O CHEIRO DAS RUAS DE POMBAL: DÉCADA DE 1970
Jerdivan Nóbrega de Araújo |
Jerdivan
Nóbrega de Araújo*
Uma boa chuva no final da tarde e somos
tomados pelo cheiro de terra molhada. Aquela olência da infância que sentimos quando criança e ainda trazemos
hoje em nós adulto. De repente nos vem
aquela vontade incontrolável de sair correndo a procura das biqueiras, de um
lugar para jogar bola de gude ou simplesmente de pisar na lama que escorre
pelas ruas.
-
Ah, a terra molhada... me traz boas lembranças do aroma inconfundível das ruas
de Pombal na minha distante infância
Aquelas ruas tinham cheiros peculiares a
cada artéria ou momento.
Nas ruas do Rio e dos Roques, por
exemplo, o olor era do café torrado que fugia pelas chaminés da torrefação de
“seu” Veríssimo e de “seu” Chico Almeida.
- Era o café Dárcio sendo torrado e
moído para em seguida ser distribuído por todo o comércio da região, não sem
antes nos entorpecer com seu aroma gostoso.
“Da choupana ao palácio
Todos tomam café Dárcio”
Subindo próximo à Rua João Pessoa, já
sentíamos o cheiro da semente de algodão que era triturada para a fabricação de
óleo e ração animal pela usina de Paulo Pereira, e que competia com o cheiro
das amêndoas de oiticica, que levado pelo vento, ia bem mais distante,
inundando com seu aroma forte cada quadrante da cidade de Pombal.
O incômodo da efluência da queima da
casca da amêndoa de oiticica era compensado pelos empregos proporcionados pela
velha fábrica aos pais de famílias da terra de Maringá.
Nas madrugadas e nos finais de tarde
eram as padarias que incensavam as ruas. As fornadas de pão quentinho traziam a
porta dos estabelecimentos os fregueses movidos pelo cheiro gostoso de pão que
o vento tratava de espalhar pela cidade.
Era assim nas panificadoras do centro e dos bairros, a exemplo dos
estabelecimentos de seu Napoleão, “seu” Adauto e “seu” Antônio Barbosa.
Chegava o sábado e como era gostoso
andar no meio da feira sentindo o aroma do feijão cozido com muita carne de
charque e jerimum, que eram preparados e vendidos nas muitas barracas que se
formavam ao longo das ruas laterais do Mercado Público, onde os matutos enchiam
seus generosos pratos e os saboreavam sem muito tempo, preocupação ou atenção
ao cheiro gostoso de comida caseira.
Nas muitas bodegas onde os trabalhadores
rurais faziam as suas feiras da semana, o cheiro que vinha de dentro para fora
era o da cachaça e do fumo de rolo, apreciados entre uma e outra cusparada,
para a preocupação de quem passava pela calçada daqueles estabelecimentos
comerciais.
- Quem já sentiu o cheiro de bodega do
interior?
Aos domingos ao meio dia era gostoso
atravessar as ruas e sentir o cheiro do almoço preparado pelas donas de casas,
à espera dos seus filhos e esposos para se sentar à mesa, e deliciá-los. E vem as minhas recordações olfácticas até o
sabor inconfundível do peixe frito, da carne de sol assada na brasa ou da
galinha, cujo aroma descia pelas ruas, abrindo o apetite de quem transitava
pelo lugar.
Mas, também tinha cheiro não muito bom
que incomodava a cidade. Eu não me arriscava a passar em frente ao curtume de
seu Luiz, nos arredores da usina de Paulo Pereira, onde os couros de animais
esticados em varas traziam as nossas narinas a podridão da carne e da vida
massacrada.
Vinha a noite e o perfume de flores como
os bogaris de dona Neves Tertuliano, os
alecrins da residência de Dr. Atêncio e os jasmineiros do jardim de seu
Saturnino se misturavam com a Água de Cheiro usada pelas moças e rapazes que
passavam em direção ao Cine Lux ou praças centrais da cidade, onde iam namorar tomando sorvete de essência
baunilha na sorveteria de seu Bernardo Bandeira.
O cheiro da pipoca vendidas defronte ao
o cinema e até o inconfundível aroma que penetrava nas nossas narinas ao
abrirmos os pacotes de figurinhas do álbum que acabara de ser comprado na banca
de revista da esquina são as lembranças do cheiro das ruas da minha terra.
Quantas outras linhas eu poderia
escrever sobre os cheiros da minha infância nas ruas de Pombal?
*Jerdivan
Nobrega de Araújo – Escritor pombalense e pesquisador
O CHEIRO DAS RUAS DE POMBAL: DÉCADA DE 1970
Reviewed by Clemildo Brunet
on
5/17/2018 05:36:00 PM
Rating:
Nenhum comentário
Postar um comentário