Saudosa Revência
Ligia M. Arnaud Seixas |
Por
Ligia Maria Arnaud Seixas*
Revência
da minha infância e adolescência.
Lugar
cercado por serras, açudes e riacho.
A
seca não era tão marcante como agora.
Meses
de junho e julho, encantava aquele lugar, verde e com farturas.
Emergiu
na lembrança a fazenda dos meus avós, Chateau e Dalva. Essa terra era a paixão
do meu avô Chateau.
Cantinho
das férias do meio do ano.
A
natureza agradecia o encantamento do meu olhar.Tudo muito familiar. Valia a
pena estar ali.
Lembranças
de um tempo bem distante levam-me a ilusão de vivenciar as mesmas situações.Mas
é impossível.O que é
atroz para minha saudade.
Aqui,
sentada, a assistir ao pôr do sol, faço vôo alto das minhas recordações.
A
veracidade dos meus sentimentos é tão grande que rolam lágrimas por dentro.
Tempo
bom!
Mas,
como mágica, vem a alegria por ter tido a oportunidade de todas essas vivências
marcantes.
Ninguém
pode imaginar a alegria que eu sentia ao pôr meus pés nessa "terra".
O
futuro não me interessava.
Sem
o menor esforço, surge na mente tudo o que fiz de bom no meu tempo de criança.
Dois
meses era pouco para o que se tinha de trilhar naquele inefável lugar.Imaginava
as possíveis coisas que iriam viver com profundidade.
À
noite, na hora de desligar o motor, fornecedor de energia da época, eu, primos
e primas vencidos pelo cansaço, pois os momentos de brincadeiras eram
inesgotáveis.
Como
queria voltar e fincar, como antes, meus pés nesse lugar tão amado e querido, e
novamente inalar o cheiro gostoso de terra molhada...
Nessa
impossibilidade, relembro apenas.
Logo
cedinho, trazia minha avó Dalva, com sorriso largo e feliz, uma papinha
quentinha, feita por ela mesma, advertido-me para comê-la toda.
Ali,
naquele cativante cantinho do terraço em Ú,saboreava também, uma visualização
da beleza de uma paisagem deslumbrante.Essa mesma visão, à tardinha, ficava
mais fascinante, com o sol se pondo por trás das imensas e lindas serras.
Lindo
também era ouvir a melodia do cantarolar dos passarinhos.O movimento das
ajudantes na arrumação da casa e o entre e sai dos moradores, mostrava o dia
começar.
Das
brincadeiras gostosas e o contentamento dos meses ali vividos, o que mais me
traz a alegria e mistério era o banho de riacho.
Que
espetáculo de visão. Assistir o correr da águas entre as muralhas de pedras,
que a própria natureza transformara. Beleza do Criador.
Esse
percurso fluente era cercado de mata fechada com vegetações típicas da região.
Mas
nada nos metia medo, diante da realidade do perigo.Nessa idade, o limite e o
perigo parecem não existir.Podemos tudo.
O
sol forte,confrontava com as águas geladas que desciam sem rumo certo não
sabíamos onde iriam parar.
Da
cachoeira principal, aqui e acolá, se viam outras tantas pequenas quedas
d'água. Ali brincávamos esquecendo o tempo, só a sede e a fome, nos fazia
retornar à casa grande, como assim se chamava.
Incansáveis,
saíamos em meio às pedras seguindo o caminhar da correnteza, desbravando os
mistérios e investigando a grandiosidade do lugar.
Numa
dessas aventuras, descobrimos um poço denominando "o poço dos morcegos,
devido à quantidade desse animal que saia dali.
Todo
esse painel torna-se indelével para quem pisou aqui.Lindo!
Voltávamos
exaustos, mas felizes! Isso era assunto para dias. Como o dia estava longe de
acabar, nossa energia levava-nos a mais traquinices.
Hoje,
no meu banho diário, me imagino imersa naquela cachoeira, fazendo preces,
pedindo energia positiva, ritual belo e gratificante.E me faz voltar ao meu
lugar preferido da infância.
Aqui,
a sonhar, recordo outras ocorrências peculiares à idade...a saudade me
leva...mas deixo trancadas na memória.
À
noite chegava, lindo dia de alegria findava, dormíamos redobrando as forças,
encobertos pelo luar, inigualável,muito belo quando surge no sertão,
aguardávamos o outro amanhecer incrível para novas histórias.
Nessa
"terra", pedacinho doce e agradável, presenciei coisas como: o
preparar a canjica, o café ainda em grão a ser moídos, o ferro de engomar à
brasa, frutas fresquinhas,o leite tirado da vaca, o passeio a cavalo,
brincadeiras de bonecas, subir em árvores e saborear as frutas, crava nos
galhos do pé de siriguela nomes de pessoas queridas, o divertimento das festas
juninas com direito à fogueira, as guloseimas e sanfoneiro.
Admirava
o jardim da vovó Dalva, que além de belo exalava perfumes deliciosos. Aqui, na
varanda do meu pequeno jardim planto o jasmim e o bogari, flores cheirosas, que
imediatamente trazem a lembrança de uma mulher forte, espirituosa e caridosa,
Dalva Carneiro Arnaud, conhecida no sertão, onde vivia, como "A MÃE DOS
POBRES".
O
sol se foi, a noite a posou-se do tempo e eu volto à realidade do agora,
lembrando sempre que essas histórias nunca se apagarão e deverão ser escritas,
como faço agora...Minha Revência.
Escrito
por
*Lígia Maria
Arnaud Seixas
Psicóloga
10
de junho de 2016.
Saudosa Revência
Reviewed by Clemildo Brunet
on
6/11/2016 06:59:00 AM
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