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Baby, não me deixe tão sozinho!

Ricardo Ramalho
Ricardo Ramalho*

O cenário é Alagoa Grande, simpática cidade do Brejo Paraibano, onde ensinei Biologia por dois anos no Colégio Estadual. Ali aprendi, sobretudo, a ser mestre, professor e aumentar, ainda mais, a paixão pela ciência e o conhecimento. Descobrir reações singulares, afastar temores. Mas, também viver emoções, repletas de prazeres, de luzes. Naquela vivência, me apaixonei por uma garota, um ser que exalava doçura, meiguice e contentamento. Estudava no mesmo colégio, mas, não era aluna minha.  
            Corriam os últimos meses do curso de Agronomia e
se aproximava o final do ano, das aulas de biologia, o término de um ciclo, glorioso em minha vida. A expectativa dessa ruptura me deixava, ao mesmo tempo, alegre e tenso, apreensivo com a drástica mudança de estudante para profissional. Apegava-me cada vez mais a namorada que me completava e trazia felicidade. Uma paixão retumbante e progressiva. Mas, surgiram boatos de traição, típicos do meio em que vivíamos. A prática era disseminada e muito considerada na época, diferentemente do comportamento que reina na atualidade. Assim, rompemos tangidos por esse clima, alimentado, inclusive, por outras “concorrentes”. Entretanto, não conseguia me afastar daquela constante lembrança, daquele clamor que vem de dentro de nosso âmago. Como incomodava, como doía, como perturbava aquele sentimento! As despedidas do final da faculdade, a efusão dominante, me levaram a muitas e longas comemorações. Foi quinze dias de bebidas e farras que encobriam, de certa forma, a dor que sentia pela perda da namorada. Parecia que havia uma solidariedade coletiva, involuntária, dos colegas e amigos naquele período. Sem querer me acalentavam e tentavam sarar as feridas daquele desfecho não esperado.
          Passada a fase crítica do término do relacionamento, entraram em cena atores do “deixa disso”, da reaproximação. Desmentidos, juras e, finalmente a capitulação: um bilhete, da própria, convidando para uma conversa, que, naturalmente, conduziria a um reatamento do namoro. Minha autoestima se elevou, meu ego encontrou uma motivação, uma justificativa para me embriagar, desta vez, bebendo a paixão reprimida, voltando a namorar quem não esquecia. Sua mãe iria se mudar para o Rio de Janeiro e ela estava em dúvida se a acompanhava ou se continuaria em Alagoa Grande, com sua avó. Portanto, minha participação nessa decisão era muito importante, pesava consideravelmente.
            Ainda ministrava aulas e aplicava as provas finais no colégio. E agora: ia ou não ao encontro? Resolvi que sim. A casa indicada era perto, aproveitaria um intervalo das aulas e, certamente, voltaria ao antigo namoro. Dirigi-me ao local e nesse percurso pensava se devia ou não fazê-lo. O orgulho machista lutava contra a paixão. Que batalha! Venceu o primeiro e interrompi a caminhada, retornando, amargurado, às aulas. Na triste caminhada da volta, uma “radiola” ecoava um sucesso do momento. Era “The Fevers”, grupo musical que embalava sonhos e festas, cantando uma versão de “Tomorrow”, de Paul McCartney que, diferentemente, do original, com pobreza poética dizia: “oh! baby não me deixe tão sozinho, eu não sei viver sem teu carinho...”. Segurei as lágrimas e voltei para as classes do colégio.

*Cronista pombalense radicado em Maceió Alagoas. 
Baby, não me deixe tão sozinho! Baby, não me deixe tão sozinho! Reviewed by Clemildo Brunet on 4/17/2015 11:13:00 AM Rating: 5

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