Terceira Idade, um Período de Paradoxos
Genival Torres Dantas |
Genival Torres Dantas*
Dia 1° último foi comemorado o dia do idoso, acompanhamos pela mídia
muitas reportagens direcionadas as conquistas dessa classe, que não foram
poucas, gratuidade no transporte urbano, direito aos medicamentos de uso
contínuo, tão necessários nessa fase da vida, locais apropriados para os
exercícios físicos, normalmente em praças públicas, assentos exclusivos ou
prioritários em ônibus e
metrôs, descontos nos ingressos para espetáculos
culturais, em todo território nacional, e tantas outras iniciativas das
autoridades competentes.
Na iniciativa privada, temos verificado uma série de eventos voltados
para a 3° idade, a melhor idade ou qualquer outra terminologia como se tem
tratado aqueles que superaram a faixa dos 60 anos. Temos visto empresas de
turismo trabalhar esse mercado com muita prioridade e atenção, fazendo pacotes
de viagens, para dento e fora do nosso país, alternativas nacionais e
internacionais, com abrangência a todas as estações do ano para que não falte
lazer a essa gente que de repente foi
descoberta e que a velhice não é o sentido de morte anunciada, ou mesmo
programada.
Os salões de festas se multiplicam com programações de bailes,
normalmente da saudade, propícios aos integrantes desses grupos, os
supermercados lotam suas prateleiras com produtos que possam atender as dietas
prescritas pelos nutricionistas especializados na alimentação balanceada e
indicada aqueles que necessitam de cuidados específicos, como é o caso da
grande massa que faz parte os novos velhos do nosso pais, que hoje já somam 13
milhões e serão 21 milhões em 2040, com idade superior a 65 anos. Como podemos
notar é um mercado substancial, representativo, portanto, alvissareiro.
Tudo que falei foi relacionado a uma faixa de uma classe, aquela que
durante sua vida pregressa trabalhou, formou família, investiu, fez reservas,
soube poupar, teve oportunidades e competência, muitas vezes com muito
sacrifício, e hoje pode usufruir do resultado de seus esforços, o que é justo.
Observei que nesse mesmo dia não li, não vi e não escutei nenhuma nota
fazendo menção da existência de uma legião de excluídos que fazem parte do
universo dos idosos, como todo universo, nem todas as flores são perfumados, e na
vida, diferentemente das estações do ano, nem sempre a primavera vem na
sequencia do inverno, ou estação das águas, há os contratempos, a competência como
sabemos não é privilégio de todos, e o momento exato com atitudes pontuais é
uma questão de visão e não insensatez.
O resultado da sequencia da vida tem seus paradoxos, para uns o final
positivo vem como premio, para outros não há final, e suas ações são de gestos
e fatos continuados. Para esses últimos, e não são poucos, a velhice é um
pesadelo; não há viagens internacionais, nacionais, nem mesmo regionais. Os
bailes nos salões preparados para eventos especiais destonados a essa classe de
homens e mulheres, não fazem parte do seu imaginário. As praças compostas de
aparelhos e equipamentos para o exercício dos seus contemporâneos, essas sim,
eles podem frequentar, não para ajudar na sua saúde física, no seu passa tempo,
mas como uma oportunidade que ele tem de levantar algum dinheiro na venda de
algumas quinquilharias, aos frequentadores daquele ambiente, ajudando na
manutenção dos seus custos e sua sobrevivência.
É a lei da vida no mundo de um capitalismo selvagem, é o nosso mundo,
onde 69% dos aposentados sobrevivem com o salário mínimo, que representa o
valor de R$678 reais, é o que ele vale num universo onde ter vale mais do que ser.
A grande maioria absoluta desses infortunados é constituída de idosos, muitas
vezes solitários, sem parentes, ou um amigo sequer. Quando seu parceiro ou
parceira desaparece e sem filhos, largados a sorte, só mesmo a caridade e a
solidariedade humana pode lhe levar algum conforto, à maioria das vezes,
acomodado em um quarto de fundos, cheirando a mofo e de pouco quintal.
