MADE IN BRAZIL
Por Severino Coelho
Viana*
Ou
cantava em inglês ou não era brasileiro. É uma frase estranha e, de inopino,
feita uma leitura apressada, causa uma interpretação dúbia, principalmente para
as novas gerações que estão longe da década de 1970, e desconhecem o movimento
artístico/musical denominado “Made in Brazil”, que veio alterar o mercado
fonográfico e a cultura no estilo musical com o surgimento de cantores e grupos
musicais nacionais transfigurados de astros estrangeiros e que alcançaram
grande sucesso junto ao público, configurando-se em fenômenos de vendagens e
das paradas de sucesso, devido grande influência da musicalidade internacional.
No
seio da juventude da época havia um grau de vaidade de saber falar ou cantar na
língua inglesa era uma demonstração de capacidade intelectual e a mensagem
internacional (inglês e francês) incutiu muito bem ao redor do mundo este
estilo musical que rendia uma alta cifra de rotatividade no mercado financeiro.
Do
ponto de vista sociocultural, o tempo também foi de grandes mudanças e de
ruptura comportamental, capitaneada pelo movimento hippie. Impulsionados pelo
advento da pílula, pregou-se o sexo livre, independente de gênero, não se
levando em conta se havia ou não amor. As drogas ocuparam seu espaço, em suas
mais variadas manifestações, fazendo, muitas vezes, parte da rotina diária da
juventude. Na época, o movimento feminista embrenhava-se na busca efetiva de
mais direitos da mulher. Além disso, o cuidado com o corpo também ganhou
propulsão, bem como a moda. E, para os corpos ficarem perfeitos, surgiu a onda
de fazer ginástica e praticar esportes. O tempo é de discoteque; de John
Travolta e seus Embalos de Sábado à Noite, de Sônia Braga e Dancing Days.
A
partir da virada dos anos 1960/1970, ocorre o momento de consolidação da
televisão brasileira. O número de aparelhos nas casas mais que duplica em cinco
anos, chegando a 10,2 milhões em 1975 e, em 1980, chegam a 19,6 milhões. O
investimento publicitário também cresce vertiginosamente, alcançando 36,7% em
1970, 42,7% em 1976 e 51,6% em 1982. Paralelamente a essa estrutura
organizacional, surgem inovações tecnológicas e gerenciais da produção, tendo a
Rede Globo como mola-mestra dessa propulsão.
Era
claro e notório, na década de 1970, as rádios no Brasil tocavam na maioria de
sua programação música estrangeira e o DJ, de hoje, ainda era chamado de
Disc-Jockey. Um grupo de artistas brasileiros tornou-se um fenômeno de vendas
do mercado fonográfico fazendo grande sucesso ao compor e cantar em inglês
usando pseudônimos americanizados. Terry Winter, Patrick Dimon, Chrystian,
Malcolm Forrest, Peter Dunaway, Mark Davis e Dave Maclean foram alguns, além
dos grupos Light Reflections, Sunday, Lee Jackson e Pholhas, entre tantos
outros. Eram artistas brasileiros lançados como estrangeiros cantando em inglês
com um único objetivo de manter o lucro das gravadoras frente à explosão de
vendas da música internacional.
A
título ilustrativo do nosso artigo apresentamos alguns exemplos:
Morris
Albert, em 1973 lançou a música "Feelings", se tornou um enorme
sucesso vendendo mais de 300 mil cópias não apenas no Brasil. Em 1978 gravou o
sucesso "She's m", de sua autoria.
Grande
parte dos sucessos lançados por esses artistas ganhou o mundo. ''Feelings'' é o
exemplo paradigmático: a maioria dos americanos pensa até mesmo tratar-se de um
standard nacional.
Light
Reflections - em abril de 1972, lança pela gravadora Copacabana o disco Tell Me
Once Again. Em menos de um mês o disco já estava entre os 10 primeiros de todas
as paradas do Brasil. O Light Reflections tornou-se um dos grupos mais
requisitados na época e se destacou entre os diversos nomes brasileiros que
cantavam em inglês.
