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NO TEMPO DA BOLACHA PETECA

05.04.2011 - Pombal

Ignácio Tavares
Foi-se aquele bom tempo em que no centro de Pombal, mais precisamente nas mediações do mercado central, localizava-se a maioria das casas comerciais e pequenas indústrias de alimentos. Fora desse setor não existia comercio, salvo as bodegas localizadas em algumas poucas ruas mais afastadas do centro da cidade. Cafés, bares, padarias, hotéis restaurantes, armazéns de cereais, açougue, alfaiatarias, casas de tecidos confecções, entre outras atividades comerciais que davam vida, movimento ao chamado centro comercial da cidade.

Os cafés eram a grande atração. O café de Maria Joana era conhecido pelo doce de leite, cocada de leite e pão-de-ló. Não obstante a irreverência da dona do café, o local era bastante frequentado por fregueses assíduos. O café de Sinhá, esposa de Antônio Carrasco oferecia bolo de batata, de milho, cuscuz com leite, coalhadas, queijo assado na grelha, entre outras iguarias de sabores diversos.


O café de Miranda concorria com Sinhá e Maria Joana ao oferecer os mesmos produtos, com destaque para cocada de leite com pão quente, doce de coco, pamonhas, canjicas, iguarias bastante procuradas pelos apreciadores de um bom repasto fora de casa. Mas, a grande atração da área era mesmo a Padaria Vitória de propriedade do saudoso Napoleão Brunet de Sá. Produzia e vendia pães de boa qualidade, sobretudo, quentinhos feitos na hora ao gosto dos fregueses.

A Padaria vendia-se de tudo. Era uma casa comercial bem sortida de atendimento solícito o que a fazia mais procurada da cidade. Se chegasse com dinheiro comprava. Da mesma forma, se não tivesse o vil metal, a casa oferecia o credito em caderneta para ser pago quando o freguês pudesse. Nesse tempo esse tipo de crédito podia porque não existia inflação. Assim sendo, ninguém saia da casa comercial de seu Napoleão de mãos abanando, como se costumava dizer naquela época.

Entre todos os produtos vendidos na Padaria Vitoria havia um que era a alegria da meninada. Era a bolacha peteca. Redonda, pequenininha, crocante, de sabor agradável. Hoje, não se fabrica a bolacha peteca como aquela de antigamente. O padeiro preferencial do senhor Napoleão era Sebastião Monteiro, bastante conhecido na cidade por ser um exímio mestre na arte de fazer pães e bolachas. Este era o segredo do sabor agradável da bolacha peteca da Padaria Vitória, posto que, só quem sabia da fórmula e o ponto ideal para o produto ir ao forno era Sebastião Monteiro.

Eu disse que a bolacha peteca era a alegria da meninada. Era isso mesmo. Naquela época a gente estudava no Grupo Escolar João da Mata. Cada um levava o lanche numa sacola com um bordado em alto relevo onde se lia o nome do aluno e a palavra “lanche”. No decorrer das aulas, havia uma hora determinada para o lanche. Na sala de aula cada aluno pendurava a sacola ao lado da carteira, inteiramente desatento, sem perceber que por trás, vez por outra, aparecia um ladrãozinho de lanche.

A grande maioria levava na sacola um punhado de bolacha peteca, a exceção dos mais abastados que levava queijo com goiabada, pão com nata ou manteiga da terra, entre outros tipos de lanches mais refinados. No horário determinado, uma campainha tocava e a professora nos avisava: é hora do lanche. Alguém gritava: professora pegaram minhas bolachas peteca! Neste caso havia uma contra ordem: não sai ninguém enquanto não se descobrir quem foi esse engraçado que pegou as bolachas peteca de fulana de tal.

A reclamação era geral. Outros alunos queixavam-se que alguém enfiou a mão nas suas sacolas. Começava o interrogatório, cujo foco era aqueles alunos que não levavam lanches. A professora iniciava o interrogatório: ei, Ribinha, está ai muito calado não é? Ora professora tanta gente aqui sem lanche a senhora se engraçou de mim? E você Benone, irmão de Ribinha, de que é que está rindo? Ora, Professora estou rindo porque todo mundo está olhando pra mim. Não tenha nada a ver com essa história de bolacha peteca. Essa não! Respondeu Benone.

Como nada se descobria a professora autorizava a saída de todo mundo. Formavam-se grupos de três e mais alunos ou alunas, apesar do converseiro, ao longe dava pra escutar o troc, troc, troc, troc, da mastigação das bolachas peteca. Novamente a campainha tocava desta vez para retornarmos a sala de aula mesmo ainda a mastigar as últimas deliciosas bolachas peteca.

Foi esse o bom tempo em que a bolacha peteca, crocante, de sabor agradável, marcou presença em nossas vidas, graças à habilidade do padeiro Sebastião Monteiro e ao caprichoso proprietário da Padaria Vitória o saudoso Napoleão Brunet de Sá. Das boas lembranças ninguém esquece. Preservo na memória a imagem nítida do senhor Napoleão Brunet. Um homem forte, conversador, sobretudo elegante nas palavras e nas ações. Foi um homem respeitável como cidadão do bem, ainda, pelos relevantes serviços prestados à nossa comunidade como dedicado produtor dos pães e da bolacha peteca nossa, de cada dia.

João Pessoa(PB), 05 de Abril de 2011.

*Ignácio Tavares de Araújo é graduado em Economia com especialização em Planejamento e Pesquisa Sócio-Econômica. Professor da disciplina "Micro Economia" do Departamento de Economia da UFPB e Economista aposentado da Secretaria Estadual de Planejamento do Estado da Paraíba.

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