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PRIMEIRAS CHUVAS: GOTAS DE ESPERANÇA

Francisco Vieira

Francisco Vieira*
            
No Nordeste, tão logo se inicia o ano, a atenção se volta para um possível inverno. É grande a expectativa.
            O sertanejo que o diga: nada é mais tenebroso do que uma seca. É um fenômeno dramático e de efeitos danosos como, sofrimento, fome e pobreza. Tudo se resume numa só palavra: miséria. Contudo, o homem do campo não desiste. Revestido de inabalável fé, força hercúlea e coragem leonina não permite descrença nem desespero. É evidente sua relutância, o que confirma a assertiva de que o sertanejo é mesmo um forte.
            Nas rodas de conversas onde o assunto se faz presente a fé alimenta a esperança. Até mesmo as crendices populares e as superstições fortalecem a espera de um inverno promissor. São os Profetas do Sertão, exímios observadores do tempo que mirando o horizonte, como farejadores de chuvas, buscam na natureza, plantas, insetos e pássaros como João de Barro, sinais para definir suas previsões.
A partir do mandacaru que desabrochou a flor no último verão, a barra no romper da primeira aurora do ano, a chuva sobre a fogueira de São João e no domingo de entrudo, tudo robustece as previsões de um ano chuvoso. Tudo serve de argumento, com destaque para o Dia de São José no qual os agricultores apostam como a última esperança. Diz a crença: chuva no dia do Santo Operário é certeza de inverno e garantia de fartura. Nem mesmo o canto agourento da Acauã, anunciando como presságio, impiedosa seca, não é capaz de desesperar o menor dos devotos.
            Tudo acaba bem com a opinião do experiente Severino Macena. Perito no assunto assegura que as previsões apontam para um bom inverno e muita fartura deixando todos otimistas.
            Enfim, a chuva chega, interrompendo a estiagem e a escassez. Mal caem os primeiros pingos na terra ressequida, porém fértil, tudo se transforma. Com ares de felicidade o sertanejo se enche de esperança estampando no rosto o semblante de alegria.
Córregos, riachos e rios transbordam suas águas, onde peixes viçosos brigam contra a correnteza para desovar trazendo vidas. Ao som de estrondosa trovoada e relampejar cadente, a chuva risca o espaço infinito com raios em caracol, enquanto sapos e rãs coaxam incessantemente, não sei se agradecendo pelas chuvas caídas ou anunciando outras que em breve virão.
            A chuva é a felicidade que vem do céu em pingos d’água. Cada gota que cai faz germinar a semente plantada tornando a natureza mais exuberante, que de tão irresistível, a asa branca fugitiva da seca, atraída pelo ronco do trovão, abre asas em revoada e volta ao sertão.
            Estamos em 2018. Após longa estiagem, finalmente tivemos, se não um inverno, mas um ano chuvoso, motivo de agradecimentos a Deus. Os reservatórios antes secos e agora abastecidos – uns mais, outros menos – nos dão um certo alento. De certa forma o sofrimento do nordestino cedeu lugar a felicidade, transformando a desolação em esperança.
O nordestino, forte e bravo, vítima da seca, tornou-se presa fácil de políticos corruptos, aproveitadores da situação. Sem o menor escrúpulo, com falsas promessas, fazem trampolim do sofrimento alheio visando os mais altos cargos em benefício pessoal.
Contudo, se a dor ensina a gemer, certamente o sertanejo aprendeu com o próprio sofrimento a conviver com o problema. Afinal, já diziam os antigos que ninguém aprende se não as suas custas.   
Com certeza, o sofrimento e a crença não foram em vão.
            Considerando os inúmeros benefícios de um inverno, podemos afirmar que as primeiras chuvas são como gotas de esperança e felicidade.
Pombal, 16 de maio de 2018
*Professor e Escritor pombalense.
PRIMEIRAS CHUVAS: GOTAS DE ESPERANÇA PRIMEIRAS CHUVAS: GOTAS DE ESPERANÇA Reviewed by Clemildo Brunet on 5/17/2018 04:42:00 AM Rating: 5

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