banner

COPA DO MUNDO: UMA COISA É VER, OUTRA É CONTAR

Francisco Vieira
Francisco Vieira*

            Uma coisa é ver, outra é contar.
            Em que pese uma boa narrativa ou a precisão de uma imagem, nada é comparável as cenas que os olhos contemplam. Quer no rádio ou na televisão, há enorme diferença em relação aquilo que presenciamos.
            No ensejo da 20ª Copa do Mundo, recordo os idos de 1958, e a tímida comemoração em Pombal pela conquista do primeiro campeonato mundial de futebol. Sob o comando de Dr. Avelino Queiroga um grupo de torcedores entusiasmados, entre os quais seus fiéis escudeiros Valderi, Joãozinho, Heron Leite, Biró-Beradeiro, Zé Enfermeiro, comemoravam com discursos de exaltação, gritos de É CAMPEÃO e
o samba que dizia: “Didi, Pelé, Vavá, bailaram lá na Europa e a copa veio prá cá”.
            A partir desse momento, como bom brasileiro, tomei gosto pelo futebol, tornando-me fiel torcedor do Botafogo F. R e ouvinte assíduo das Rádios Globo, Tupi, Nacional e Bandeirante, que além da transmissão dos jogos ainda apresentavam os melhores programas do gênero.
          Um caste de locutores e comentaristas marcou época no rádio. Composto de profissionais de excelente qualidade, cada um ao seu estilo, suas vozes fizeram do futebol a maior paixão nacional. A grande maioria criou bordões pelos quais se tornaram conhecidos. A propósito Edson Leite se destacava pela frase “atenção Brasil”, que parecia mais um chamamento que um grito de alerta, enquanto Jorge Cury emocionava pelo incessante grito de gol e José Carlos Araújo com “cheguei” ou “voltei”. Como era inconfundível a narração de Fiori Giglioti, dando ao jogo um colorido especial - diria até romântico – com o bordão: “abrem-se as cortinas do grande espetáculo de futebol”, dava início as transmissões. Impossível esquecer Waldir Amaral, entre todos o que mais criou frases de efeito como: “indivíduo competente”, “o relógio marca” e “tem peixe na rede”, além de dar apelido aos jogadores. Assim, foi que cognominou Zico de “Galinho de Quintino, apelido que o craque carrega ainda hoje. Não seria justo omitir nomes como Oduvaldo Cozzi, Osmar Santos que também fizeram história na radiofonia.
            E, como se não bastasse, a cobertura era coroado pelos sábios comentários de João Saldanha, Rui Porto – comentarista da palavra fácil – Mauro Pinheiro e Mário Vianna, “com dois N, falou tá falado”. Tudo se resumia num prazer imensurável. Era como estivéssemos dentro de campo. Literalmente a gente via o jogo. 
            Com o desenvolvimento tecnológico veio à televisão, que mesmo em estado precário tornou mais prazeroso assistir aos jogos narrados por Galvão Bueno ou Luciano do Vale e comentados por Juarez Soares.
            Após décadas, vi in-loco um jogo do Brasil, transformando em realidade um antigo sonho. De rádio-ouvinte e telespectador, passei a ator coadjuvante. Na arquibancada era mais que um entusiasmado torcedor - um brasileiro que jogava com o coração.
            Tarde-noite de 17/06/2014 – Brasil 0 x 0 México – Arena Castelão – Fortaleza – Ce – Plena Copa do Mundo.
            Estádio lotado. Brasileiros de toda parte exibiam bandeira nacional, dos estados e clubes do coração, além de camisas e faixas. Os mexicanos em pequeno número faziam tímida festa ante a superioridade da torcida brasileira. Havia homens, mulheres, desde crianças de colo até anciãos, mostrando que o futebol está no nosso sangue independente da idade. Evidentemente não podia faltar o pipoqueiro, sorveteiro e vendedor de balas que ofereciam seus produtos para refrescar os ânimos aquecidos.
            Uma Copa do Mundo mexe com o povo brasileiro e comigo não foi diferente. Mal adentrei ao estádio o corpo já dava sinais de emoção, sentimento que crescia à medida que o jogo caminhava e que extravasou com o Hino Nacional. Momento marcante e indescritível. Impossível resistir um coral de sessenta mil vozes, cantando uníssono para mostrar sua força. Com a adrenalina a mil e a voz embargada, unia minha emoção ao ímpeto da torcida enquanto as lágrimas escorriam nos rios da face. Por alguns instantes parecia o homem dos sete instrumentos que num só tempo cantava, chorava e sorria. Na verdade chorava mais que qualquer outra coisa.
            Era parte do contexto e da história. Ali estava eu, exibindo com orgulho a bandeira da “terrinha”, assegurando ao mundo a presença de Pombal na copa. Como bom torcedor fazia de tudo um pouco, afinal futebol é prá se ver, se emocionar, gritar, aplaudir, xingar, chorar, vibrar. Tudo isso se resume em festa. O futebol é o esporte capaz de reunir em harmonia todas as raças e nacionalidades.
            O espírito esportista prevaleceu sobre a competitividade dando ao jogo caráter festivo, clima protagonizado pela torcida que se embalava na ânsia do gol que ninguém fez. Fizemos a ola, mas faltou a explosão do grito de gol que ficou travado na garganta. Nem por isso o jogo se fez menos importante nem menor a minha emoção. É que o futebol é maravilhoso e emocionante, porém, cheio de surpresas e segredos difíceis de entender. São mistérios que somente aos deuses do futebol compete decifrar.
            Fim de jogo. A torcida se retira lentamente esvaziando o estádio. Milhares de torcedores se comprimem na saída reclamando do resultado. Um torcedor joga resto de sanduíche no chão, outro atira sobre as pessoas o refrigerante que sobrou enquanto o mais revoltado chuta os assentos deixando bem claro o baixo nível de educação.
            De volta prá casa trouxe o prazer de um sonho realizado, a certeza do quão difícil é conquistar uma copa e o exemplo de amor a Pátria. Contrariando o negativismo, TEMOS COPA, SIM, em grande estilo. A torcida esqueceu os problemas, vestiu as cores do país e faz valer o espírito esportista assegurando uma grande competição.
          Para mim um momento único e a ele nada comparável. Só quem viveu sabe o que representa. Tamanha é sua importância que Fabíola e Fernando – filha e genro – promotores, companheiros e cúmplices desta alegria, cuidadosamente registraram em vídeo para a posteridade.
            Assim, com tudo que assisti agora mais conciso de que: UMA COISA É VER, OUTRA É CONTAR. 
Pombal, 20 de junho de 2014
*Professor e Escritor. 
COPA DO MUNDO: UMA COISA É VER, OUTRA É CONTAR COPA DO MUNDO: UMA COISA É VER, OUTRA É CONTAR Reviewed by Clemildo Brunet on 6/25/2014 09:52:00 PM Rating: 5

Nenhum comentário

Recent Posts

Fashion