A Síria ainda não é aqui!
João Costa |
João
Costa*
Vamos
falar de guerras, pois só elas modificam o mundo pra melhor – promovem assepsia
humana de tempos em tempos; avanços na medicina e tecnologias e encerram a
sociedade nos limites da civilização, já que a guerra é um passeio pela
barbárie. É a tal profilaxia necessária
e inevitável que persegue a raça humanidade desde a sua aurora. Em primeiro
lugar, qualquer motivo é um bom motivo para um conflito. Para os belicistas o
melhor de todos é o religioso, mais ou menos assim: “nós somos o bem, o outro é
o mal”. A Síria ainda não é aqui!
A guerra civil na Síria se arrastava por
mais de cinco anos, sem perspectivas de
vencedores, nem o governo constitucional, nem muito menos dezenas de grupos
étnicos religiosos, além da organização que resultou da al-Qaeda, chamada de
Daesh.- que virou a maior ameaça do Ocidente, na ausência do tal inimigo
eterno- o comunismo. Aí a seguinte cena real: estádio lotado para uma partida
de futebol em Ancara, Turquia. O locutor turco pede um minuto de silêncio pela
morte de um piloto russo, abatido por aviões da própria Turquia – num incidente
de invasão de espaço aéreo, segundo a Turquia, e
não numa cilada armada pela aviação turca e o
Pentágono, como se comprovou depois. O minuto de silêncio não durou sessenta
segundos e foi interrompido por um louvor único e uníssono de todos os
torcedores: Allahu Akbar!
Moral do jogo, a Turquia, embora se ache
Europa e de modos cristãos e ocidentais é islâmica e asiática. Desculpas do
governo turco sobre a derrubada do avião russo foi só encenação.
Pula. Os Estados Unidos lidera uma
coalização de uma dezena de países que diz combater o Daesh, que a mídia
ocidental batizou de EI (Estado Islâmico) - e todos sabem que o EI nem é estado
e muito menos islâmico. O Daesh tenta criar um Califado nos moldes do profeta
Maomé, aplicando a Sharia – para o Ocidente uma violação dos direitos humanos e
atentado à civilização. A Arábia Saudita – que também combate o Daesh – é
aliada do Ocidente, pratica a Sharia, mas sem problemas, pois é um Califado
amigo e tem tolerância total do Ocidente - o petróleo é das petroleiras
americanas e da família real saudita e seus príncipes!
O avião russo foi abatido, um dos
pilotos foi morto por rebeldes sírios e o próprio líder da Divisão Costeira dos
Turcomenos, chamado Alparslan Celik, apareceu se gabando de ter matado o
piloto; o outro foi resgatado. Por quem? Pelos russos? Não.
O piloto que sobreviveu foi resgatado
por um esquadrão especial de libaneses do Rezbollah (Partido de Deus), soldados
sírios e fuzileiro russos, que lutam ao lado do governo sírio contra o Daesh.
No comando dessa unidade, ninguém menos que o general iraniano Qasen Soleimani,
general do Exército de Guardiães da Revolução Islâmica (do Irão), tido há
décadas como morto pelos serviços secretos do
estado sionista e americanos, mas que agora reaparece e na frente de
combate. Soleimani é uma espécie de comandante Guevara da atualidade para os Jihdistas islâmicos.
Resumo
da ópera
De um lado, os Estados Unidos e seus
aliados financiam e apoiam com bombardeiros opositores do governo sírio e, por
tabela, o EI, que a mídia alardeia ser uma organização “terrorista” que
americanos, franceses, belgas, alemães, turcos e outros países alegam que
combatem. Do outro lado a Rússia, Irão e o Hezbollah também atacam o tal Daesh,
mas defendem, inclusive militarmente, o governo sírio. Esse é o cenário da
guerra em curso na Síria, que a exemplo da Líbia e Iraque deixaram de serem
estados organizados, destruídos que foram pelo Ocidente. A Síria é exemplo
clássico de guerra civil que evolui para conflito entre dezenas de países e
interesses múltiplos – étnico-religiosos e econômicos. Como há muçulmanos até
na China, chineses também mandaram para lá seu primeiro porta-aviões, ainda em
fase experimental.
