banner

A CANÇÃO E A LENDA DA CABOCLA MARINGÁ!

CONTADA POR: JOSÉ ROMERO ARAÚJO CARDOSO/GILBERTO DE SOUSA LUCENA. (Foto/fonte: Albuns da Web do Picasa - Jerdivan Nóbrega) Praça do Centenário - destaque Projetor de Som do LORD AMPLIFICADOR.
A obra musical deixada pelo compositor e médico mineiro Joubert Gontijo de Carvalho (1900-1977), repleta de valsas, marchas e sambas, revela imensa influência da cultura popular. Já no início da década de trinta, esse sensível artista emplacou seu primeiro grande sucesso: a famosa marchinha carnavalesca “Taí (Pra Você Gostar de Mim)”, gravada por uma então pouco conhecida menina de vinte anos chamada Carmen Miranda. Foi o início exitoso da formidável brazilian bombshell. Outras consagrações de Joubert dessa época foram “Pierrô” (1931) e, no mesmo ano, um conhecido cateretê que poucos sabem ser da sua autoria intitulado “De Papo Pro Á”. Era uma fase da música brasileira em que os compositores urbanos investiam nos chamados “gêneros regionais populares” e outra composição do talentoso mineiro fez muito sucesso ainda em 1931: “Zíngara”. Talvez pela enorme “divulgação romântica” que era então feita sobre a vida dos ciganos, além de também possuir elementos do cateretê, o compositor optou por retratar uma cigana acaboclada ou mesmo indígena. E a música caiu no gosto do povo. Pelo seu pioneirismo – em estilo também regionalista – abordando um tema bastante explorado posteriormente no nosso cancioneiro popular, a seca do Nordeste, “Maringá” (1932) se tornou a “mais expressiva” das composições de Joubert de Carvalho. Foi seu maior sucesso e acabou dando nome a uma hoje grande cidade do estado do Paraná. Recebeu dezenas de gravações (inclusive no exterior), tendo seu êxito em grande parte se devido à “gravação primitiva” do tenor paulista Gastão Formenti (1894-1974) e às excelentes interpretações do cantor de voz canora Carlos Galhardo (1913-1985), que a gravou por duas vezes em 1939 e 1957.O folclore sertanejo é riquíssimo e precisam ser resgatadas com grande interesse as lendas esquecidas com a névoa do tempo e pelos efeitos da aculturação, a exemplo da história (ou estória?) transmitida de boca em boca de Maria, uma cabocla sensual que migrou da região do Ingá (no agreste paraibano), para a cidade de Pombal (sertão da Paraíba) em uma grande seca ocorrida no século XIX. Reza a tradição que na famigerada estiagem de 1877 Maria deixou Pombal e procurou novas paragens, deixando naquele longínquo rincão sertanejo um caboclo apaixonado e com lágrimas nos olhos.Considerando a riqueza da cultura popular no sertão, da qual era admirador e grande conhecedor, o Dr. Ruy Carneiro (1901-1977) – no tempo em que exercia a chefia de gabinete do Ministério da Viação – encontrou no Rio de Janeiro Joubert de Carvalho. O político sertanejo falou-lhe sobre a lenda de Maringá (designação popular de Maria do Ingá, naquele momento ainda não conhecida por Joubert) e pediu-lhe para musicar a emocionante trajetória da linda cabocla que abalou a ribeira do Piranhas. A canção “Maringá” tem uma curiosa história. Era amigo de Joubert de Carvalho o senhor Jaime Távora, então secretário do paraibano José Américo de Almeida (1887-1980), na época Ministro da Viação do Presidente Getúlio Vargas (1883-1954) e grande apreciador da música do compositor mineiro (a quem ansiava conhecer pessoalmente). Távora comentou com Joubert sobre a vontade do Ministro, no que – “em tom de pilhéria” – ouviu: “Ora, se ele tem tanta vontade de me conhecer que vá lá em casa”. Tal informação foi passada por Jaime Távora a José Américo que, para grande surpresa de Joubert, resolveu fazer-lhe uma visita em sua residência no Rio de Janeiro. Com o Ministro também seguiram para o encontro o político pombalense Ruy Carneiro e alguns amigos. Joubert queria conseguir com José Américo um lugar de médico no prestigiado Instituto dos Marítimos e falou do seu desejo a Ruy, que lhe assegurou: “É fácil, peça você mesmo. [...] Por que você não faz uma canção falando dessa tristeza que há no Nordeste, dessa falta de água, lá não chove... Faça uma canção assim”. Joubert imediatamente foi inspirado pela