''Tell
Me Once Again'', do Light Reflections, também estourou dentro e fora do país,
gravando oito compactos e dois LPs em apenas cinco meses do ano de 1972.
Lee
Jackson, foi um grupo de rock formado na cidade de São Paulo em 1969 por Luís
Carlos Malully (voz e guitarra), Marcos Maynard (teclados), Cláudio Condé, Sérgio
Lopes (baixo) e Marco Aurélio Bissi (bateria). Iniciou a sua atuação fazendo
"covers" dos Beatles e de James Taylor. Com a moda de cantar baladas
em inglês no início dos anos 70 o grupo obteve sucesso.
Terry
Winter, seu nome verdadeiro era Tommy Standen. Ele era paulista e pertencia a
uma família de origem britânica, o auge de sua carreira foi na década de 70, no
movimento conhecido por rock da garoa. Summer Hollyday e Our love dream, foi um
de seus grandes sucessos.
Pholhas
– grupo paulistano formando em junho de 1968, na cidade de São Paulo, por Helio
Santisteban, Paulo Fernandes, Oswaldo Malagutti, Wagner "Bitão"
Benatti, guitarrista e vocalista. Fizeram sua estreia oficial num baile no
bairro do Tatuapé em setembro de 1972. Lançaram pela RCA seu primeiro LP e
nenhuma das suas músicas de sucesso vendeu menos do que 300 mil cópias.
Mark
Davis - no início dos anos 70, antes de adotar o nome de Fábio Jr., seguiu a
tendência do mercado daquela época - que preferia que os cantores brasileiros
gravassem em inglês com nomes estrangeiros - e passou a usar os pseudônimos de
Mark Davis e Uncle Jack. Como Mark Davis, o artista chegou a lançar disco em
1974 e emplacou a canção, Don't Let me Cry, feita para uma namorada morta no
incêndio do edifício Joelma, ocorrido em São Paulo no ano anterior.
Michael
Sullivan - de Recife se mudou para o Rio aos 17, fez parte dos grupos
"Renato e seus Blues Caps" e "The Fever's". O seu primeiro
compacto solo "My Life" superou a marca de um milhão de cópias
vendidas.
Tony
Stevens, foi o pseudônimo que o cantor Jessé usava para cantar em inglês
diversas canções como If you could remember antes de fazer uma carreira
brilhante na história da música popular brasileira.
Os
Trepidant’s - banda pernambucana da cidade de Recife que fez muito sucesso no
nordeste desde 1970 cantando em inglês. Foram lançados nacionalmente pela
gravadora Tapecar do Rio de janeiro em 1976. No primeiro long play fizeram
sucesso com a música "Remember me". O sucesso foi tão grande que em
sessenta dias venderam 350.0000 cópias, ganhando disco de ouro e platina.
Dave
Maclean é um cantor e compositor brasileiro cujo repertório cantado em inglês
fez muito sucesso nos anos 70. Dave emplacou vários hits como "Me and
you", tema da novela Os Ossos do Barão, "Tears",
"Feelings" e "We said goodbye", esta última recebeu disco
de ouro no Brasil e no México. O cantor também teve reconhecimento em países
como Filipinas, Equador, Panamá, Portugal, Estados Unidos, Espanha, França e
Inglaterra.
Nos
anos 70, diversos temas internacionais que fazem sucesso nas trilhas de novelas
são na verdade gravações nacionais, feitas por uma garotada que ama os Beatles.
Um público que adora música americana nem suspeita que aquela música que embala
seus momentos românticos seja em verdade música feita aqui. Quando descobrem
que essa música não é importada, muitos ficam de coração partido, mas com o
passar do tempo, resta saudade que essas canções deixaram. Esta é a trajetória
de um movimento musical, onde se conta as histórias dos artistas que gravaram
esses sucessos "estrangeiros" Made In Brazil. Esse movimento também é
conhecido como "Os falsos Gringos"
João
Pessoa - PB, 02 de outubro de 2019.
Severino Coelho Viana |
*Escritor pombalense e Promotor de Justiça em João Pessoa - PB
coelho@globo.com
MADE IN BRAZIL
Reviewed by Clemildo Brunet
on
10/02/2019 08:36:00 AM
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