Você abusou
Ricardo Ramalho |
Ricardo
Ramalho*
A
vingança, sobretudo amorosa, é um prato que se saboreia frio. Por outro lado,
não combina com amor. Não guardam coerência. Mas, que se saboreia é inegável.
Quem
não cultuou amores platônicos? Quem, em Pombal, uma bucólica cidade incrustada
no Sertão da Paraíba, não curtiu o seu? Também desfrutei desse sentimento, para
meu eterno prazer. Parece que a dificuldade, a improbabilidade alimentam esse
desejo,
Meiguice,
inocência, beleza ornavam essa emoção, essa ânsia de alcance. Os caminhos
incertos, no início, afastaram nosso relacionamento, mas, não me fizeram
desistir. As Festas do Rosário, os carnavais, os “assustados”, como
denominávamos as festas improvisadas, nos reencontravam. Olhares, acenos,
lampejos de atração, animavam a intensa atração, o insistente amor.
Cheguei
alguns dias antes de uma das famosas vaquejadas. A cidade, ainda, se preparava
para a festa. Soube de um “assustado”, bem perto da residência de Tania, minha
irmã, onde me hospedei. Lá encontrei a garota dos meus sonhos que havia, nos
últimos tempos, se envolvido em um “relacionamento sério”, com outro, como se
publica, atualmente, nas redes sociais. Ela me cumprimentou. Depois, começamos
a conversar. Não havia mais ninguém da nossa turma, no local, assim o clima
estava mais favorável ao reencontro, ao diálogo. Depois de muita abertura de
sua parte, que lamentava os desencontros e indicavam seu desejo de
reaproximação, decidimos dançar. Muita luz, muitos nos observando e continuamos
dançando, bem juntos e lentamente, “em quatro mosaicos”, como se dizia, aquela
época. Era o retorno que não esperava, mas, que ansiava. Antônio Carlos e
Jocafi, uma dupla de cantores afinados, com seus sambas modernos, diferentes,
fazia o sucesso musical. A “radiola”, como se denominava o som de então, tocava
um dos seus sucessos: Você abusou.
A letra se encaixava em nossa
situação. Que coincidência! Estimulado pela música resolvi seguir o caminho da
“vingança” e, no dia seguinte, não dei importância ao acontecido no
“assustado”. E a canção martelava na cabeça: “você abusou, tirou partido de
mim, abusou... mas, não faz mal, é tão legal ter desamor, é tão cafona sofrer
dor, que eu já nem sei se é meninice ou cafonice o meu amor...”.
*Cronista
pombalense radicado em Maceió-Alagoas
Você abusou
Reviewed by Clemildo Brunet
on
4/29/2016 06:54:00 AM
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