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Momentos de reflexões fazem parte da inteligência

Genival Torres Dantas
Genival Torres Dantas*

            O mundo cristão lembra a morte e o renascimento de Jesus há muito tempo. Esse fato é tido como um dos mais importantes ato religioso para o Cristianismo. Como fui criado dentro dos preceitos da igreja católica, meus  pais eram católicos, por isso fui batizado e crismado nessa religião;  quando chega essa época sou tomado por um sentimento de lembranças e saudades dos tempos que comemorávamos essa data, que não é fixa no calendário, decorrendo sempre entre os dias 22 de março e 25 de abril, e de uma forma diferente que costumamos comemorar nos dias de hoje.
            Final dos anos 1950 e
começo dos anos 1960, lembro-me perfeitamente, na pequena  Pombal, onde nasci, cidade pequena situada no alto sertão paraibano, a ternura sertaneja, com suas tradições e convenções regionais, como era comum naquela época e região, as autoridades constituídas e competentes, reconhecidas pelos munícipes eram sempre formadas, primordialmente, pelo prefeito, juiz, delegado e o pároco. As pessoas tinham o maior respeito por essas autoridades maiores, entretanto, quem realmente mandava na comunidade era o padre, aquele que falava e todos obedeciam, inclusive as demais autoridades.
            Impressionante como era determinante a palavra do religioso, normalmente envolvido com o ensino local, o orientador espiritual e formador de opinião, quando muitas vezes funcionava, de fato, como o único e forte cabo eleitoral, nunca abertamente, porém, na surdina ou nas entre linhas, dai o respeito que todos tinham  por ele, um homem respeitável e respeitado, sobre ele não recaia qualquer dúvida, pois sempre estava acima do comportamento dos demais homens e de qualquer suspeita.
           A Semana Santa era sem dúvida, como ainda o é, o fechamento da páscoa; habitualmente começava-se o período de penitência, com o jejum de alimentos, na quarta-feira, ficando restrito ao café da manhã, muito pobre, apenas um pão e uma xícara de café, normalmente às 06:00, o dia no nordeste brasileiro começa mais cedo, o almoço magro e servido pontualmente às 12:00, ficando a última refeição, como janta, às 18:00 impreterivelmente, essa dieta era aplicada até à Sexta-feira Santa, portanto, três dias de absoluta corda curta. Para nós, as crianças das casas, era um verdadeiro disparate, não tínhamos nenhuma noção do que estava acontecendo, simplesmente tínhamos que acompanhar os adultos. Essa era uma prática da nossa família, alguns comentários nos dava a ideia que a situação era usual à outras famílias, não posso afirmar se representava, esse hábito e costume, a grande maioria.
            Além do regime alimentar, o comportamento da comunidade, nos três dias de resguardo, mudava radicalmente. Como o rádio era o único aparelho sintonizador e receptor que tínhamos na casa, não havia ainda o acesso a televisão, seu sinal nem existia na região, só podíamos ouvir músicas religiosas, sacras, clássicas e eruditas, nada que trouxesse ou lembrasse a alegria ao nosso íntimo , tamanha era a sensação de consternação que pairava sobre as pessoas, como no caso anterior, da alimentação, nós crianças, acompanhávamos o mesmo ritmo dos adultos, mais uma vez contrariados, pois, ficava suspenso toda e qualquer brincadeira com os colegas circunvizinhos. Assim, a situação era extrapolada para outras atividades, tínhamos que manter aquele espírito de perda, um verdadeiro velório.
            Hoje, depois de mais de 50 anos, num mundo onde tudo é globalizado, os sentimentos estão dispersos, os valores migraram para além da fé, indiferentemente da religião que se pratica, e pelas múltiplas seitas que existem, e de forma incorporadas à nossa sociedade, tornando bastante diversificada as práticas religiosas; verificamos que essa mutação foi responsável pelas mudanças radicais até mesmo nas religiões já existentes à minha época.
           Outros fatores também contribuíram para a renovação comportamental, hoje temos pressa, tudo é rápido, temos pressa em aprender, ensinar, fazer, executar e continuar. Esse sentimento de competição que há dentro de cada um de nós nos torna mais indiferentes aos nossos pares, quando não aos nossos irmãos. Ficamos sem tempo para nos dedicarmos um pouco aos nossos familiares; com os mais próximos não nos sentamos à mesa para deliciarmos um peixe ou um prato feito especificamente para essa data, quando muito mandamos e-mails, torpedos, um telefonema rápido, preferencialmente se a quem nos dirigimos tem a mesma operadora que a nossa, para que a ligação fique mais barata, afinal temos alguns parentes que merecem pelo menos lhe desejar, se não pessoal, não há tempo de ir até lá, mas via fone, de uma boa páscoa, e muito rapidamente, se possível!
            Assim vamos nos perdendo, por entre a pressa e a falta de carinho para com aqueles que um dia foram tão importante para nós, nossos pais, se ainda os temos, merecem um pouco mais de dedicação, na ausência de um carinho mais afetuoso; nossos filhos, continuam sendo nossos filhos, em todas as fases necessitam a nossa aproximação, nossa orientação, ele pode ter crescido, já com seus filhos, mas continuam carentes, assim como nós, de um abraço, um beijo e o desejo de uma páscoa feliz.
            Até mesmo para aquele a quem dedicamos essa data, da sua ressurreição, por tudo que ele passou em defesa do nosso futuro, e o que ele representa para nós cristãos, estamos de certa forma sendo ingratos para com ele. Já não temos de agradecer pelo que somos, quando muito, só temos a pedir, nos falta tempo de lhe falar carinhosamente, pausadamente, em respeito a tudo aquilo que ele já nos deu, muitos vezes, como fazem alguns, em vez de nos curvarmos no seu altar e lhe pedir desculpas pelas nossas culpas e nossos fracassos, quantas vezes pela nossa prepotência ao acharmos que sabemos tudo, portanto, nos achando poderosos, e como tais, somos levados pela pressa, a gritar como se ele fosse um surdo e não merecesse o nosso respeito na nossa prece, preferencialmente silenciosa e franca, humilde a grata por mais esse domingo de páscoa.
           Nesse domingo de páscoa começa a se renovar, se refazer, procure o seu amigo que você não o cumprimenta por bobagens, ele que representou o irmão que você não teve, o vizinho que você esquece de lhe dar bom dia no seu dia a dia, seus parentes distantes ou perto, tire o carro garagem ou pegue um ônibus, visite-os, aquela pessoa que está doente, aflita, precisando muitas vezes de um carinho em forma de palavras, quem sabe, até mesmo um medicamento barato que lhe tire dor da sua enfermidade e não tem mais recursos para compra-lo, alguém que por razões outras não terá uma mesa farta, nem mesmo uma mesa posta, um pão para essa pessoa representa uma boa páscoa. Pense nisso antes de ir ao banquete que você servirá aos seus convidados. Assim pensando, você estará agradando principalmente aquele que devia ser o seu principal convidado do dia, pelo menos em espírito. ESSA TAMBÉM É UMA FORMA DE ORAÇÃO, BOM DOMINGO DE PÁSCOA.
*Escritor e Poeta

Momentos de reflexões fazem parte da inteligência Momentos de reflexões fazem parte da inteligência Reviewed by Clemildo Brunet on 4/20/2014 06:41:00 AM Rating: 5

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