TIGRES MODERNOS
José
Galdino da Silva Filho*
Lauretino Gomes no seu
célebre trabalho 1808, que discorre sobre a fuga da corte portuguesa de Dom
João, batendo em retirada das tropas de Napoleão, já fala da precária situação
naquela época, do tratamento destinado ao saneamento básico no nosso país. Diz
o texto pag. 147. “Devido à pouca profundidade do lençol freático, a construção
de fossas sanitárias era proibida. A urina e as fezes dos moradores, recolhido
durante a noite, eram transportadas de manhã para serem despejadas no mar por
escravos que carregavam grandes tonéis de esgotos nas costas. Durante o
percurso, parte do conteúdo desses tonéis, repleto de amônia e ureia, caia
sobre a pele e, com o passar do tempo, deixava listras brancas sobre suas
costas negras. Por isso esses escravos eram conhecidos como “tigres”. Devido à
falta de um sistema de coleta de esgotos, os “tigres” continuaram em atividade
no Rio de Janeiro até 1860, e no Recife até 1822. O sociólogo Gilberto Freyre
diz que a facilidade de dispor de “tigres” e seu baixo custo retardou a criação
das redes de saneamento nas cidades litorânea brasileiras”. O compêndio aqui
referido, faz parte da trilogia do mesmo autor, 1808, que aborda a fuga de Dom
João para o Brasil, 1822, sobre a independência, e 1889, sobre a proclamação da
República.
Como visto mais de dois
séculos já se passaram e o tratamento dispensado ao problema do saneamento
básico ainda não mudou muito. A afirmação do sociólogo Gilberto Freyre, quando ele
diz que a facilidade de se dispor de “tigres”, e seu baixo custo, retardou a
criação das redes de saneamento nas cidades litorâneas, só encontra um óbice. Não
só nas cidades litorâneas, mas principalmente nas cidades do interior.
O marco legal do saneamento
básico no Brasil, é regulado através da Lei 11.445 de 2007. Da maneira que essa legislação vem se comportando, já está mais do que
provado que ela não vem atingindo a sua função social como deveria. Atualmente essa
lei que rege o saneamento básico no nosso país, faz com que em tempos hodiernos,
os chamados “TIGRES”, hoje modernamente mecanizados, se encontrem em plena
atividade, exatamente por falta de uma rede de esgotos bem estruturada nas
cidades interioranas e até nas capitais. Tal inercia permitem que os municípios
realizem contratos de programas diretamente com empresas públicas e privadas,
para prestarem esses serviços, coletas em fossas, esgotos e resíduos, sendo
transportados para locais não apropriados. Ainda é preciso fazer muito para que
se tenha um resultado positivo dentro das perspectivas, custo benefício. Pelos
dados oficiais, não é mais possível conviver com 35 milhões de brasileiros sem
acesso a agua de qualidade, 104 milhões sem esgotos tratados adequadamente.
Em duas tentativas o Congresso
Nacional tentou votar um novo marco legal para o setor do saneamento básico. Em
2018, o Executivo enviou duas medidas provisórias sobre o tema. A primeira a MP
844/18, perdeu a vigência em novembro de 2018. A segunda a MP 868/18, também
caducou em junho de 2019. Com as duas derrotas os líderes dos partidos na
câmara, decidiram priorizar a análise do tema por projeto de lei, transformando
no PL 3235/19, em tramitação.
Chega-se à conclusão que a legislação que
trata do saneamento básico tem que ser modificada urgentemente e atualizada,
pois da maneira que vem sendo utilizada, está se primando pela manutenção da
improvisação e quiçá, pela preservação dos TIGRES MODERNOS.
*José Galdino da Silva Filho, Procurador Federal
TIGRES MODERNOS
Reviewed by Clemildo Brunet
on
8/27/2019 03:43:00 PM
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