OS JOGADORES DE SUECA
Ignácio Tavares |
Ignácio
Tavares*
Tenho sido recorrente ao afirmar que por
muito tempo Pombal foi uma cidade de poucas alternativas de lazer. Pra
completar, nos anos cinqüenta a cidade passou vários anos na escuridão sem os
benefícios da energia elétrica.
A lua
era a nossa única fonte de iluminação noturna. Mesmo assim, na sua ausência
quinzenal, seja, sem o seu clarão, a gente saia pra noite na certeza de
encontrar os amigos mediante encontros previamente estabelecidos. Estávamos
acostumados a essa situação é
tanto que era possível identificar um amigo,
mesmo na escuridão, isso porque nos aperfeiçoamos a distingui-lo dos demais
pelo timbre da voz.
Os
pontos mais indicados para os encontros eram o cruzeiro, o busto de Getúlio
Vargas, a coluna da hora, o calçadão da Igreja Nova, entre outros. Sem o clarão
da lua a escuridão era forte, mesmo assim fazíamos serenatas, entre outros
prazeres noturnos que o momento nos permitia.
Ninguém ousava atravessar a linha do trem,
porque sem energia o ambiente era carregado. Isso acontecia somente nas noites
de luar. O cabaré, mesmo na escuridão atraia muita gente, principalmente a
rapaziada que morava nas proximidades do ambiente.
Por
isso vez por outra havia brigas cujo resultado era alguns feridos a golpes de
faca peixeira, até mesmo a tiros de armas de fogo. Era perigoso, portanto não
valia pena freqüentar o ambiente nas noites de escuridão. Assim nos
contentávamos em permanecer no centro da cidade até a hora de retornarmos a
casa para o sono dos justos.
Para o pessoal idoso a diversão era jogar
sueca. É um jogo simples, onde cada participante recebe aleatoriamente dez
cartas. Um naipe é escolhido como trunfo, que permite ao participante
apropriar-se das cartas sobre a mesa, quando não dispõe do mesmo naipe das
cartas expostas. Ganha os parceiros que fizerem maior quantidade de pontos.
Em
várias casas esse jogo era comum entre pessoas que se conheciam. Havia um jogo
de sueca casa de Chiquinho Formiga cujos participantes eram pessoas da
intimidade da família. Na época sua residência ficava em frente à casa de Dr.
Geraldinho, transversal à Rua Jerônimo Rosado.
Cândido,
meu tio, jogava em parceria com Janjão, um primo/tio de Chiquinho Formiga. Do
outro lado seu Chiquinho fazia parceria com a sua esposa dona Candinha. Os
parceiros podiam combinar algumas jogadas a fim de por em xeque as artimanhas
dos adversários.
O
jogo rolava, até meia noite. Ao terminar, Candido seguia pra sua casa, em
companhia de Janjão, que morava no Rogério, um pouco mais a frente, seja, no
final do muro do Grupo Escolar. Tudo muito bem. Quando a noite estava enluarada
a caminhada era tranqüila. Acontece que numa dessas noites, à meia lua, o jogo
se estendeu alem da meia noite. Ao terminar saíram Cândido e Janjão para suas
respectivas casas.
A
Rua Jerônimo Rosado tinha poucas casas, de tal sorte que no decorrer da
caminhada era possível visualizar toda área por trás da rua do Comércio.
Acontece que de repente apareceu o vulto de uma mulher a caminhar a passos
rápidos ao lado dos dois. Janjão incomodado com a situação perguntou: Cândido
você está vendo essa mulher sozinha, a estas horas, caminhar ao nosso lado?
Cândido medroso como sempre perguntou: que mulher Janjão?
Cândido já tinha visto o vulto, mas,
permaneceu em silencio, pois já estava bem perto da sua casa. Ao chegar a casa,
Cândido falou pra Janjão: olhe a mulher onde está! Ta vendo? Veja, está ali bem
perto, escorada na parede do Grupo Escolar. Janjão aprumou os óculos, mirou em
direção ao muro e confirmou: vixe Maria é ela mesma Cândido!
Janjão
assombrado perguntou: Cândido, aqui na sua casa não tem um cantinho de rede pra
eu dormir este resto de noite? Aqui não, respondeu Cândido. A minha casa tem muitas
moças não é interessante botar pra você dormir no meio delas. Cândido ao entrar
em casa bateu a porta, mas ficou a olhar pela brecha da porta e viu Janjão
correr em disparada em direção ao Rogério.
No outro dia Janjão apareceu com um braço na
tipóia. Cândido maliciosamente perguntou: que foi isso Janjão? --- Ora,
Cândido, quando cheguei perto de casa a mulher já estava em baixo do pé de
tamarindo a me esperar.
---Ô
Candido, pense num medo grande. Do jeito que eu ia mergulhei em direção a
janela caí dentro de casa de mau jeito, estou aqui todo quebrado. Não sei o que
queria aquela alma penada com nós dois. Agora Cândido, jogar sueca à noite nunca mais.
Assim terminou uma roda de sueca que fazia o lazer
noturno de quatro pessoas amigas. Cândido teve mais medo do que Janjão, mas,
fez-se de forte, somente pra no outro dia gozar com a cara do amigo, que
abjurou para sempre o jogo de sueca, principalmente à noite.
João
Pessoa, 28 de Outubro de 2014
*Economista e
Escritor
OS JOGADORES DE SUECA
Reviewed by Clemildo Brunet
on
10/27/2014 06:07:00 PM
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