É lá que reside a solidão, uma companhia desagradável, a lhe cobrar o
que ele não tem como pagar, nada lhe resta, a não serem as lembranças de um
passado de tristes memórias e trapos distribuídos numa mala mal conservado, em
cima de um caixote de madeira, recostado no canto do quarto, para não cair, e
que faz parte do parco mobiliário do seu espaço, nada mais pode ser feito, nem
reposto; na espera silenciosa, no compasso das horas, marcadas pela sombra que
faz o sol no muro, sem reboco, e frio, consequência dos dias cinzentos, muitas
vezes chuvosos, como se o céu estivesse a chorar as suas dores e seus queixumes.
Quem sabe o vizinho, único elo com o exterior, fora daquele ambiente
cruel e desumano, lhe traga um abraço, um sorriso amigo, num rosto desdentado e
pele queimada do sol e do sal do mar que açoita a pele, única alma a lhe trazer
alento nesse marasmo de torturantes desejos de clemência e compaixão. É dessa
gente que ninguém fala, sobrevive escondida no submundo dos subterfúgios da
indiferença, para esses não há comemorações, comemorar é reviver momentos,
reviver tristezas não precisa de comemorações, basta à continuidade dos tristes
dias do seu presente.
O que nos deixa perplexo é ver que há uma preocupação muito grande com
as crianças e jovens, quando as autoridades investem nesses contingentes, e não
pode ser diferente, mas, sem esquecer os idosos, neles são depositadas muitas
esperanças, é o florescer da vida, é lá que reside à fé inabalável no ser
humano e as mudanças para melhor, que possa vir. E que amanhã venha um novo
velho, sem as necessidades básicas tão evidentes nos nossos anciões excluídos de
uma sociedade marginal. O idoso representa hoje, para a sociedade produtiva, o
fim de um ciclo, a sua colaboração já foi dada, nada mais ele pode acrescentar,
a não ser custo.
É lamentável que possamos podar os desejos e anseios dessa gente, que o
idoso viva com toda intensidade a vida que lhe pertence, tudo aquilo não pôde
viver no passado de uma infância infeliz, uma juventude perdida e uma
maturidade sem possibilidades de encontro com a felicidade, e possa realizar
algum desejo reprimido, mesmo que tardiamente, e deixemos que ele venha a
sucumbir aos estereótipos e preconceitos inadmissíveis, numa sociedade como a
nossa, tida como democrática, onde convivemos com as diferenças dentro de uma
harmonia como se preconiza numa democracia ampla e regida por um sistema de
governo socialista, mesmo que populista.
Sinceramente, é ser cruel pensar e agir dessa forma, sugar tudo de um
ser humano e jogá-lo num deposito de mortos vivos, quando muito num asilo, reservado
aos carentes e miseráveis, sem os cuidados devidos, isento de apoio
governamental e esquecidos pelos parentes, tratados como uma mercadoria
imprestável que não tem retorno. Porém, esse ser está respirando, mesmo que não
esteja vivendo a sua plenitude, continua pensando apesar da indiferença do
mundo, é uma biblioteca que partirá com seus livros sem uso e sem utilidade,
para um mundo de analfabetos espirituais.
Contrastante dia dos idosos! Até mesmo alguns jovens sentem-se
angustiados e refratários ao tratar do assunto, temem viver no futuro numa
velhice sofrida, dependente de outros, e de muitos, na profunda solidão das
almas perdidas e irrecuperáveis, mas, falar é preciso, não podemos nos afastar da
realidade que nos aproxima da própria existência. Feliz o que pôde, pode e deve
intensamente comemorar a vida e a gratificação de viver, pobre idoso de muitas
lutas e decepções continuada, no final da vida, que surge triste e lentamente
como a imitar seus passos lerdos como quem não tem para onde ir enquanto vivo
estiver.
*Escritor e Poeta
Terceira Idade, um Período de Paradoxos
Reviewed by Clemildo Brunet
on
10/05/2013 06:15:00 AM
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