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BAR CENTENÁRIO: DOCES RECORDAÇÕES


Prof° Francisco Vieira

Por Francisco Vieira*

                Assim como as pessoas, também os acontecimentos e lugares estão ligados as nossas vidas. Juntos formam o tripé da história. Por mais distante que seja o passado irá sempre nos perseguir.
                Com base nessa premissa reporto-me ao Bar Centenário, talvez, o bem patrimonial mais importante de Pombal. Considerando sua constante presença nos grandes acontecimentos do município, seu valor sociocultural e histórico é imensurável.
                Em síntese, a mais importante praça pública de Pombal. Tem como patrono Dr. José Ferreira de Queiroga, nome oficial que lhe foi dado em reconhecimento aos relevantes serviços prestados quando Prefeito Municipal. Entretanto, é popularmente chamada de Praça do Centenário desde 1962, quando das comemorações alusivas aos cem anos de elevação a categoria de cidade.
                A praça surgiu em 1938, com a construção do coreto, na gestão do então prefeito Francisco de Sá Cavalcanti, - primeiro eleito pelo voto – e concluído em 1940. Numa união perfeita, ao lado de outras construções monumentais como: Praça Getúlio Vargas, Coluna da Hora – hora sempre atrasada - Escola “João da Mata”, Cadeia Velha, Pombal Ideal Clube e Igreja do Rosário e mais recentemente a AEUP – Associação dos Estudantes Universitários de Pombal, formando o Largo do Centenário, um dos centros urbanos mais atraentes e fascinantes.
                Todo esse espaço, formado de casarões e plantas seculares, representa o sincronismo entre o Divino e o humano.  É a relação harmoniosa da natureza com a arte; perfeita parceria entre Deus e o homem, portanto, prova substancial de que a Fé e a Ciência podem sim, ter uma convivência amistosa e saudável. As duas se completam.
                Desde cedo acompanhei as atividades do Bar Centenário. É possível ainda vislumbrar em pensamento os fatos ali vividos. Ele foi palco de minhas travessuras de menino, de sonhos e irreverência de adolescente. Sinto o espírito renovado ao recordar o bate-bola, jogos de peão, castanha e bola de gude a sombra dos arvoredos. Fazia parte imitar Tarzan e suas aventuras saltando nos galhos robustos das árvores. E, numa maldade inconsequente, constantes atos de agressão à fauna, ali bem representada por diversas espécies de pássaros. Era uma perseguição desmedida aos voantes e sem nenhuma explicação convincente, senão, o simples prazer de matar ou arvorar-se da fama de bom atirador. Assim, com tiros certeiros de estilingue, tirávamos a vida de canários da terra, bem-te-vis, galos de campina e outras espécies que com cantos fascinantes formavam em sinfonia a orquestra da natureza. Tudo brincadeiras de crianças que acabavam quase sempre com brigas – sem ressentimento – ou sob a proibição dos guardas Bozó e Bené. Ambos nos imprimiam medo: Bozó pela fama de valentão que ostentava e as histórias a seu respeito. Provando seu heroísmo exibia com orgulho a barriga riscada de faca, resultado de ferrenha luta em sua terra de origem e Bené pelas suas ameaças e reações; a qualquer ofensa sacava sua enorme faca-peixeira – doze polegadas – intimidando severamente a todos.
                Na adolescência, fase de transição, de sonhos impossíveis e irreverência injustificável, “o centenário”, teve presença marcante em minha vida. Com certeza, o lugar mais frequentado da cidade, depois de nossas casas e locais de trabalho. Ouso até afirmar: não há sequer um só morador de Pombal que não tenha algo de sua vida a contar relacionado a este local.
                O Bar Centenário é mais que uma praça ou simples lugar de entretenimento urbano. A partir de bate papo de amigos, encontro de casais, shows, concentrações cívicas e políticas, enfim, acontecimentos de naturezas diversas, o lugar tornou-se uma referência e ponto de convergência da população nos grandes eventos públicos. Apropriada ao romantismo, o passeio noturno e a paquera se tornaram uma prática, principalmente nos finais de semana. Era uma rotina prazerosa. Enquanto rapazes degustavam cerveja, wisque, montilla ou baccardi – tipos de Ron da época – na parte superior externa do bar, moças em duplas ou grupos, giravam incansavelmente em volta trocando olhares. Aquele gesto seria o primeiro passo para um novo romance ou reconciliação de um relacionamento abalado. Muitos namoros ali começaram e tiveram fim. Já outros se perpetuaram, mesmo com a separação dos corpos após a morte. É que o amor é eterno, segundo os poetas. Orgulho-me em fazer parte desse rol: eu e minha esposa somos casal remanescente desse tempo em que o romantismo prevalecia como sentimento. E o centenário presenciou há uma quarentena de anos o início desse nosso romance que ainda permanece com o mesmo vigor – podes crer. Como era doce saborear os picolés e sorvetes de Bernardo. Quão maravilhoso! Casais em clima romântico trocando juras entre a beleza da praça e o clarão resplandecente das noites estreladas. Havia um clima de tranquilidade e paz, somente alterado na briga de ”Bajara” com Sargento Mota, que lhe custara alguns minutos de prisão: somente o tempo necessário para chegar ordem expressa de seu tio Cândido Queiroga pondo o sobrinho em plena liberdade. Era a confirmação do ditado popular: manda quem pode e obedece quem tem juízo. Ou pelo uso de sua autoridade de delegado proibindo qualquer manifestação contrária ao golpe militar de 64, utilizando-se de seu contingente – nada mais que seis policiais despreparados.
