Breves considerações tecidas em cordel sobre Tenório Cavalcanti
Marcela e José Romero |
José
Romero Araújo Cardoso*
Marcela
Ferreira Lopes*
Em junho de 1987, Gonçalo Ferreira da
Silva escreveu interessantes passagens em cordel sobre a vida, lutas e desafios
enfrentados pelo alagoano Natalício Tenório Cavalcanti de Albuquerque
(Quebrangulo-AL, 27 de setembro de 1906 — Duque de Caxias, 5 de maio de 1987),
que ficou conhecido como o “Rei da Baixada” e também como “o homem da capa
preta”.
A literatura de cordel, através da
produção do renomado poeta popular, assinalava a passagem para a eternidade de
uma das mais polêmicas figuras públicas do País, cuja imortalidade granjeou-a
através de atos e
atitudes ainda hoje difícil de ser
analisados de forma concisa e imparcial.
O cordel de autoria de Gonçalo Ferreira
da Silva destaca que Tenório nasceu em Palmeira dos Índios. Infelizmente uma
das falhas é não enfatizar datas de nascimento e falecimento do polêmico
nordestino que fez história no País, sobretudo na área mais miserável da região
Sudeste.
Sertanejo nordestino sofrido que migrou
para o Rio de Janeiro, então capital federal, no fim dos anos 20 do século
passado, Tenório Cavalcanti incorporou misto de herói e bandido, intelectual
sério e compenetrado e pistoleiro cruel e sanguinário, no mais puro estilo do
seu torrão natal, abraçando a política como forma de efetivar seus objetivos,
tendo se filiado à União Democrática Nacional, partido pelo qual disputou
inúmeros pleitos eleitorais, vinculando-se ainda, em certo momento, ao Partido
Trabalhista Nacional.
Metido em todo tipo de confusão
imaginável, diziam que tinha o corpo fechado, pois inúmeros atentados contra
sua vida foram realizados, saindo incólume em razão do colete à prova de balas
que usava. Mais de sessenta marcas de tiros ficaram fixadas em seu corpo,
resultado das brigas corriqueiras e querelas políticas de grande envergadura
que integraram indelevelmente seu cotidiano.
Tenório Cavalcanti ficou conhecido como
“o homem da capa preta”, a qual, enquanto componente de sua indumentária, em
verdade, era uma beca de formatura que ganhara de um estudante que ajudou
bastante, presenteada como forma simbólica de demonstrar gratidão pelo auxílio
que um rapaz pobre recebera do destemido nordestino.
A capa preta que incorporara ao seu
perfil servia para esconder uma metralhadora que ele cuidava com todo carinho e
que todos conheciam pelo apelido de “Lurdinha”, da qual nunca se separava,
incluindo momentos nos quais desempenhou mandatos parlamentares.
A temida “Lurdinha” fora-lhe presenteada
pelo Ministro da Guerra de Vargas, General Goes Monteiro, admirador
incondicional de homens de coragem e determinação, exemplo assumido sem
recalque pelo destemido alagoano.
O cinema nacional enfocou Natalício
Tenório Cavalcanti de Albuquerque em filme dirigido por Sérgio Rezende no ano
de 1986 no qual José Wilker protagonizou de forma ímpar o destemido alagoano
que levou o comportamento humano às raias da complexidade.
Homem afeito à violência constante nos
sertões alagoanos, Tenório Cavalcanti nunca levou desaforo para casa,
protagonizando reedições do modus operandi de um povo brioso, de sangue quente,
na Duque de Caxias violenta marcada pelo “olho por olho, dente por dente”,
principalmente nas décadas de quarenta e cinquenta do século XX.
A residência de Tenório Cavalcanti em
Duque de Caxias era uma verdadeira fortaleza, cheia de labirintos e passagens
secretas. Diversos perseguidos políticos pela ditadura militar foram acolhidos
pelo “homem da capa preta” em seu território inexpugnável e indevassável.
Respeitado em todas as instâncias que
marcaram sua atribulada existência, desafiou com coragem inaudita estruturas de
poder da qual fez parte, chegando a disputar pleito eleitoral com Carlos
Lacerda, no qual saiu derrotado, mas não humilhado.
Autodenominava-se de “o terror dos
valentes”, pois não foram poucas vezes que enfrentou o autoritarismo de
inimigos poderosos, matando e mandando matar aqueles que se atreviam tentar
obstacular seu caminho.
Padrinho de incontáveis seres humanos
espalhados pelo Brasil, Tenório tornou-se uma espécie de “moralizador” da conturbada
Baixada Fluminense, lócus da fixação de milhares de nordestinos que fugiam da
seca e da ausência da ação do Estado e da iniciativa privada.
Membro da Academia Brasileira de
Literatura de Cordel, Gonçalo Ferreira da Silva enriqueceu significativamente a
autêntica literatura nordestina ao abordar a figura mítica do valente sertanejo
alagoano em cordel intitulado Morreu o Valente Tenório, pois figura singular
que marcou época, Natalício Tenório Cavalcanti de Albuquerque, o homem da capa
preta, foi imortalizado como sinônimo de coragem e obstinação inauditas.
*José
Romero Araújo Cardoso. Geógrafo. Escritor. Professor-Adjunto do Departamento de
Geografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade do
Estado do Rio Grande do Norte. Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente.
*Marcela
Ferreira Lopes. Graduada em Geografia-UFCG/CFP. Especialista em Educação de
Jovens e Adultos com ênfase em Economia Solidária-UFCG/CCJS. Graduanda em
Pedagogia-UFCG/CFP. Membro do grupo de pesquisa (FORPECS) na mesma instituição.
Breves considerações tecidas em cordel sobre Tenório Cavalcanti
Reviewed by Clemildo Brunet
on
9/19/2015 05:49:00 AM
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