MARIZ É O GOVERNADOR VERSUS BURITY FOI O ESCOLHIDO...
Evandro da Nóbrega |
- Em algum lugar deste Crazybook (já não estou
mais achando onde foi, embora tenha copiado o conteúdo), o Dr. Ramalho Leite me
faz a seguinte indagação:
"Evandro amigo, me esclareça. Nas
suas memórias, Joacil Pereira afirma que Burity teria lhe telefonado de
Brasília anunciando sua própria escolha para governador.Tenho a impressão que
há equívoco de Joacil, pois Burity estava em João Pessoa quando foi anunciado.
O telefonema pode ter sido sobre a indicação do vice Clóvis Bezerra, pois o
anúncio ocorreu depois de um encontro entre Burity e Geisel. Se estou errado,
me esclareça pois estou pesquisando sobre o assunto. Abraços, RL".
Vai, agora, uma tentativa de resposta.
FOI DORMIR SACRAMENTADO
Prezzado Dr. Ramalho Leite: Sei que não
gosta de textos longos; mas, para se dizer tudo, e com justeza, há que muito se
escrever. A seguir, conto-lhe a história como de fato ocorreu.
No fatídico dia da escolha do professor
Tarcísio de Miranda Burity como candidato do regime ao Governo da Paraíba,
nosso grande amigo Antônio Marques da Silva Mariz (e muita gente boa) foi
dormir CONVICTO de que estaria sacramentado Governador - mesmo porque contava
com a simpatia e o quase ostensivo apoio de um dos esteios do sistema, o
general Golbery do Couto e Silva.
DESLIGADO DA TOMADA
Já tarde da noite, o degas aqui
achava-se ainda na Redação de O NORTE, como seu Editor-Geral, e elaborara por
último a principal notícia e a manchete de "front page": MARIZ É O
GOVERNADOR.
O próprio deputado Antônio Mariz me
telefonara de Brasília (DF), por volta de meia-noite, dizendo expressamente:
"Evandro, desculpe, já lhe dei todos os últimos detalhes e vou desligar o
telefone da parede, pois de outra forma não conseguirei dormir, com tanta gente
telefonando".
"PAREM AS ROTATIVAS!"...
Após a meia-noite, as rotativas já iam
começar a rodar a edição do jornal com aquele mesmo título (e a matéria
ilustrada) dizendo que o escolhido fora o sousense Mariz. De repente, de onde
menos esperava, recebo um telefonema do ex-secretário de Educação estadual e
ex-chefe de Gabinete da Reitoria da UFPB, o professor de Direito Tarcísio de
Miranda Burity:
"Evandro, me dizem aqui que Você
fica até tarde aí na Redação de O NORTE. E é por isso que lhe telefono para dar
um 'furo', uma matéria exclusiva, que não concedo a ninguém mais: acabo de ser
escolhido como candidato da Revolução ao Governo da Paraíba."
O QUE SUSTENTAVA BURITY
Isto não estava nas cogitações de
ninguém - pelo menos até onde chegam meus frágeis conhecimentos da matéria
política. De modo que respondi ao Dr. Burity que aquilo não era uma
brincadeira; que todas as informações vindas de última hora de Brasília
apontavam para a escolha de Mariz - que, como se repetiu "ad
nauseam", fora "dormir Governador" e acordara na manhã seguinte
vendo tudo por água abaixo.
Burity, no entanto, insistiu e disse:
"Venha aqui para minha casa, que lhe concedo uma entrevista já como
candidato oficial". Chamei o chefe das Oficinas (acho que o
Lourival/Lourinho), e lhe disse: "Veja bem, isto é importante. NÃO rode o
jornal ainda. Dependendo do que eu ouvir do Dr. Burity, pode ser que tenhamos
que mudar a manchete, o texto da notícia principal e a foto da primeira
página".
ILUMINAÇÃO FEÉRICA
Peguei o carro e fui à residência do Dr.
Burity. Que, por sinal, já estava toda iluminada, em franco clima de festa -
FEERICAMENTE iluminada, diria eu, e àquela hora da madrugada. Dona Glauce
Burity apresentava-se, como sempre, com todo o seu charme, beleza &
elegância natural, atendendo a todos com impecável sorriso.
Sim, porque a residência também estava
cheia de gente, especialmente os amigos mais próximos do professor Burity, que
já pegara monumental briga comigo, quando Secretário de Educação, por conta de
uma série de reportagens que eu mandara fazer sobre "o descalabro em
alguns setores educacionais" - mas, depois, se tornara meu grande amigo,
quando lhe demonstrei que as matérias NÃO eram dirigidas contra ele, mas em
favor da melhoria das escolas no Estado.
