Natal da minha infância, vagas lembranças
Ignácio Tavares |
Ignácio Tavares*
Enquanto criança a festa natalina não fazia
parte da minha agenda, nem mesmo pelo fato de ser a terceira mais badalada
efeméride do ano, além do Rosário e São João. Dessa forma, a festa da
natividade não me despertava o menor interesse por razões que em seguida
veremos.
Apesar da luminosidade da festa, nada mudava na
rotina do dia a dia da nossa família. O que me chamava atenção era os presentes
recebidos pelos amigos que residiam em frente a nossa casa. O mundo deles era
diferente do nosso, pois, logo cedinho os amigos desfilavam escanchados em
reluzentes bicicletas, velocípedes, doados supostamente por Papai Noel.
Encantados com aquela cena eu e
o primo Benigno ficávamos de queixos caídos ao vermos tudo aquilo que
nos parecia uma realidade distante de acontecer em nossas casas. Esse fato em
nada abalava a nossa autoestima, pois tínhamos consciência das limitações
financeiras da nossa família.
Também pudera, o pai dos amigos era o chefe da
Mesa de Renda na cidade, porquanto o meu pai era um ex-comerciante que vivia a
extrair da terra a sobrevivência da família. Dinheiro na nossa casa circulava apenas
de ano em ano por ocasião da venda do algodão. Desse modo sonhar com as gentilezas
de Papai Noel era coisa que passava ao largo das nossas aspirações.
Ah sim, as barracas armadas nas proximidades
da Igreja do Rosário despertavam-me interesses porque era uma oportunidade pra
sair de casa à noite e passar algumas horas na rua a observar a movimentação
das pessoas no vai e vem da praça Getúlio Vargas. O pouco dinheiro que tinha
mal dava pra comprar um leque de roletes de cana de açúcar ou então comprar um
copo de gelado na barraquinha de Otacílio.
Havia ainda os jogos de roletas nos bazares
onde por um cruzeiro podia-se comprar um bilhete para tentar a sorte grande. Quando
a roleta parava em algum dos números, alguém era premiado, sempre com objetos
de utilidades domésticas. Frequentar esses bazares era uma febre, a rua do
comércio em peso fazia-se presente.
Certa
vez Zulima foi sorteada com um conjunto de panelas de alumínio. Esse
acontecimento provocou uma verdadeira romaria da vizinhança a sua casa a fim de
ver os objetos do prêmio, bem como parabenizá-la pela sorte grande que bateu na
sua porta. Esse acontecimento contribuiu para que cada vez mais gente da rua do
comercio passasse a frequentar os bazares.
É isso
mesmo, o Natal há muito que deixou de ser uma festa Cristã. O menino da manjedoura
foi substituído pelo velho barbudo Papai Noel. Não se trata de um fenômeno
local. O mundo inteiro reverencia Noel considerado amigo das crianças,
sobretudo principal promotor do aquecimento das vendas nos finais de ano.
Não se pode dizer que essa tentação ao
consumismo seja coisa exclusiva do capitalismo ocidental, isso porque o bom
velhinho faz-se presente em todos os recantos do mundo. A mídia falada e
escrita dá destaque especial ao bom velhinho, porque também precisa engordar
seus respectivos caixas.
Desse modo não há como se livrar dele, porque
a economia do mundo inteiro espera por esse momento a fim de robustecer os
caixas das empresas produtoras de mercadorias apropriadas aos festejos de final
de ano. A cada ano novos produtos aparecem no mercado o que agita cada vez mais
a ânsia de consumo dos endinheirados.
Em meio a toda essa movimentação registra-se
um fato triste que persiste aos dias de hoje. Os pais desavisadamente passam
aos filhos a crença de que não existe valor de aquisição nos presentes recebidos.
Isso mesmo, os presentes são obras da generosidade do bom velhinho Papai Noel.
Vale a pena? No meu modo e pensar, não. Pois é, na minha casa fiz o que pude
para evitar que fosse passada para os nossos filhos essa infeliz ideia da gratuidade
dos presentes que habitualmente recebiam no natal e final do ano.
Com certo cuidado, com o passar do tempo, os
fiz entender que para comprar os presentes doados por Papai Noel o dinheiro tinha
que sair do bolso do Pai. É tanto que quando havia necessidade de realizar
trocas de alguns presente, fazia questão de leva-los a fim de que percebessem
que o verdadeiro Papai Noel, era realente o seu Pai.
Desse modo o velhinho saiu da cabeça deles de
tal modo que quando se aproximava o final do ano eles me entregavam a relação
dos presente que desejavam receber. Com efeito, o consumismo movido a Papai
Noel desapareceu da nossa agenda, sem traumas, sem constrangimentos. Foi bom
pra nós, foi melhor pra eles.
Pois é, Papai Noel fez o povo esquecer a festa
da natividade. A força do capital, bem como do comercio, sobrepôs-se ao mais
importante momento da Fé Cristã, qual seja a chegada a terra de um menino que veio
para fazer valer o perdão, a igualdade, a justiça bem como a expectativa de se
construir um novo mundo de paz e felicidade infinita. A vinda desse menino a
terra foi anunciada por centenas de anos antes do seu nascimento. Vejamos as
profecias que antecederam a Sua chegada:
“Um renovo sairá do tronco de Jessé e um
rebento brotará de suas raízes. A justiça será como um cinto em seus rins, a
lealdade circundará seus flancos. Então o lobo será hospede do cordeiro, a
pantera se deitará ao pé do cabrito, o touro e o leão comerão juntos e um
menino pequeno os conduzirá” (Isaias 11. 1, 5, 6). Quem tiver o mínimo de inteligência
que entenda.
Ainda, “O
povo que andava nas trevas viu uma grande luz; sobre aqueles que habitavam uma
região tenebrosa resplandeceu uma luz” (Isaias 9,1). Esta foi mais uma
importante mensagem anunciada centenas de anos antes da chegada de Jesus a
terra.
Pelo
expostos entende-se que no mundo real que vivemos, nada disso está a valer,
pois o consumismo desenfreado faz da Festa da Natividade uma grande feira de
missangas que leva mais quem tem mais e não leva nada quem não tem nada, não é?
Mesmo assim desejo um Natal e Ano Novo
repletos de paz felicidade a todos quanto lerem este texto bem como aos que não
leram, mas de qualquer forma pelo menos ouviram falar. Que a Paz do Senhor
Jesus esteja com todos vocês.
João Pessoa, 16 de Dezembro de 2013
*Economista e Escritor
Natal da minha infância, vagas lembranças
Reviewed by Clemildo Brunet
on
12/16/2013 07:00:00 AM
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