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Muito além de um tributo a Nelson Rodrigues

João Costa
João Costa*

Para sua consideração – A peça Álbum de Família, do impagável “Anjo Pornográfico”, Nelson Rodrigues, estreou no auditório da Estação Cabo Branco, e lá ficará em cartaz até amanhã, com direção de Flávio Melo. A peça vai muito além de um tributo a Nelson, é um espetáculo arrebatador para um público que tenha certa intimidade com a obra do mais importante dos nossos dramaturgos, e
também um presente para a cena teatral paraibana, dado pelo Núcleo de Artes Cênicas da Estação Cabo Branco, já em seu segundo trabalho.
Flávio Melo e seu elenco até que são pudicos, mas  suficientemente corajosos e talentosos; atrevidos até, em colocar no palco de um auditório o mais incompreendido texto de Nelson. São audaciosos em mergulhar na obra nelsonrodrigueana para exorcizar seu principal demônio: a família. E num momento em que a Comissão Especial da Câmara Federal discute o Estatuto da Família e já a definiu como união entre homem e mulher, num arroubo conservador, que nem se coaduna mais com a sociedade brasileira do século 21.
Álbum de Família, desnuda e expõe arquétipos intocáveis como os complexos de Eletra e de Édipo, passa ao largo da criminalização do amor entre adultos e crianças, expõe as vísceras das relações incestuosas com a naturalidade que assusta a civilização, especialmente a nossa, judaico-cristã.
Álbum de Família pela paixão de Flávio Melo e seu jovem elenco, simplesmente resgata a força do teatro paraibano, presentemente padecendo de um vazio que é até criminoso.
É evidente que a normalidade de um clã familiar logo é desmistificada pelo público acostumado ao senso comum, limitado a noção de criminalização e demonização das relações incestuosas, sexo entre adultos e crianças, mutilação genital, religião, fundamentos de Freud para a sexualidade e tragédia, que só Nelson Rodrigues foi capaz de conceber.
O elenco é uma boa promessa de jovens com bons talentos e recursos de interpretação. E vou mais além: é de surpreender a força dramática para a tragédia de um elenco formado de atores e atrizes que se apresentam mais que uma promessa como as jovens intérpretes, Elaine Maranhão, Milia Maggi, Deyse Borges, além de Pedro Ivo, Camila Oliveira e outros. Argilas a serem lapidadas. E o espetáculo é merecedor de aplausos em cenas abertas.
A prefeitura de João Pessoa tem um Núcleo de Artes Cênicas e não sabe. A Secretaria de Educação tem uma gestora como Mariane Góes na direção da Estação Cabo Branco e parece que também não sabe, porque se soubessem, trariam esta gestora para o proscênio na condução da cultura municipal. E Flávio Melo segue como talentoso teatrólogo paraibano que o serviço público municipal tem - e sabe menos ainda.
Ah! Antes que me esqueça. Certa feita, o então prefeito Ricardo Coutinho, manifestou interesse em procurar o então governador Cássio Cunha Lima, para propor a municipalização do teatro Santa Roza. A alegação, verdadeira, era que o estado tinha estrutura, mas não tinha recursos; a prefeitura padecia da inexistência de uma política cultural e sem estrutura física, mas tinha recursos para manter um Teatro Municipal, com toda demanda que isso requer. Sem briga paroquial e se houvesse bom senso e compromisso com a cultura, Cartaxo e Ricardo bem que poderiam municipalizar o Santa Roza, mas o pastoril política não permite.

*João Costa é radialista, jornalista e diretor de teatro, além de estudioso de assuntos ligados à Geopolítica. Atualmente, é repórter de Política do Paraíba.com.br
Muito além de um tributo a Nelson Rodrigues Muito além de um tributo a Nelson Rodrigues Reviewed by Clemildo Brunet on 11/12/2015 05:17:00 PM Rating: 5

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