Ariano
Onaldo Queiroga |
Onaldo Queiroga*
O cavaleiro descendente do
pragal das Altas Beiras, da Nau Catarineta e da Barca Bela, logo após seu
nascimento, conheceu o exílio e a viagem.
No Reino da Acauhan, deu
seus primeiros passos. Nas margens de um riacho, num crepúsculo cheio de
presságios, assistiu ao único pôr do sol em companhia de seu pai. Nos imensos
lajedos intercalados por areias repletas de fósseis de um antigo fundo de mar que
banhou aquele pedaço esquecido de sertão, uma piranha morta reluzia a luz do
inferno em meio ao enigmático ocaso. Na sua visão, um prenúncio confirmado com
um tiro traiçoeiro que matou seu pai. Na poesia intitulada “O Reino”, descreveu
o sol negro da morte em sua vida: “Aqui morava um Rei, quando eu menino /
Vestia ouro e
castanho gibão / Pedra da sorte sobre o meu destino / Para mim,
seu cantar era divino / quando, ao som da viola e do bordão / cantava, com voz
rouca, o desatino, o sangue, o riso e as mortes do sertão. / Mas mataram meu
pai. Desde esse dia / eu me vi como um cego, sem guia / que se foi para o sol,
transfigurado. / Sua Efigie me queima. E sou a presa, / ele a brasa que impele
ao fogo, acesa / espada de ouro em pasto ensanguentado”.
E a vida lhe entregou a
estrada. E os ventos levaram-no para Recife. Sob o relógio do céu, que tem o
sol-ponteiro com guia, foi ele caminhando pelo tempo até que se fez advogado.
Mas, como dizia, era causídico de nenhuma causa. O mesmo tempo lhe entregou o
destino da cultura. Dramaturgo, escritor e poeta, foi assim que se mostrou ao
mundo, notabilizando-se como o maior defensor de sua terra e de seu povo. Não
trocava o seu oxente por ok de seu ninguém. Escreveu sobre seu reino e contou
causos extraídos de suas andanças por seu mundo, Taperoá. Atravessou eras e
pisou os caminhos dos cabelos brancos. Indagado se não estava na hora de parar,
respondeu: “Tenho duas armas para lutar contra o desespero, a tristeza e até a
morte: o riso a cavalo e o galope do sonho. É com isso que enfrento essa dura e
fascinante tarefa de viver." O autor de “O auto da compadecida”, sempre
afirmava: “Arte pra mim não é produto de mercado. Podem me chamar de romântico.
Arte pra mim é missão, vocação e festa”.
Vinte e três de julho, um
dia como outro qualquer. Será? Acho que não. As datas amanhecem trazendo
consigo a vida ou a morte. Naquele dia, o sol da morte veio como bem dizia sua
poesia, "com a luz do sangue". Entre o amor e a morte, a vida e o
obscuro, o mundo e o terrível, ele costumava dizer: “A morte é uma mulher, uma
divindade e ao mesmo tempo terrificante, mas acolhedora e que tem nome, se
chama Caetana”. Fica a lembrança das aulas espetáculo segurando o público por
horas. Histórias engraçadas, mas que tocavam na ferida. Adeus, Ariano. Até
outro dia!
*Escritor e Juiz de Direito da 5ª Vara Cível de João Pessoa
Ariano
Reviewed by Clemildo Brunet
on
7/26/2014 09:09:00 PM
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