Do sonho ao pesadelo
Onaldo Queiroga |
Onaldo
Queiroga*
Era madrugada, um imenso
oceano de águas verdes, ondas que vinham e, imediatamente, se recolhiam,
banhando as areias da praia. Um infinito horizonte ao alcance do nosso olhar.
Em meio às águas, numa linha distante que une mar e céu, lentamente o sol começou
a se levantar, até que, com sua energia e luz dourada, transformou a escuridão
no amanhecer de um novo dia.
Com a manhã, abri os olhos.
No jardim, vi o balé de um beija-flor. Sabiás, curiós, golados, galos de
campina e
canários voavam e entoavam
uma bela sinfonia. Havia chovido, e o vento, balançando os arvoredos, regava o
chão. Levantei-me e liguei o rádio. Um cantador dedilhando sua viola, com sua
poesia divina do improviso, anunciava a felicidade da invernada que molhava o
chão, enchia ribeirões, açudes e rios. Sobre a mesa, o café matinal. A família
dialogava e pedia a Deus paz para o novo dia. Ao deixar a residência, vi
crianças, adultos e idosos, uns caminhado, outros pedalando suas bicicletas, e
muitos se exercitando pelas areias do Cabo Branco. Pelas ruas, um trânsito
calmo, sem engarrafamentos, buzinas e insultos.
O céu já se fazia azul, e o
sol, com o amigo vento, havia espantado as nuvens. No ar, o perfume das flores,
caminhos que nos mostravam sorrisos e gentilezas. Era um dia branco, que fluiu
com o sossego dos olhares cordiais. Homens falavam do amor de Deus. No final da
tarde, o crepúsculo se fez mais belo. De forma colossal, o sol encerrou o dia,
entregando-nos a noite. Na telinha, novelas que nos mostravam a harmonia
familiar e o equilíbrio entre a liberdade e o respeito. Telejornais exibiam
matérias incentivadoras do esporte, música, teatro, pintura e leitura.
Falava-se de solidariedade.
Mas, já era hora de se
recolher, de se entregar novamente ao sono. Para espanto meu, acordei. Era
noite ainda, e eu pensava que estava em Pasárgada! Foi, então, que me dei conta
que tudo não passou de um sonho. A TV estava ainda ligada. Mostrava bárbaros
que arrancaram vasos sanitários de um banheiro de um campo de futebol e, como
trogloditas, lançaram-no do alto da arquibancada em direção aos torcedores do
time adversário. Um morto e vários feridos. Mudei de canal, vi “profetas”
pregando e curando para um mar de pessoas humildes, sofridas, calejadas de
serem exploradas por este mundo tão promíscuo. Mais uma vez, troquei de canal.
Agora, uma criança assassinada friamente. Os acusados? O pai e a madrasta. Em
seguida, outro crime, por engano e sob a égide da famigerada “justiça com as
próprias mãos”, em que um grupo de pessoas mata, mediante estúpido linchamento,
uma inocente mulher.
Do sonho ao pesadelo. Meu
Deus! Que mundo é esse? Tende piedade de nós.
*Escritor pombalense,
Juiz de Direito da 5ª Vara Cível de João Pessoa PB.
onaldoqueiroga@oi.com.br
Do sonho ao pesadelo
Reviewed by Clemildo Brunet
on
5/09/2014 08:04:00 AM
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