A SECA DE 2012: O que precisa mudar?
Ignácio Tavares |
Ignácio
Tavares*
A seca de 2012 foi
tão devastadora a ponto de surpreender a todos que dependem da terra para
produzir suas necessidades de consumo, além de gerar excedente para o mercado. É
verdade que ninguém esperava uma redução no regime das chuvas de tamanha
dimensão, nem mesmo os mais qualificados meteorologistas da região.
Se as chuvas ao menos
fossem suficientes para repor a carga dos açudes e ainda assegurar a babuja
para alimentação do gado, com certeza os prejuízos materiais, financeiros
seriam insignificantes. Se assim fosse, seria um alivio e
tanto para os
sofridos criadores da região que sempre estão a sofrer as consequências da
escassez de pastagens, principalmente nos últimos meses do ano, mesmo em
período de normalidade climática.
É isso mesmo, se as
chuvas fossem suficientes para assegurar água, pastagens para o gado,
caracterizava-se uma típica seca verde onde apenas a produção de milho, feijão,
e arroz, podiam ser prejudicadas de forma parcial, porquanto a pecuária seria
menos afetada, pois o plantel bovino mesmo que sofresse pequenas baixas, com
certeza, suportava a escassez de volumosos até o momento do retorno das chuvas
na próxima estação invernosa de 2013. Não foi isso o que aconteceu, pois a seca
foi mais agressiva do que se imaginava.
Aliás, as perdas
agrícolas talvez não fossem sequer sentidas, posto que, atualmente a produção
de alimentos, em termos quantitativos é de pouca expressão, por absoluta falta
de mão de obra no campo. Já não se faz mais agricultura como se fazia
antigamente. A geração de bons trabalhadores rurais perdeu-se no tempo.
Infelizmente as gerações seguintes não são afeitas as lides rurais.
Resultado: o campo
está vazio, pois, o que antes era uma vicejante fonte de geradora de emprego e
renda, hoje não passa de um espaço agricultável onde pouco ou nada se produz.
Os efeitos, em razão da subutilização dos recursos naturais de produção são perceptíveis
quando se volve o olhar para a pobreza instalada no campo. Outro modo de
perceber essa situação é perda do valor da terra na sequencia do esvaziamento
do campo.
Hoje, a terra é um
ativo de baixo valor monetário, em se comparando com o preço que tinha no tempo
da exploração intensiva da cultura do algodão. Naquela época ser grande proprietário
era sinônimo de riqueza além de “status político e social”. Hoje a terra é um
incômodo pesadelo em razão dos altos custos para mantê-la ativa no dia a dia e
da duvidosa perspectiva de retorno dos investimentos realizados. Assim sendo
investir na compra de terras, hoje, é um péssimo negócio, pelo menos no sertão
paraibano.
Retomando a questão
climática pode-se dizer que, em vez de seca verde o que aconteceu foi uma seca
braba como costuma dizer o povo da região nessas ocasiões. A coisa é feia, pois,
faz muito tempo que o homem do campo não enfrenta uma seca tão devastadora como
esta de 2012. Ainda não se tem uma avaliação das perdas, principalmente no
setor pecuário, mas, com certeza são bastante acentuadas.
Os serviços de
meteorologia, de certa forma, não esperavam precipitações em níveis tão baixos
como esta que ocorreu em 2012. Se não fosse o programa de transferência de
renda do governo federal para os
segmentos menos favorecidos, a fome no campo seria arrasadora.
É claro que não seria
tão grande o quanto fora nas décadas passadas, pois a população rural
remanescente não passa dos dez por cento da população total da maior parte dos
municípios. Há municípios que esse percentual é bem menor, porque o processo
migratório no sentido campo cidade foi mais intenso do que nos demais
municípios onde agricultura ainda permanece representativa como fonte geradora
de emprego e renda.
É isso mesmo, o tempo
não para e os fatos se repetem a cada década. A seca como fenômeno natural
sempre existiu e continuará a existir por séculos sem fim. É impossível
prevê-la com muita antecedência, mas, há muito se sabe que a cada ciclo de dez
anos é possível a ocorrência de duas ou três secas que podem ser de pequena
intensidade ou de intensidade agressiva, a exemplo desta que aconteceu no ano que passou.
As causas são
conhecidas pelas comunidades cientificas. Há fortes indícios de que as
variações da temperatura das águas do Pacifico, bem como do Atlântico, são dois
indicadores através dos quais é possível prever a ocorrência de precipitações
normais seja, no limite ou acima da média histórica. Por outro lado, da mesma
forma poderão acontecer precipitações anormais abaixo da média observada. Mesmo diante desses
fatos previsíveis inda não é possível identificar em que intensidade o fenômeno
acontecerá.
Bem, é certo que os
registros das secas no sertão têm início a partir do momento em que os primeiros
colonizadores aportaram na região lá pelos idos do final do século XVIII. Faz
muito tempo, não é? Pois é, não obstante todo esse tempo ainda não foi possível
desenvolver tecnologias de manejos apropriados que permitam melhorar o uso dos
recursos escassos na unidade de produção, em caso de seca. Diante dessa
situação é de suma importância criar condições para que o homem do campo possa
conviver com a adversidade climática sem o risco de elevados prejuízos
materiais e financeiros.
Apesar dos pesares há
exemplos a seguir. Vejamos: existem experiências bem sucedidas em várias partes
do mundo cujos resultados são bastantes conhecidos. A Espanha, o estado de
Israel são duas vitrines que servem de mostruários para os países que sofrem as
consequências das variações climáticas incertas, que, com certa frequência
provocam perdas consideráveis na produção agropecuária.
