Minha família – uma história de luta
Ignácio Tavares |
Ignácio Tavares*
Se minha Mãe
fosse viva, no próximo dia 4 de outubro estaria a completar 113 anos, pois,
nasceu no dia 4 de outubro de 1901. Mas, infelizmente nos deixou no dia 21 de
abril de 1995, quando estava pra completar 94 anos. Em vida foi Mãe e Pai, pois
conheceu a viuvez aos 47 anos quando o seu esposo José Tavares faleceu no dia
18 de abril de 1948, aos 56 anos.
Foi um momento difícil, posto que o meu
Pai, provedor das nossas necessidades havia encerrado suas atividades
comerciais no ramo de varejo e
atacado, onde permaneceu por 22 anos, ao longo
da sua curta vida. Estabelecido em edifício próprio tinha tudo pra prosperar
mas, a maioria da sua clientela que era constituída por pequenos proprietários
e trabalhadores rurais, que com certa frequência atrasavam a quitação de suas
contas, principalmente nos anos de inverno irregular.
Desse modo, sem o nosso Pai, sem a
renda da atividade comercial, só restaram às terras herdadas dos nossos avós de
onde havíamos de tirar o sustento de cada dia. Isso mesmo, com o falecimento do
nosso Pai ficamos todos atordoados, mas, com firmeza e trabalho nos reerguemos
e deixamos a crise pra trás. Assim sendo, nos foi possível pagar o que devíamos
e ainda gerar renda a fim de assegurar o sustento familiar.
Insisto
em dizer nada foi fácil porque as finanças da família ficaram abaladas, posto
que, tínhamos que pagar dívidas em farmácias, entre outras, para pouco dinheiro
disponível. Os restos a receber dos clientes devedores, em regime de caderneta,
não foram recebidos tal qual a gente esperava. A minha Mãe, habilidosa como
sempre, encarou a situação com coragem e determinação com o propósito de pôr as
coisas no seu devido lugar.
Dessa
forma, em pouco espaço cada um dos sete filhos estava a exercer uma atividade
graças a orientação que a nossa Mãe nos deu. No seio familiar foi adotada a
chamada divisão trabalho. Os dois irmãos mais velhos, Francisco e Filemon,
aprenderam o “ofício de alfaiate”, por conseguinte foram trabalhar na
alfaiataria do tio Lelé. A labuta da
casa ficou sob os cuidados da irmã Emerique e nossa Mãe. Outra irmã, Severina
foi morar em Cajazeiras, na casa do nosso tio Acrizio.
A outra, Maria de Lourdes, Lia,
viajou pra João Pessoa, com a finalidade de fazer o curso de técnica em
enfermagem. Dois anos ao retornar, foi nomeada para prestar serviços no Posto
de Puericultura, da Rede, Legião Brasileira de Assistência à Criança (LBA). Por fim, sobrou para mim e o meu irmão Felix
o eito, seja a labuta da terra. Desse modo ficamos com a difícil tarefa de
extrair da terra o sustento básico da família.
A nossa casa sempre foi um ambiente de
paz e tranquilidade. Ninguém tinha o
privilégio de ficar parado de braços cruzados, a ver o tempo a passar. Dentre
todos meus irmãos, sempre tive uma atenção especial a Felix, porque fomos nós
dois que recebemos a mais estafante e pesada tarefa familiar, como já disse,
extrair da terra, através do trabalho, o sustento básico da família.
A
tarefa que recebemos nos uniu cada vez mais. A toda hora estávamos juntos
compartilhar as mesmas dificuldades, mas estávamos sempre a sonhar com um futuro
que nos parecia distante. Certa vez falei pra o meu irmão que iria estudar na
Califórnia, nos Estados Unidos da America. Fui advertido por sonhar alto
demais, pois muito mal podia estudar em Pombal, quanto mais no exterior.
O tempo passa. Em 1973 recebi o
convite para fazer doutorado na Universidade de Tukson, no Arizona, justo nos
Estados Unidos da América. Ao passar esta informação pra o meu irmão, aflorou
na sua lembrança a nossa conversa de tempos atrás. Com os olhos a brilhar
falou-me: você errou o lugar, não foi? Realmente havia lhe dito que iria
estudar na Califórnia, mas o convite foi para o Estado do Arizona. Infelizmente
não pude aceitar o convite por razões outras, pois, ao concluir o mestrado em
economia, casado de novo, tinha que trabalhar para poder organizar a minha
vida, bem como a nova família que estava por vir.
Sonhar
fazia parte da nossa convivência. No nosso dia a dia caminhávamos em direção ao
sítio pela mesma estrada, pelo mesmo caminho.
O meu irmão sempre caminhava à minha frente. Na lama, ficavam suas
pegadas, que eu aproveitava para pôr os pés pra evitar espetadas de espinhos.
Quem vinha atrás podia até dizer: por aqui passou uma pessoa, porquanto, éramos
duas. Sim, passaram dois irmãos que, caminhavam juntos a fim de cumprir suas
obrigações, como membros de uma família que trabalhava unida.
Foi tudo assim mesmo, sem cortes ou
recortes. Com certeza, ao longo das nossas vidas, nossos pais nos ensinaram os
caminhos da convivência em harmonia familiar, do saber, da honestidade,
condições necessárias pra construirmos uma vida fundamentada na dignidade. Este
é o nosso grande legado imaterial, que obstinadamente estamos a repassar para os
nossos filhos e netos. .
Enfim,
somos frutos de um projeto idealizados por duas criaturas que se amaram e cujos
laços de união e felicidade tangenciaram as raias da perfeição. Se não fora a
morte prematura do meu Pai, com certeza teria sido melhor, mas infelizmente
ninguém é capaz de deter as imprevisões da vida, não é? Obrigado Deus pelos
Pais que nos destes!
João Pessoa, 01 de Outubro de 2014
*Economista
e Escritor
Minha família – uma história de luta
Reviewed by Clemildo Brunet
on
10/01/2014 03:22:00 AM
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