RUA DO COMERCIO DOS NOSSOS AVÓS
Jerdivan Nóbrega de
Araújo e
Verneck Abrantes de
Sousa*
De onde vêm tantas
lembranças?
Do lado esquerdo, Na rua
Leandro Gomes de Barros, a “Marinete”
de Doca de seu Mizim esfria o motor à
sombra do velho framboyam que, ignorando o tempo quente, estar sempre sangrado suas flores vermelhas.
Caminho um pouco mais, pego a esquerda, entro no “Beco da Cadeia”, onde moram
seu Bembem e seus filhos: Chiquinho e
Cicero de Bembem. Mais um pouco e já estou no início da Rua do Comércio, lugar
dos meus ancestrais e também de muitas histórias, acontecimentos diários e de
saudade que vêm e
vão em nossas mentes.
Nos finais de tarde as
pessoas debulham feijão nas calçadas. A
bodega de Maria Noca, Severino Pedro, Josafá e de Toinho de Alice. Rua que lembra os pastéis da velha Petronila, os sequilhos
e cavalinhos de goma de Ana Benigno, Nanzinha e de mãe Lourdes. A calçada de tio Cândido e dona
Chiquinha, aonde à noite o velho Manssonilo vem se juntar ás demais pessoas para contar histórias antigas
e fantasiosas da sua vida.
Os frondosos pés de fícus
benjamim, onde sob suas sombras os meninos jogam peão e futebol com bola de
meia, ao som gostoso dos cantos dos canários amarelos que vem procurar migalhas
nas soleiras das janelas entre abertas.
No meio da rua, sob a luz vigilante
do luar, as vozes das meninas suavizam a penumbra. De mãos dadas elas cantam cantigas
de rodas enquanto que os meninos, brincam de “Pega Ladrão” a vista dos mais
velhos que em suas cadeiras preguiçosas trocam ideias e cumprimentam os que
passam, vindo da lida para o repouso do
lar.
E quanta gente boa para
cumprimentar!!!
- Boa noite, dona Ana!
- Boa noite, Seu João Lindolfo!
É seu Mizim a se
balançar em sua cadeira de ferro, mestre Álvaro ouvindo rádio, “Ciço” de
Nini, Sindó Gouveia, Joana Teresa na lorota e o Cego Rosendo que passa vendendo pão de ló, alfenim e broa preta. Otacílio de dona Guiomar, Deoclécio
Manissoba, Dr. Lourival, Zumira,
Pirrita, Licô, Jovem Formiga,
Bernadino Bandeira, Odilio, Tambaqui e
Cora de Onofre , dona Benigna na risada
gostosa e Maria Antonieta vigiando suas filhas.
É Adamastor ensaiando seu
trombone para a banda, Maria de Deca sempre com uma história nova pra contar e
Leó Formiga entregando uma chapa fotográfica que fizera na tarde anterior.
- Quantos ainda circulam
pelas ruas de Pombal, quantos já se foram?
Nas chuvas de inverno,
as águas
rolam formando riacho no meio da rua descalçada e vão desembocar na
enlameada Rua de Baixo, para finalmente desaguar no Rio Piancó. Ali os moleques espertos, vivem
cada momento das suas vidas,
gritando em meio aos clarões de
relâmpagos e o som estridente dos trovões, procurando uma e outra biqueira para tomar banho na chuva. As meninas
adolescentes com seus vestidos colados ao corpo. Quantas fantasias a
despertar em nossas mentes
inocentes.
Rua do Comércio!
Das casas antigas e de
muitas botijas de ouro enterradas e desenterradas por Cicero de Bembem e tio
Filemon, dois bons contadores de lorotas.
O passado sendo desmemoriado
pelo tempo. As imagens que distanciam
e se apagam no tempo, mudando o antigo e dando lugar ao novo.
Resta-nos recompor estas lembranças, trazer à luz o nome de saudosas pessoas
a quem muito devemos as lições de vidas do que hoje somos.
A modernidade é cruel e não
respeita as mais elementares lembranças e segue fazendo o seu papel. São as transformações que vão demolindo o
nosso passado, transformando-o num imenso quebra cabeça, o qual nos cabe remontá-lo, nem que seja
faltando partes, pois há estilhaços que
se negam a se juntarem. São os remendos irremediáveis. Os nomes das ruas, por exemplo, que eram dados
pelo povo e não por leis como
hoje acontece. Quem há de saber quem primeiro denominou aquela artéria,
uma das mais antigas da cidade de Pombal, de Rua dos Prazeres, depois Rua do
Comércio e hoje João Leite? Mas, se hoje esta rua centenária é, por força de
lei municipal, denominada de Cel João Leite, por força da memória indelével do
povo de Pombal é a eterna Rua do Comércio; do feijão debulhado as calçadas; das
lorotas e vantagens contadas pelos nossos avós, onde seus fantasmas ainda hão
de circular por muitas gerações.
E a Rua do Comércio do pão
com creme na bodega de Toinho Barbosa
Boa noite, dona Ana!
Boa noite, seu Leó!
Meus ouvidos insistem em escutar
ecos vindos da Rua do Comércio!
*
(Do livro "SOB O CÉU ESTRELADO DE POMBAL" - 1997 Jerdivan N de
Araujo a União)
RUA DO COMERCIO DOS NOSSOS AVÓS
Reviewed by Clemildo Brunet
on
4/24/2014 05:06:00 AM
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