                Neste local fatos importantes fizeram a história da terrinha, a partir da tradicional Festa do Rosário, a maior manifestação de fé católica do sertão paraibano. Poucos lugares fizeram tanto quanto o Bar Centenário. Nele grandes artistas animaram festas inesquecíveis. O espaço foi ocupado por ícones da música como Luiz Gonzaga - Rei do Baião - e garoto propaganda do Fumo “Dubom” – “êta, fumo de cabra macho”, Marinês - Rainha do Xaxado – Genival Lacerda, Trio Nordestino, Jair Rodrigues e mais recentemente Fagner e Zé Ramalho. No campo político não foi diferente. Memoráveis comícios aconteceram onde grandes oradores robusteceram a imponência da praça. Sua beleza singular foi enaltecida pela eloquência de Raimundo Asfora, João Agripino, Argemiro de Figueiredo, Ronaldo Cunha Lima, Rui Carneiro – filho da terra - e outros de igual valia.
A Praça do Centenário reflete com evidência a beleza arquitetônica e a grandeza histórica da cidade. Em cada canto há um marco que se faz saudade, uma saudade que relembra um fato e um fato que se faz história. Na verdade uma recordação, um pouco do passado que ainda se faz presente. A Igreja do Rosário, monumento de valor imensurável, significado histórico e artístico se sobrepõe pomposa, para testemunhar com toque sagrado os acontecimentos em sua volta. Enquanto isso, na cadeia velha, os presos assistiam por entre as grades o que podia ser visto - um pouco do muito que desejavam ver. Por entre as janelas podiam conversar com as pessoas e se inteirar dos acontecimentos lá fora.  Podiam fitar a Igreja do Rosário e suplicar em prece silenciosa a Mãe de Deus para que a sonhada absolvição fosse em breve concretizada. Mesmo encarcerados sentiam ares de liberdade. No mínimo privilegiados. É que o pouco se torna muito quando não se tem direito a nada.
                Quem conhece sabe: este é o “Bar Centenário”, com toda sua riqueza e imponência: fascinante, majestoso, aconchegante e nostálgico. Não é elogio barato, exortação desmedida, mas, uma constatação que não deve ser vista como bairrismo. Sua influência na vida dos moradores é um fato. Raras são às vezes – se é que existem – uma conversa de amigos sem qualquer referência a este lugar. Quer na época dos Irmãos Venceslau – Nelson e Sales – Irmãos Solani e Solaniel, Bernardo Bandeira e agora Rau Galdino, o assunto vem sempre à tona.  Parece tema obrigatório entre os filhos da terra.
Assim como todas tem dois lados, a história do centenário tem duas faces. É que na trajetória da vida os bons e maus momentos se cruzam: os bons enaltecem e os maus formam as páginas negras ofuscando o brilho resplandecente da história. Mesmo assim fazem parte dela e omiti-las seria tentar em vão esconder o óbvio.
A praça que nasceu predestinada à glória, teve infelizmente seu momento de infortúnio. Sua história teria mais brilho se não tivesse lá ocorrido a morte de Severino de Oliveira Neri - “Pavão” – irmão de Nego Neri e Pacula – barbaramente assassinado no dia 03/01/1966, no início da tarde, a golpes de faca peixeira. Na verdade, um só golpe traspassando seu coração, fora o bastante para tirar-lhe a vida, isto depois de ter a testa cortada em forma de cruz. O fato,segundo seu irmão Messias, registra-se oficialmente como a primeira morte por assassinato naquele ano na Paraíba.
Quadro sinistro. Assisti junto com Ridney, Sidney, Mané Maluco, Manezinho de Deca, turminha de amigos que costumava diariamente nesse horário se reunir no local para curtir músicas dos anos 60, falar em futebol e lamentar os namoros acabados. A tragédia gerou na população um misto de dor, tristeza e revolta. A mim foi causa de inquietação e terror. Uma triste recordação que não gosto de lembrar e nem posso esquecer, por isso prefiro omitir os detalhes.
Isto posto, conclui-se que, a Praça do Centenário é um espaço multifuncional e de grande importância, não apenas pelo embelezamento urbano e conotação poética, mas, sobretudo, pelo contexto histórico.
Enfim, resgatando antigas histórias, lendas e personagens eis o meu tributo e melhor forma de preservar nossos bens históricos e culturais. Portanto, devemos tratá-la não como coisa alheia, mas como propriedade nossa. Afinal de contas: “a praça é do povo, assim como o céu é do avião”.

*Professor, ex-Diretor da Escola Estadual João da Mata e ex-Secretário de administração do Município de Pombal.

Pombal, 08 de julho de 2012.
BAR CENTENÁRIO: DOCES RECORDAÇÕES BAR CENTENÁRIO: DOCES RECORDAÇÕES Reviewed by Clemildo Brunet on 7/16/2012 05:49:00 AM Rating: 5

2 comentários

socorro pombal. PB disse...

Estamos sumidos. Mas não esquecí do amigo. UM abraço extensivo sua esposa. Tarde porem de coração. Que Deus proteja o casal, com luzes. Muita saúde, paz e amor Sua conterrânea Socorro Dias de Almeida.

socorro pombal. PB disse...

hhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhttttttttttttttmmmmmmmmhh tttttttttlttEstamos sumidos. Mas não esquecí do amigo. UM abraço extensivo sua esposa. Tarde porem de coração. Que Deus proteja o casal, com luzes. Muita saúde, paz e amor Sua conterrânea Socorro Dias de Almeida.

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