DO GENERAL REYNALDO
A Dra. Glauce Burity está entre nós,
vivinha da silva, e não me deixará mentir. O que me disse Burity, em resumo,
durante a breve entrevista? (Breve, sim, porque lhe disse da urgência de
retornar ao jornal para que a edição rodasse em tempo hábil). Disse-me que um
amigo dele, o general Reynaldo de Almeida, em quem confiava de olhos fechados,
lhe telefonara há coisa de uma hora antes ASSEGURANDO que a escolha recaíra
sobre ele, Burity. Pediu, no entanto, que o nome de Reynaldo ficasse em
"off", na notícia - notícia espetacular, diga-se "en
passant".
O professor não falou sobre os
bastidores, mas, claro, deduzi imediatamente que o patrono de Burity fora o
ministro José Américo de Almeida, movendo seus palitos sem precisar deixar seu
refúgio de "solitário de Tambaú", ali na praia do Cabo Branco. Outros
que vivenciaram esses dias terão maiores e melhores detalhes sobre o que
ocorreu nas "démarches" brasilienses. É o caso, por exemplo, do Dr.
Geraldo Navarro, que por esse tempo assessorava diretamente o general Antônio
Bandeira, um dos maiores patronos do nome de Burity, ao lado de Zé Américo.
MUDANDO A MANCHETE DA "FRONT
PAGE"
Encerrada a conversa com um Burity
extremamente sorridente e satisfeito, retornei à Redação, elaborei novo
material e refiz a manchete da primeira página: BURITY É O GOVERNADOR.
Antes, liguei para o telefone (fixo) de
Mariz, em Brasília, mas tocou, tocou, tocou até desligar. Fiz isto, por várias
vezes, até desistir: Mariz havia mesmo desligado o fone da tomada. Não pôde
saber, assim, do que se passava à sua revelia, pensei.
Esperei até que a impressora tirasse os
primeiros exemplares, para ter certeza de que aquilo tudo não passava de sonho,
pesadelo, fantasmagoria. Porque, no fundo, o degas aqui, embora amigo de
Burity, torcia por Mariz. Na vida em jornal, porém, minhas preferências
pessoais jamais poderiam influir de jeito-maneira na objetividade do
noticiário.
ESPIANDO O QUE DIZIA O
"CORREIO"
Ainda naquela madrugada, dirigindo o
carro em direção à minha própria residência, para finalmente dormir o sono dos
trabalhadores intelectuais exaustos, passei pelo "Correio da Paraíba"
e pedi um exemplar do matutino, saído "quentinho do forno", a um dos
jornaleiros que aguardavam seus repasses. O distribuidor dos pacotes,
funcionário do jornal, que me conhecia bem, atalhou-me: "Pois não, Dr. Evandro!
Tome um exemplar! Não precisa pagar!"... Peguei o jornal e, com o coração
suspenso, procurei a manchete - e ela rezava justamente ANTÔNIO MARIZ ESCOLHIDO
GOVERNADOR - o contrário, o oposto, o antípoda do que dizia a
"headline" de O NORTE...
Foi um "furo" e tanto, por
parte de O NORTE, em cima de seu principal concorrente, o "Correio da
Paraíba". Mas eu, que acabara de anunciar pelo meu jornal que BURITY É O
GOVERNADOR, rilhei os dentes, no bom estilo zè-ameriquense: "Como eu
queria que o 'Correio' estivesse certo!"...
A TRILOGIA DAS MEMÓRIAS DE JOACIL
O telefonema de Burity para mim não
podia ter sido dado "from" Brasília, pela simples e boa razão de que,
nesses dia & noite, o emérito professor se achava em João Pessoa. É bem
verdade que Burity logo foi convocado a Brasília, para um encontro com o
general-presidente Ernesto Geisel, e deve estar correta SUA impressão de que o
telefonema dele, de lá, da Capital, para João Pessoa, disse respeito (como Você
bem observa) à escolha do deputado Clóvis Bezerra, presidente da Assembleia,
como candidato a Vice-Governador, na chapa oficial de Burity.
Já que Você cita as memórias do Dr.
Joacil, também devo informar que fui o editor (a convite do Autor, claro) de
dois dos livros da TRILOGIA, os primeiros, com as memórias do amigo Joacil de
Britto Pereira (ele me pediu para adotar "oficialmente" o novel
sobrenome BRITTO com dois Ts, embora originalmente fosse só BRITO; alguns da
família não gostaram). E essa informação, num dos livros dele, sobre o telefonema
de Burity "a partir de Brasília", deve ter saído no terceiro tomo -
que não editei! De
outra forma, teria o degas aqui
interferido no texto, pois fui, no episódio, uma espécie de "testemunha
ocular da História"... ;-)
Espero que o calhamaço acima tenha ajudado
na compreensão de qualquer coisa. "Si non è vero, è ben trovato"...
;-)
Evandro Dantas da Nóbrega,
o veeeelho Druzz de guerra.
*Jornalista e
Escritor
MARIZ É O GOVERNADOR VERSUS BURITY FOI O ESCOLHIDO...
Reviewed by Clemildo Brunet
on
1/08/2018 07:27:00 AM
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