O estado de Israel é a
grande referencia quando o assunto é o aproveitamento racional dos recursos
hídricos escassos em áreas cuja precipitação gira em torno de 150 a 300
milímetros/ano. Lá não se perde um pingo d’água, tudo é aproveitado em
cisternões cobertas para eliminar os efeitos da evaporação. Quando não existem
microbacias para alimentar as cisternas, recorre-se a impermeabilização de uma
determinada superfície, sempre a montante do depósito, o que permite aproveitar
a toda água resultantes das chuvas caídas no espaço programado.
Desse modo, através
de um sistema de irrigação altamente parcimonioso o estado de Israel consegue
produzir o suficiente para o consumo da população, ainda exportar os excedentes
para alguns países da Europa. Diante dessa experiência bem sucedida
pergunta-se: por que o governo não redireciona as políticas públicas voltadas
para o fortalecimento da agricultura
familiar, alem das pequenas e médias propriedades, expostas as incertezas das
chuvas, principalmente na região semiárida? Vale a pena experimentar, não é?
Não sei dizer quais
as regras atuais, mas por muito tempo as políticas públicas do governo (Sertanejo,
Cooperar, entre outros)tem como principal objetivo atender as comunidades
organizadas em associações, dispersas pelas diversas regiões do estado. Esse
tipo de política dificilmente libertará o homem da dependência das incertezas
climáticas
Acredito que seria
mais eficaz se o principal objetivo desses programas fosse o fortalecimento da unidade de produção no
sentido de dota-la de uma infraestrutura mínima de tal sorte que assegurasse a
disponibilidade de recursos, principalmente a água, de tal modo que em caso de
ocorrência de secas, fosse possível produzir o mínimo necessário para
manutenção da família e dois animais.
No estado do Ceará o
governo anuncia a construção de 50 cisternões para assegurar água para a
produção de hortaliças, feijão, milho e frutas para os pequenos e médios proprietários. Trata-se de um
projeto experimental que depois de avaliado poderá ser transformado num projeto
de governo. Com se vê o estado do Ceará sempre esta a frente dos projetos
revolucionários voltados para melhorar a qualidade de vida dos segmentos mais pobres da zona rural. E nós? Nada.
Com certeza os
técnicos do Ceará conhecem a experiência de Israel. Desse modo constataram que
a construção de cisternões, a exemplo do estado de Israel é sem duvida uma boa
política. Se a unidade de produção possui água armazenada que permita a
irrigação de três hectares ou mais, com certeza o homem poderá conviver pacificamente
com as adversidades climáticas. Agora pulverizar recursos na tentativa de
promover centenas de associações, não dá, não é? Por isso tenho lá minhas
dúvidas sobre a eficácia desse tipo de política publica.
N’outras palavras se
o governo pretende criar condições para que o homem do campo possa conviver com
a seca, necessariamente vai ter que investir na unidade de produção e não, tão
somente nos projetos de assistência ao associativismo, pelo menos por enquanto.
Posta em prática
políticas dessa natureza, qual seja implantar uma infraestrutura mínima na
unidade de produção com a finalidade fazer o homem conviver com a seca, vale a
pena investir nos projetos de promoção social a envolver os diversos segmentos,
tais como saúde, educação, saneamento, lazer, entre outros.
É verdade que
construir uma rede de Cisternões em pequenas e médias propriedades o custo é
deveras exorbitante. Assim sendo um projeto dessa natureza necessariamente os
custos devem ser partilhados entre o governo e o beneficiado. Quero dizer que,
os custos com a preparação da unidade de produção para fins produtivos, na sua
maior parte, seriam de competência do proprietário através de uma linha de
credito especial, a juros zero, com direito a rebates no momento da quitação.
Se as políticas
públicas do governo voltadas para o fortalecimento da atividade agrícola a
envolver pequenos e médios produtores rurais tivesse sido posto em pratica
durante todo tempo em que o Cooperar atua na área, com certeza os efeitos desta
seca devastadora de 2012 não seria tão
grande o quanto foi. Por exemplo, no
município de Pombal terá o seu plantel bovino reduzido em 50%.
Estou a me referir a
um dos maiores rebanhos do estado que contava cerca de 25 mil animais. Com
certeza será reduzido a 12 mil animais o que resultara em graves prejuízos para
a indústria de laticínio do município e áreas circunvizinhas. Os preços dos
derivados do leite, como queijo, manteiga, doces entre outros registram esse
momento de escassez de matéria prima.
Com certeza a
recomposição do rebanho levará alguns anos pra acontecer. Os criadores que
possuem propriedades às margens do rio Piancó, com certa dificuldade
conseguiram manter 70% do plantel. Agora, os criadores que dependem da água
acumulada em poços artesianos, amazonas, pequenos e médios açudes foram
obrigados a se desfizer dos rebanhos. Estes vão ter que esperar um bom tempo
para recompor seus planteis.
Quanto aos produtores
de milho, feijão arroz, estes perderam tudo. E agora? Vale a pena investir
milhões de reais na promoção ao desenvolvimento do associativismo deixando de
lado a preparação da unidade de produção para enfrentar os anos de clima
adverso? Se as políticas públicas do governo continuar com estão, sei não. Tenho
lá minhas dúvidas....
Por isso continuo a
dizer: mudar o foco, a direção, das políticas de governo com o objetivo de
melhorar as condições de vida do homem do campo, inclusive da chamada
agricultura familiar, mais do que nunca é necessário.
João Pessoa, 02 de
Janeiro de 2013.
*Economista e escritor pombalense
A SECA DE 2012: O que precisa mudar?
Reviewed by Clemildo Brunet
on
1/02/2013 09:20:00 AM
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