Sui Generis: intolerância e obscurantismo rodam as artes; Paraíba adere ao novo normal do Brasil
João Costa |
João
Costa*
O primeiro sinal que desponta numa
sociedade que começa a vivenciar um estado de exceção aparece pelo viés da
intolerância e censura às artes, à literatura; ao teatro e tudo que acontece
até em museus que abrigam as primeiras vítimas do obscurantismo, embrionariamente
de tez religiosa, pois os defensores daquilo supostamente sagrado se lançam por
oportunismo; tiram proveito da ignorância da sociedade – e até mesmo empresas e
instituições de forma pusilânime sucumbem.
É o novo normal do Brasil!
Os porta-vozes da intolerância na
atualidade não usam capuz, usam ternos e vestidos de grife em parlamentos e
organismos judiciais ou simplesmente sociais. É o que acontece, hoje, em João
Pessoa, com a exposição Sui Generis, aberta ao público na Usina Cultural Energisa,
exposição já amputada pela “longa manus” da intolerância religiosa.
Bastou uma frase extraída dos Evangelhos
e de um rito religiosos católico, “Tomai todos e comei: este é o meu corpo”
sobre um desenho num quadro – nem de longe com forte apelo erótico – para que
vereadores de João Pessoa se sucedessem na tribuna, ou nas redes sociais,
desempenhando na atualidade os papéis dos monges dominicanos Heinrich Kraemer e
James Sprenger, autores da bula papal que em 1484 embasou juridicamente o
Tribunal do Santo Ofício e que levou à fogueira milhares na Europa, inclusive
no Brasil, na Chamada “Inquisição”.
Os inquisidores deste século 21, são
outros, mas os motivos são idênticos: combater a heresia e proteger aquilo que
consideram sagrado, além da moral de os bons costumes. E as primeiras vítimas
são atores, escritores e, no caso da Energisa, jovens artistas plásticos, que
devem estar sentindo na pele os efeitos da intolerância numa sociedade dita
moderna, de redes sociais, smartfones e tablets, mas socialmente medieval.
A exposição “Sui Generis”, que
literalmente significa “De seu próprio gênero ou único em seu gênero”,
permanece aberta à visitação pública, mas agora seguindo os parâmetros do Guia
Prático de Classificação do Ministério da Justiça, em outras palavras submetida
à censura, pois desfalcada de dois ou três quadros.
O que é terrivelmente assustador é a
onda de linchamento moral dos artistas expositores pelas redes sociais,
principalmente, e na Câmara Municipal.
“Infelizmente, o que se sobressaiu não foram
as reflexões produtivas sobre a arte, mas os xingamentos e leituras superficiais
do preconceito e fata de reflexão crítica sobre a exposição como um todo”,
disse Kai Oliveira, autor do quadro censurado.
Kai, Chevito e Rana Sui, autores da
exposição merecem e devem até receber solidariedade, mas serão gestos tímidos
porque no geral todos estão assustados, temerosos e até acovardados diante do
estado de exceção em curso no Brasil.
Se, em 1989, o escritor Salman Rushdie,
foi alvo de uma fatwa – sentença de morte que ainda está em vigor - decretada
por aiatolás iranianos por ter “ofendido” o profeta Maomé em seus versos;
Se, em janeiro de 2015, doze pessoas,
principalmente jornalistas, foram mortas no massacre que atingiu o jornal satírico
francês Charlie Hebdo, por supostamente ofender ao mesmo profeta Maomé;
Se, em setembro de 2017, O Museu
Santander Cultural, capitulou diante da intolerância religiosa contra a
exposição “Queemuseu” por supostamente “incentivar a pedofilia, zoofilia e
contra os bons costumes”, medo que também se abateu sobre os dirigentes do
Museu de Arte do Rio (MAR), que cancelou as negociações de compra da exposição
por medo da reação conservadora;
Se, também em setembro de 2017, a atriz
transexual Renata Carvalho, foi impedida por um juiz de Jundiaí-SP, de
apresentar a peça “O Evangelho segundo Jesus, Rainha do Céu”, e com
apresentações suspensas em Porto Alegre, por “afrontar costumes religiosos”;
Não deveria
causar surpresa a intolerância que se abate contra a Kai, Chevito e Rana Sui
por iniciativa de vereadores e ou religiosos; e a pressão e censura impostas ao
Centro Cultural da Energisa.
O nefasto
legado de Girolano Savonarola, Tomás de Torquemada, sobre os inquisidores
tabajaras é real e tem até simpatizantes e seguidores nesta Paraíba de
comportamento medieval.
É o novo
norma do Brasil!
*João Costa é Radialista, Jornalista e Diretor de teatro,
além de estudioso de assuntos ligados à Geopolítica. Atualmente, é repórter de
Política do Paraíba.com.br
Sui Generis: intolerância e obscurantismo rodam as artes; Paraíba adere ao novo normal do Brasil
Reviewed by Clemildo Brunet
on
5/10/2018 05:41:00 AM
Rating:
Nenhum comentário
Postar um comentário