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SONHAR NÃO FAZ MAL, NÃO É?

Ignácio Tavares
Ignácio Tavares*

Em 2002, definitivamente aposentei-me. Falei pra mim mesmo: voltar a trabalhar jamais, mesmo que a oferta salarial venha ser atrativa e generosa. Nada me induzirá a retornar as lides do planejamento e pesquisa.  Firme na minha decisão, assim pensei: pronto, agora sou dono do meu tempo. Assim sendo serei livre para sempre. É verdade que combati o bom combate, enfrentei mares revoltos, consegui chegar à terra, firme, são e salvo.  

Por outro lado, considero lamentável o fato de que o tempo, na sua marcha acelerada, não pare um só instante pra que a gente possa reprogramar a longa caminhada da vida. Quero dizer que, se o tempo não nos pede licença pra passar o que havemos de fazer? Por isso somos levados de roldão qual um barco a deriva numa correnteza desenfreada.  

Apesar dos pesares sou obrigado a dizer que, por muitos anos não via e
nem queria ver o tempo passar. Mesmo assim percebo que tudo passou de forma tão rápida, que não me foi sequer possível entender qu’eu também estava a passar. ¨O tempo é breve¨. (1Co. 7,20).  Com certeza, da janela da minha nave imaginária, agora sim, vejo o tempo que está a passar. Entendo que cada ano, cada dia que passa mais visível fica a variável regressiva na equação da minha vida.

Ignorar o tempo até certo ponto faz bem. Mas é impossível esquecer, que, por dever de ofício, por muitos anos fui seu escravo. Isso porque, no exercício das minhas atividades como funcionário público estava sempre a olhar para o famigerado relógio de ponto atento à minha movimentação de entrada e saída do ambiente de trabalho. Fazia parte das regras do jogo, portanto de nada a reclamar.

Quando estava na ativa, o tempo que dispunha era insuficiente para fechar a contabilidade da minha jornada de trabalho de cada dia. Logo cedo, iniciava com as primeiras aulas no curso de economia. Em seguida, entregava-me aos trabalhos de rotina na Secretaria do Planejamento.

Sobrava-me pouco tempo. Nos finais de semana os afazeres domésticos zeravam a minha disponibilidade de tempo. Levava as crianças pra banhar-se nas piscinas nos clubes dos quais era sócio, bem como, as matinês, entre outras diversões típicas da idade deles.
Em razão disso, o meu tempo, era usado com certa parcimônia, posto que, quase sempre tinha algo a fazer, desde a preparação de aulas, correções de provas, à leitura de trabalhos relativos às minhas atividades na SEPLAN.

Ao me aposentar todo esse tempo ficou disponível para ser usado como bem entender. Antes de partir para o usufruto do meu tão esperado ócio remunerado, resolvi olhar pra mim mesmo, por dentro e por fora. Senti a necessidade de me ver no espelho a fim de observar, nos mínimos detalhes, a minha real fotografia depois de tanto tempo engajado, entregue, de corpo e alma, ás lides da vida.

Assim sendo, sem constrangimentos, pus-me diante do espelho. Quando me vi, confesso que tive dó de Ignácio Tavares. Vejam só o que observei: cabelos brancos, rugas visíveis a olho nu, complementadas por lampejos de esquecimentos, entre outros males menos preocupantes.

Inconformado, procurei saber dos amigos, do mesmo naipe etário, se estavam a viver a mesma situação. Sem exceção, todos confessaram que ficaram aflitos ao se posicionarem diante do espelho, assim como eu também fiquei. Posto isso, concluí que nada podia fazer, pois, não tinha, nem tenho o condão de impedir a inexorável marcha do tempo.

Pois é, depois dessas elucubrações sobre a minha condição psicofísica pós-aposentadoria tomo a iniciativa de me reorganizar com vista aventurar-me noutros mares, até então desconhecidos. Tinha que partir pra o exercício de outras atividades. Não podia ficar parado. Assim sendo, inicialmente, resolvi prestar serviços gratuitos, como economista, àqueles que estavam realmente a precisar.  

O resto do tempo seria destinado à leitura, viagens, preferencialmente pra terrinha, onde pensava banhar-me nas sagradas águas do Piancó. Epa! Que Piancó? Banhar-me nas águas poluídas do velho rio? Que Deus me guarde e me livre! Aquele Piancó de águas limpas e cristalinas, não existe mais.

O Piancó está morrendo. Por favor, salve o rio que outrora foi o sustentáculo alimentar, financeiro do pescador Zé de Rosa, entre outros. Foi através da atividade pesqueira, que o saudoso pescador conseguiu criar mais de meia dúzia de filhos, bem alimentados, gordinhos, de cabelos liso caídos sobre os ombros, arcada dentaria completa, bem vestidos, por isso todos felizes e sorridentes.

É isso mesmo, nem tudo está perdido. Resolvi partir pra luta. Mirei a terrinha como ponto de partida pra minha pastoral. Sempre quis vê-la próspera, com certeza, mais bonita como sempre fora. Já escrevi dezenas de textos inspirados na possibilidade de um dia ver a nossa terra reassumir aquela antiga posição de décima economia, no ranking da economia estadual. A semente está plantada, falta alguém que se predisponha a colher os frutos.

Assim sendo, pensei em por em prática as coisas boas que aprendi ao longo da minha vida profissional. Experiências passadas e mais recentes, enriqueceram o meu portfólio de onde posso tirar idéias e projetos que podem ser adaptadas a realidade local.

A exemplo lembro-me da experiência que acumulei, ao passar cerca de seis meses na região das várzeas de Souza, com o objetivo de levantar dados para a elaboração do projeto executivo. Em sendo conhecedor das dificuldades que enfrentam os irrigantes da terrinha, senti que valia pena levar pra os nossos sofredores irmãos tudo aquilo que vi, nas áreas de manejo e organização das atividades irrigadas a serem postos em prática, futuramente, pelos irrigantes das várzeas de Sousa.

Antes porem, conversei com vários irrigantes para poder entender o porquê da estagnação das atividades irrigadas no nosso município. Todos foram unânimes ao dizer que o custo da energia rural impossibilitava a expansão da área irrigada. Este foi o primeiro obstáculo a ser removido, para que se tornasse viável a minha incursão no setor. Ressalte-se: sem apoio do executivo municipal, nem tampouco do estadual. O resto virá depois. Aguardem, até breve.

João Pessoa, 14 de Julho de 2013

*Economista e escritor pombalense
SONHAR NÃO FAZ MAL, NÃO É? SONHAR NÃO FAZ MAL, NÃO É? Reviewed by Clemildo Brunet on 7/13/2013 09:52:00 PM Rating: 5

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