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O PRIMEIRO "PORRE" NINGUÉM ESQUECE

Eronildo (Foto)
Eronildo Barbosa*

É bom chegar aos 50 anos e poder contar velhas histórias. Algumas boas, outras, não tão boas assim. O importante é dividi-las com as novas gerações de pombalenses que não tiveram, obviamente, a oportunidade de viver na terrinha no início dos anos 1970, década em que a cidade viveu importantes transformações econômicas e sociais, alavancadas pelas rodovias, televisão, Colégio Estadual, água tratada, telefone, entre outros benefícios.

Nesse período, no geral, o divertimento dos jovens, notadamente daqueles que nasceram no final dos anos 1950 e início de 1960, consistia em jogar bola no campinho do Ginásio Diocesano, tomar banho nas três pedras do rio, circular no bar-centenário, trocar figurinha no entorno da antiga rodoviária, além de assistir filme no Cine Lux, sem esquecer, claro, de comprar balas no fiteiro volante do Raildo Macena que, todas as noites, estava de plantão defronte ao cinema.

Para ter direito a esse lazer era necessário estudar. Uma parte dos jovens frequentava o Colégio Estadual Arruda Câmara, mas, até 1973, os que tinham uma melhor condição financeira estudavam no Ginásio Diocesano. As moças, que desejavam seguir a carreira de professora, frequentavam o Colégio das Freiras. Era uma delicia vê-las com saias pliçadas, azul, um pouco acima do joelho, desfilando garbosamente pelas ruas da cidade.

Os homens, à noite, por volta das 19:30 horas, ocupavam os bancos da Praça Getúlio Vargas. O assunto principal era futebol. Os bancos da referida eram de madeira, porcamente parafusados, o que ensejava que alguns ficassem soltos. Era a senha para à maldade. Quem sentava no final do banco corria o risco de se acidentar. Os que estavam no centro se levantavam ao mesmo tempo, combinado, provocando a inclinação da madeira e a queda do miserável.

Numa noite, quando esperávamos o corpo de Dr. Avelino chegar do Paraná, o motorista Nêgo Tana, falecido, foi uma das vitimas dessa antipática brincadeira. Só que o bicho pegou. Não ficou um moleque na praça. Todos dormiram mais cedo.

A Praça Getúlio Vargas é o coração de Pombal. Antigamente ela expressava a divisão de classes da cidade. Não era algo formal, claro, as coisas aconteciam normalmente. Cada tribo ocupava seu espaço nesse logradouro. Tinha até o lugar das “primas”, na esquerda do bar-centenário, próximo da velha televisão pública, cuidada por Lauro Barbosa.

Nos primeiros bancos, próximo a Igreja Matriz, ficavam o autor, Durão, Memém, Gato, Careca, Joaquim, Galego de Vanda, Macaco, Diar, Beba, Jurandir, Dedé, entre outros. Era um lugar estratégico, pois, aos domingos, éramos os primeiros a contemplar as beldades que saíam da missa, loucas para pecarem, como dizia Nêgo Breu.

Um pouco mais abaixo, defronte a casa de Pedro Adonias, se reunia um grupo mais experiente, de classe média, cujo debate principal era a politica. Integravam essa tribo: Antônio Neto, Leozinho, Geraldinho, Pedrinho, Werneck, entre outros. O germe do marxismo circulava nesse meio. Provavelmente por conta disso, os mais afoitos, tiveram que dar explicações à Policia Federal sobre supostas ações politicas que se efetivavam na cidade. Os homens da lei queriam saber a origem de umas “bombinhas” que foram detonadas no interior de um circo.

Nas proximidades da Coluna da Hora, por seu turno, outra tribo se reunia, embora não fosse fixa, para falar de futebol e outras amenidades, mas, vez ou outra, a politica entrava no centro, puxada por Wertevan Fernandes, defensor do velho e bom MDB de guerra. Integravam ainda esse grupo: Boquinha (José Tavares), Bilú, Candido Filho, Anchieta, entre outros. O autor, às vezes, participava dos colóquios dessa turma, embora não fosse de lá.

Certa feita, nessa praça, no final do ano de 1974, inspirados nos bons exemplos de Nero, Titico, Marçal, Chico de Camilo, Ignácio Tavares, Bajara, entre outros boêmios e amantes da boa pinga, resolvemos experimentar a “marvada”

Assim, no outro dia, nove horas da manhã, estavam o autor, Wertevan, Boquinha, Candido Filho e Bilú, no mercado, comprando um “tubo” de Pitú, como dizia Dorgival Barbosa, casco branco, duas latas de sardinha e meio quilo de farinha.

De lá partimos direto para o rio. Poucas horas depois a cachaça acabou. Restou apenas cinco jovens bêbados, sem saber direito como chegar em casa, pois, naquela época, sem prática, era natural que o corpo ficasse mole e pouco obedecesse ao que o cérebro ordenava. O corredor do Rio Piancó ficou pequeno. Foi um Deus nos acuda!

Recordo de poucos detalhes dessa experiência, estávamos todos na casa dos 15 anos, entretanto, sei que Candido Filho ficava correndo pela rua, com seu pai no encalço, com medo de entrar em casa. No caso do autor foi, sem dúvida, a pior noite vivida. A rede rodava com a mesma velocidade da roda gigante do Parque Maia. O cachorro, Veludo, ficou embaixo da rede esperando alguns nacos de sardinha.

Até hoje, mesmo depois de já ter consumido muitos litros de destilados, quando vejo alguém bebendo aguardente com sardinha, procuro um jeito de cair fora. Lembro-me rapidamente do “porre” de 1974.

*É professor universitário e autor do Livro Educação e Sindicalismo em Mato Grosso do Sul.
O PRIMEIRO "PORRE" NINGUÉM ESQUECE O PRIMEIRO "PORRE" NINGUÉM ESQUECE Reviewed by Clemildo Brunet on 12/13/2010 06:28:00 AM Rating: 5

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