscais da Coroa não tinham como conservar a carne retida como imposto. Assim sendo, sem uma logística mínima de conservação e transporte, o produto entrava em processo de decomposição, em razão disso, era jogada fora, em estado fétido.

Com efeito, se não circulava dinheiro, a região não prosperava. Mesmo assim, não obstante as dificuldades econômicas da região, a população migratória tomou um grande impulso a partir do inicio do século XIX, atraída pela perspectiva de acesso a terra, a preço simbólico ou simplesmente pela posse, sem registro em cartório.
Grande parte da população branca do sertão, assim como de Pombal, originou-se de dois eixos migratórios. A primeira grande leva veio da região do Cariri Cearense. Essa região, em função da disponibilidade de terras férteis, água abundante, era bastante procurada pelos colonizadores portugueses que chegavam ao Brasil em busca de riqueza fácil. A segunda leva veio do rio Grande do Norte, mais precisamente da região do Seridó.

É importante ressaltar que a Região Nordeste nos séculos XVI e XVII, era o único centro dinâmico da economia da colônia, em razão disso a região era o principal ancoradouro dos portugueses, entre outros estrangeiros, que resolviam fixar residência aqui no novo mundo.

Ao chegarem, os colonos buscavam espaços territoriais onde a água fosse abundante, bem como houvesse disponibilidade de terras agricultáveis. O historiador cearense Denizar Macedo expôs muito bem essa questão. Posto isso, o Cariri Cearense era um dos lugares que atendia a essas condições. Assim sendo, boa parte dos colonos que aqui chegaram, migrou pra aquela região.

Em certa medida o intenso fluxo migratório pra região do Cariri Cearense, pelas razões expostas, provocou um adensamento populacional atípico, o que obrigou parte da população excedente migrar pra região oeste da Província da Paraíba. Por outro lado, o segundo fluxo migratório, direcionado ao sertão paraibano teve sua origem no Rio Grande do Norte, mais precisamente da Região do Seridó. Assim sendo essas duas levas de migrantes foram responsáveis pelo povoamento do sertão paraibano, bem como de Pombal.

A população negra que permaneceu no município era remanescente de escravos que resolveram ficar na região mesmo depois do fim do trabalho em regime de servidão. Ademais, ficaram por aqui algumas pessoas de origem indígena que representavam muito pouco, em relação à população local.  Pois, eram constituídos por alguns remanescentes que escaparam do massacre realizado por Teodósio de Oliveira Ledo, que, por questão de segurança, ficaram sob os cuidados dos missionários da Igreja Católica.

Foi à mistura das três etnias que formou o caldo genético, que definiu de uma vez por todo o perfil miscigenado de grande parte da população do sertão, em particular de Pombal. Isso vale pras famílias que têm raízes históricas cuja presença na região vem dos tempos coloniais.

As famílias aqui residentes, sem vínculos históricos, guardam suas histórias nos seus lugares de origem. Sem dúvida, essas criaturas participaram de uma nova etapa da dinâmica da história do município, em particular da cidade, porem sem a mesma relevância reservada aos pioneiros que aqui chegaram, a partir da segunda metade do século XVII ao início do século XIX.

São as famílias pioneiras as mais miscigenadas. Qual é a família tradicional, digo, aquela que participou da construção, da formação econômica do município, que não tem lá seu moreninho? Qual é a família que não tem lá o seu caboclinho? Em razão disso, é rara a família pioneira que não tenha um pezinho na senzala e outro na tenda indígena.

Esta é a configuração genética de grande parte da população genuinamente pombalense, assim como sertaneja, que guarda raízes históricas como o passado e presente. Nada diferente do que Gilberto Freire falou na sua obra clássica Casa Grande e Senzala. Somos mesmo o produto de uma soma de raças que se cruzaram com mais freqüência no período colonial em razão da carência de mulheres brancas.

Muitas vezes o individuo tinha que fazer longas viagens na busca de uma parceira para acasalamento. Com certa freqüência, naquela época, as moças e rapazes pertencentes a uma mesma família, vivendo em regiões diferentes, casavam-se sem se conhecerem. Quando isso não acontecia, não havia alternativa: das duas uma, ou a cabocla, ou a mulata. Esta é uma das razões da incidência de grande número de miscigenados no sertão paraibano resultantes do casamento de pessoas de diferentes raças.

Com este texto encerro esse breve ensaio sobre o nosso povo, nossa gente ao longo da história, que envolve o período da colonização e ocupação do sertão, em particular do município de Pombal, no tempo do Brasil colônia e pós-colonial. É evidente que se trata de uma reflexão à luz das informações que disponho. São informações limitadas, o que me leva a crer que, a verdadeira história da colonização e ocupação do sertão paraibano ainda está por ser escrita.  Assim concluo.
João Pessoa, 19 de Fevereiro de 2011

*Economista e Escritor 
ASSIM NASCEU NOSSA TERRA, BEM COMO O NOSSO POVO ASSIM NASCEU NOSSA TERRA, BEM COMO O NOSSO POVO Reviewed by Clemildo Brunet on 7/24/2013 05:57:00 AM Rating: 5

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