A Síria, todos sabem, é o berço de
nascimento do cristianismo. Já foi predominante cristã, lembrando que foi por
lá, que Paulo de Tarso se converteu, isso dois milênios atrás. Agora, 2
milênios depois, a Síria é, de novo, o palco de uma guerra que se notabiliza
como embrião da Terceira Guerra Mundial, que terá ou já tem sua razão: o
conflito de civilizações. Pode-se resumir, afirmando que está em curso uma nova
Cruzada contra o Islão. Os desdobramentos estão em curso e esta guerra é e será
híbrida.
Brinquedos de guerra
Os russos estão esbanjando na Síria
armamentos sofisticados. Quem imaginava o Exército Vermelho ao estilo
soviético, com colunas infinitas de tanques leves e pesados além de milhares de
soldados em terra, se enganou. A Marinha russa faz uso dos bombardeiros SU- 24
e jatos de ataque, sistema de defesa aéreo Pantsir-1 (comprado recentemente
pelo Brasil para a Olimpíada) além de helicópteros, mísseis de cruzeiro
disparados de navios pequenos a partir do Mar Cáspio, ao contrário do
Mediterrâneo, que banha a Síria. Isso fez com que os Estados Unidos retirassem
do Mediterrâneo o porta-aviões nuclear USS Enterprise. Ficando claro que na
guerra moderna os porta-aviões, esses vasos de guerra maravilhosos, são
vulneráveis a mísseis de cruzeiro, quando disparados de navios pequenos
simultaneamente.
E lembrando fazendo um comparativo, que
a Marinha do Brasil tem seu porta-aviões, o São Paulo, de origem francesa e
ainda do tempo da Guerra da Coréia, que está em reforma e modernização há quase cinco anos. Fez
recentemente um teste no litoral São Paulo-Rio, ao tempo que o submarino
nuclear só estará em operação em 2025. Até lá, como defender o pré-sal? Se
antes o Brasil não entregar para a Chevron. O PSDB e parte do governo Dilma
estão cuidando disso no Congresso.
Depois da derrubada do su-24, a Rússia está
estacionando em solo sírio baterias de mísseis S-400, mais letais que os S-300.
Só os simpsons acreditam que tudo isso, mais os mísseis e aviões utilizados
pela França e Estados Unidos combatem contra “terroristas” do Daesh.
Bola da vez
O Brasil vai sediar a Olimpíada de 2016,
se colocando na mira desse conflito que tem na guerra híbrida o lado mais
ameaçador: o terror. E terrorismo, é bom avisar, é um método (usado pelo lado
mais fraco na guerra), não uma ideologia como a mídia propaga. Digo isso porque
ouvi, na fila de um caixa de um magazine, um pastor alardeando que os
“terroristas islâmicos fanáticos e assassinos” terão ingresso no Brasil por
causa do torneio, facilitado pela Dilma, que também é “terrorista”. Por tabela,
as famílias, as criancinhas a moral e bons costumes serão varridos de vez –
isso eu escutei.
E estamos apenas em 2015, ano em que o
Brasil começou a se afastar do estado de direito com um governo paralisado por
uma crise econômica que nem das maiores é; encurralado pela oposição que não
deixa o governo governar, uma Câmara
dominada pela bancada BBB – Da bíblia, da bala e do boi – e um Senado repleto
de Delcídios. Mas aí já é o lodo, não a guerra.
*João Costa é
radialista, jornalista e diretor de teatro, além de estudioso de assuntos ligados
à Geopolítica. Atualmente, é repórter de Política do Paraíba.com.br
A Síria ainda não é aqui!
Reviewed by Clemildo Brunet
on
11/30/2015 10:49:00 AM
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