imagem da seca e disse para o ilustre pombalense que acabava de vislumbrar o drama de uma cabocla partindo numa leva, deixando para trás um caboclo a chorar. Chamava-se Maria (nome popularíssimo no Nordeste). Quis saber a cidade berço do Ministro José Américo. “Areia”, disse-lhe o político paraibano. O compositor achou que Areia “não dava boa rima”. Quis saber a terra natal de Ruy: “Pombal”. Não satisfeito, Joubert quis saber dele onde a estiagem era mais rigorosa nas terras da Paraíba. Ruy citou-lhe vários lugares, dentre os quais o município de Ingá. Joubert exultou: “Então é a Maria do Ingá”. Naquela noite, na presença de Ruy Carneiro, de José Américo de Almeida, de Jaime Távora e de outros amigos a música foi composta. O título da canção “Maringá” (fusão ou “corruptela romântica” adotada pelo compositor por exigências métricas da composição) foi gravada em 1932, conforme já dito, pelo antigamente famoso tenor paulistano Gastão Formenti, tornando-se sucesso internacional e um clássico do nosso cancioneiro popular, levando a personagem e a cidade de Pombal ao conhecimento do público e, principalmente, fazendo com que o drama da seca comovesse a todos que desconheciam a realidade do Nordeste. A grande paixão supostamente ocorrida no sertão é o retrato mais fiel dos sofrimentos e desenganos da valente e nobre raça sertaneja, a qual se mantém impávida nos momentos de infortúnio, ainda conseguindo forças para expressar o maior de todos os sentimentos: o amor.Usurpada indevidamente pelos paranaenses da cidade de Maringá (nomeada em homenagem à famosa canção), os quais não possuem nenhum direito histórico ou geográfico sobre o que retrata a música eternizada pela emocionante genialidade do Dr. Joubert de Carvalho que, atendendo ao apelo e à inspiração de Ruy Carneiro, transformou “Maringá” num verdadeiro hino do povo pombalense. O que o poema tematiza diz respeito somente à cidade de Pombal e à realidade sertaneja, bastando-nos analisar alguns de seus belos versos: “Foi numa leva que a cabocla Maringá / Ficou sendo a retirante que mais dava o que falá / E junto dela veio alguém que suplicou / Pra que nunca se esquecesse de um caboclo que ficou”. Este trecho demonstra que, em tese, não há a menor relação da mensagem poética com a cidade paranaense de Maringá, a qual nunca foi constituída por caboclos, como o sertão da Paraíba (notar a ênfase da voz que narra no registro da fala do homem popular – “fala” ao invés da forma infinitiva falar), e sim por uma população de origem européia que, em sua maioria, certamente desconhece as levas de retirantes tão típicas dos freqüentes períodos de seca do Nordeste brasileiro. Contrariamente, o estado do Paraná tem o privilégio de não sofrer as estiagens que chegam a expulsar o homem nordestino do campo. Na realidade, a canção ficou lá conhecida apenas devido ao fato de ter sido com muita freqüência cantada nas horas de labuta e de lazer pelos operários da construção civil nordestinos que, fugindo do flagelo da seca, migravam para aquele rico estado brasileiro em busca de trabalho. Explicando que esse produto formidável da genuína cultura popular é por extensão patrimônio do povo brasileiro e, de modo especial, dos paraibanos e da conhecida Terra de Maringá, é necessário lembrar a degradação dos valores seculares sertanejos desconhecida pelas gerações que nunca ouviram a sublime homenagem de Joubert de Carvalho à bela cidade do sertão da Paraíba, berço de estimáveis valores culturais, que abriga vetustos testemunhos arquitetônicos do estilo barroco e se vangloria de poder justificar os versos do notável compositor contemporâneo quando afirma com ternura, dando voz ao humilde caboclo apaixonado: “Antigamente uma alegria sem igual / Dominava aquela gente da cidade de Pombal / Mas veio a seca, toda a chuva foi simbora / Só restando então as água dos meus óios quando chora / Maringá, depois que tu partiste / Tudo aqui ficou tão triste que eu garrei a maginá”.
A CANÇÃO E A LENDA DA CABOCLA MARINGÁ! A CANÇÃO E A LENDA DA CABOCLA MARINGÁ! Reviewed by Unknown on 9/06/2007 08:38:00 AM Rating: 5

Nenhum comentário

Recent Posts

Fashion