MARCO DO MUNDO DE WJ Solha
Jerdivan N. de Araújo |
“Enquanto Moisés – o dos cornos - traz, triunfante, pra grei, as duas
Tábuas da lei,
farás não farás prescritos contra os velhos contraventores,
fossem eles libertos ou senhores.
Moisés, no entanto, de imediato descarta o Não Matarás, matando
três mil, de sua raça,
ao ver - com ódio de mouro - o Altar ao Bezerro de Ouro.”
-Marco do Mundo - WJ Solha.
Em sua mais recente obra literária intitulada o MARCO DO MUNDO. (Idéia, 2012, 100 páginas), e a segunda em menos de 12 meses, haja vista que em 2011 o autor publicou o romance Arkáditch (Idéia, 221 páginas), WJ Solha volta a buscar inspiração na fonte dos grandes mestres da literatura de Cordel. Digo volta por que de outra feita foi em Leandro Gomes de Barros, o príncipe do Cordel, que o autor se inspirou para compor “A Batalha de Oliveiro contra o Gigante Ferrabrás”.
O MARCO DO MUNDO traz de volta a literatura nordestina uma modalidade poética há muito esquecida, pouco conhecida e menos ainda estudada. A última abordagem feita a respeito de “MARCO’ data de 1981, quando Professor Pontes editou o Livro “Romanceiro popular nordestino” dos estudiosos José Alves Sobrinho e Átila Augusto F. de Almeida”. Em 2011 a aluna da UFPB Luciany Aparecida Alves Santos volta ao tema com o artigo “O Marco: Uma Metodologia de Análise Marco”.
Segundo o artigo supracitado o “marco representa para o poeta uma “fortificação”, “algo inabalável e imbatível, símbolo de sua superioridade de versejar sobre todos os seus pares”.
A titulação de “marco” a esta modalidade de cordel foi dada pelos próprios poetas ao por esta palavra no titulo da poesia, exemplo: O marco brasileiro e Como derribei o marco do meio do mundo, de Leandro Gomes de Barros; Um marco feito a Maxado Nordestino, de Franklin Maxado; O marco do meio do mundo, de João Martins de Athayde; O marco paraybano e Destruição o marco do meio do mundo, de José Adão Filho; O marco do castelo da cidade Flor Mimosa, de Manoel Vieira do Paraíso; O marco pernambucano, de João Ferreira de Lima; O marco do forte pernambucano, de Severino Milanez da Silva; O marco do Seridó, de Manoel Tomaz de Assis e Grande marco de Campina Grande, de Manoel Monteiro, etc...
Quando Ataíde escreveu do “Marco do Meio do Mundo”, Leandro. G de Barros respondeu com “Como Derribei o Marco do Meio do Mundo”. Não necessariamente um “marco” precisa de um opositor para desconstruí-lo. Talvez tenha sido a briga pessoal e publica entre os dois poetas, Leandro e Atayde, que deu esta conotação, apesar de que no cordel como na cantoria improvisada o desafio é que dar a beleza a obra.
Este preâmbulo, que acabou tomando todo o texto, foi para dizer o que é um “marco” no contexto da obra de WJ Solha, uma vez que o “Marco do Seridó, do poeta Manoel Tomaz, datado de 1927, muito embora ele o tenha refeito em 1954, foi o último que se tem registro, antes do “Marco do Mundo”. Já se vão 87 anos.
Se WJ Solha despeja no leitor em o “Marco do Mundo” a sabedoria e o conhecimento universal, numa plêiade religiosa, mitológica e da vida real, adquirida ao longo da história da humanidade, os grandes mestres Cordelistas se utilizavam em seus “Marco” da graciosidade concreta dos seus feitos fictícios: castelos, fortificações construídas no meio do deserto e pedras de três léguas de grossura, fincadas no fundo mar. Quanto maior o feito mais difícil era para o opositor desconstruí-lo.
Um exemplo da construção do “Marco do Meio do Mundo” de Ataíde, é quando numa estrofe ele verseja:
“As águas dessa lagoa”.
Quem lá foi pode contar
Pessoas que entram nella
Como quem vai se banhar
Seja ladino ou matuto
Toma banho a sahe enchuto
Não praciza se enchugar.”
“Tem de sobra as floras nativas
Toda espécies da rozeira
Naquellas bellas paizagens
Na oiticica a gamaleira
Mais gigantesca do mundo
Cobrindo os sollo fecundo
Com floras da trepadeira’’
Abaixo a desconstrução do marco de Atayde em “Como Derribei o Marco do Meio do Mundo”, de Leandro Gomes de Barros.
“Diz Athayde que há
Mysterio nessa lagoa
Água della não molha
Assim não pode ser boa
Não molha porque é seca
A lama fede que enjoa.”
“Diz elle que lá tem flores
Só vejo espinho de cigano
Das frutas lá só achei
Um melão de são Caetano
Ruído por passarinho
E já estava seco a um anno.”
A eloqüência e a diversidade de conhecimentos e informações dos versos de W.J Solha prendem o leitor e o convence da grandiosidade da obra assim como faziam os grandes cordelistas ao erguerem suas fortificações, assumindo para si o desafio de superar grandes poetas como fez Leandro e Ataíde. Fica, portanto, o desafio de se fazer algo melhor, sabendo que no final, assim como foi no inicio do século XX, quando sugiram os “Marco”, quem vai sair ganhando é a cultura paraibana.
Como escreveu o poeta João Ferreira, na última estrofe de “O Marco Pernambucano”:
“Fico Aqui esperando
Pelos colegas de arte
Quem lucta pela sciencia
Tem um gênio baluarte!
E quem não tem competência
Não agrava a outra parte.”
*Escritor e pesquisador da história de Pombal
MARCO DO MUNDO DE WJ Solha
Reviewed by Clemildo Brunet
on
4/08/2012 05:19:00 AM
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