O SERTÃO II
Onaldo Queiroga |
ONALDO QUEIROGA*
O sertão é meu mundo, lugar onde nasci, onde costumo recarregar as energias para continuar caminhando por essa longa estrada da vida. Na seca ou na invernada sua magia é inconteste. Há algo nesse encantado pedaço de terra que cativa e faz homens e mulheres serem fortes, destemidos, prestativos e hospitaleiros.
Costumo dizer que quando desço a serra de Santa Luzia e avisto o imenso sertão, a minha alma se renova, sequer me lembro da existência do mar, pois no sertão me banho nas águas doces do meu rio, sob a sombra de oiticicas e ingazeiras. De câmara de ar deslizo sobre a sua correnteza, atravesso cachoeiras e redemoinhos até chegar à ponte do areal.
O meu sertão é o mesmo de Catulo da Paixão Cearense, onde o luar é único em beleza e inspiração, onde as noites ainda contam com a suavidade do vento Aracati que refrigera a alma sertaneja. Lá no sertão a lua não é só dos enamorados, pois ilumina o céu deixando-o claro como o dia, permitindo aos olhos de humildes caboclos a visualização de infinitas estrelas, inspiradoras de sonhos e lendas. Esse céu de lua e estrelas é também dos poetas, dos violões seresteiros, boêmios, das madrugadas que ponteiam o som do amor.
Há quem diga que o sertão já foi mar e outros afirmam que o sertão vai virar mar. O Sertão do meu tempo é aquele ainda de terra batida, rachada pela estiagem, que faz de seus filhos heróis e romeiros, que em oração clamam por dias melhores e que nunca desistem, são fortes e de fé inquebrantável. Do sertão nascem filhos, que no adeus retirante carregam o mundo da saudade, levam consigo lembranças escritas pelo sol e pela lua, como recordações guardadas no âmago de cada um daqueles que ontem partiram e, hoje, distantes, registram no diário das lágrimas o desejo contínuo de retornar ao seu templo sagrado chamado sertão.
Sertão de casas velhas abandonadas nos aceiros das estradas, de chão por onde perambulam dores e mágoas de um tempo seco e ingrato, que nega água e pão aos seus próprios filhos. Sertão que na invernada mistura homens, mulheres e meninos correndo soltos no meio da chuva forte, indiferentes à fúria dos trovões a sacudirem serras e almas, aos relâmpagos riscando os céus como flashes a fotografar a alegria de um povo que não se entrega às tragédias homíneas e naturais.
Sertão de Patativa do Assaré, que em versos decantou o poeta roceiro, um sertão de indecifráveis belezas naturais, das vaquejadas, das festas de apartação, das debulhas de feijão, das corridas de cavalo, das caçadas de tatu, do caboclo que desperta na hora certa seguindo o canto do nambu.
Sertão, tu és poema de corpo e alma. Um dia o destino me levou para terras litorâneas, de belas praias e coqueirais, mas o teu sol ardente e tua lua branca sempre me acompanharam e estarão presentes no meu existir.
onaldoqueiroga@oi.com.br
O SERTÃO II
Reviewed by Clemildo Brunet
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5/23/2011 10:29:00 PM
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