DEZ ANOS SEM O MONSENHOR LUIS GUALBERTO DE ANDRADE
José Antonio Albuquerque |
Por
José Antonio Albuquerque*
Há 10 anos Cajazeira se despedia do
MONSENHOR LUÍS GUALBERTO DE ANDRADE, o apóstolo da fé e da educação, com
lágrimas e comoção. O seu sepultamento ocorreu no dia 24 de junho de 2007, na
Catedral de Nossa Senhora da Piedade, sob o altar de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro.
No dia 23 junho de 2007, noite de São
João, falecia em Cajazeiras o Mons. Luís Gualberto de Andrade aos 85 anos de
vida. A sua história feita de humildade, obediência, trabalho e fé, teve uma
perspectiva messiânica e profética e fez mudar a face de uma região, quando
assumiu em 1969, a direção da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
Cajazeiras, mantida pela FESC – Fundação de Ensino Superior de Cajazeiras,
idealizada e criada pelo então Bispo da Diocese de Cajazeiras, Dom Zacarias
Rolim de Moura.
Conheci o Padre Gualberto, como gostava
de ser chamado, no ano de 1963, nas minhas peregrinações como Presidente da
Associação dos Estudantes Secundários de Cajazeiras (AESC), na cidade de
Pombal, PB, quando fui seu hóspede no Hospital Janduí Carneiro, instituição que
pertencia a Diocese de Cajazeiras, a qual dirigia.
Somente em 1969 voltamos a nos encontrar.
Acabara de ser nomeado diretor da FAFIC. Recém chegado de Louvain, na Bélgica,
onde foi fazer um curso de especialização. Em Cajazeiras assumiu a direção da
FAFIC: uma espinhosa e difícil missão. Com uma visão bem mais ampla do mundo e
com uma larga e longa experiência no setor educacional, não perdera tempo: já
fazia funcionar nas dependências da antiga sede da Ação Católica, na Rua Padre
Rolim, um cursinho pré-vestibular. Na cidade não se falava em outra coisa, a
notícia chegava célere aonde quer que morasse um cajazeirense. Cajazeiras ia
ter uma faculdade.
Padre Gualberto era o quarto diretor a
ser nomeado pelo Bispo. Os outros três não conseguiram ir além das próprias
portarias que o nomeavam. Recebendo “carta branca” do Bispo, Padre Gualberto em
pouco tempo reconstruiu todo o velho prédio da Ação Católica, e no terreno
vizinho, que pertencia à diocese, triplicou a área coberta e transformou a sede
da FAFIC, num belo edifício.
Em 1970, já realizava o primeiro
vestibular. O sonho de muitos cajazeirenses se tornava realidade e já não era
mais preciso os estudantes secundaristas, juntamente com os universitários, nos
cortejos momescos, realizarem o enterro simbólico da faculdade de filosofia.
Jornadas longas, penosas, dolorosas e
difíceis foram enfrentadas e vencidas. Verdadeiras maratonas na busca de
professores, na compra de equipamentos, na formação do acervo bibliográfico e
nos entraves burocráticos do Ministério de Educação, sem esquecer o temido
Conselho Federal de Educação e seus fiscais, eram lutas constantes na vida
deste educador.
Quantos quilômetros terá percorrido o
Padre Gualberto entre Cajazeiras, João Pessoa, Recife e Brasília, ao longo dos
nove anos à frente da FAFIC? Os nossos laços de amizade se estreitaram tanto,
que nas suas viagens para o Recife, se tornara por exigência nosso hóspede, no
apartamento onde estudavam os filhos e os netos de seu amigo Arcanjo. O quarto
onde dormia, ficou inclusive conhecido até hoje como “o quarto de Padre
Gualberto”. Servi muitas vezes, com prazer imenso, de motorista e guia em suas
andanças na busca contínua e apaixonada da consolidação da faculdade. As
viagens eram quase sempre feitas no seu famoso “fusquinha”, que rasgava as
estradas poeirentas da BR-230. Nas longas conversas , durante as viagens, se aprofundavam
os sonhos, mesmo sabendo que eram muitos os espinhos a ferir nesta dolorosa
estrada, mas à vontade de vencer sempre apontavam os caminhos da esperança e a
certeza de que todo aquele trabalho não seria em vão.
Ao concluir o curso de História em 1971,
em Recife, já em 1972, recebi o convite de Padre Gualberto para dar aulas na
FAFIC, no curso de História. Regressei para Cajazeiras e nesta ocasião a recém
diplomada, também pela Universidade Católica de Pernambuco, a professora Maria
Antoniêta Cavalcante, riograndense do Norte, se incorporou a uma plêiade de
docentes já contratados pela faculdade. Era o pioneirismo. A vanguarda.
Os alicerces estavam feitos. Não havia
mais como parar a construção desta catedral de sonhos que era a implantação e
consolidação do projeto pioneiro da interiorização do Ensino Superior no
Nordeste brasileiro. Processava-se uma inversão de valores. Concretizava-se uma
revolução. Na cabeça dos “intelectuais” do litoral, na considerada elite
pensante das praias da capital, além de não acreditarem no projeto, lisonjeavam
e até faziam piadas e galhofas do empreendimento. O sorriso largo, acompanhado
de uma boa e gostosa gargalhada era a resposta que Padre Gualberto mandava para
os incrédulos.
O governo do Estado se tornou parceiro
na caminhada, na figura de João Agripino. O Deputado Federal Wilson Leite Braga
e o Senador Rui Carneiro se irmanaram na luta de Padre Gualberto. Algumas
instituições estrangeiras atenderam os pleitos do Diretor da FAFIC e para aqui
vieram da Alemanha professores e recursos.
Padre Gualberto tocava sua obra com
carinho e perseverança. Os recursos que aportavam na tesouraria se
multiplicavam milagrosamente. Alguns fatos me despertavam a atenção no dia do
pagamento do pessoal: o cheque que Dona Maria, a zeladora da escola, recebia
era do mesmo valor que o cheque do Diretor: um salário mínimo. O
desprendimento, o gesto de doação e o seu sacerdócio elevavam cada vez mais
junto aos que o cercavam a admiração e o respeito pelo seu trabalho. O caráter
do diretor e a firmeza nas decisões cada vez mais credenciavam a instituição. A
FAFIC se consolidava.
Padre Gualberto dirigia ao mesmo tempo a
FAFIC e o Colégio Diocesano Padre Rolim. Ambos com a mesma abnegação. Costumava
brincar quando lhe perguntavam como iam as duas escolas: “é uma ceguinha
puxando a outra”, referindo-se as dificuldades porque sempre passaram as
escolas particulares deste País.
Um dos momentos mais fortes e de imensa
e incontida alegria, que vi na vida deste sacerdote, foi quando o Conselho
Federal de Educação, reconheceu os cursos da FAFIC, após um longo e doloroso
processo. As milhares de páginas que faziam parte do processo, foram levadas de
ônibus para Brasília sob a guarda de um dos dedicados funcionários da casa, que
depois se tornou professor da UFCG, Francisco Valdeberto de Lira. Foi um dia de
festa. Houve até um feriado extra.
Um capítulo a parte na vida deste
sacerdote é o que trata da implantação do CAMPUS V, da UFPB em Cajazeiras.
Somente dois homens com a coragem e a visão do bem comum, poderiam praticar tal
ato: Padre Gualberto e Dom Zacarias Rolim de Moura. Em 1979, no dia 1º de
agosto, a FESC transferiu todo o seu acervo para a Universidade Federal da
Paraíba. Fez-se tudo isto por amor a causa da educação. A FAFIC era uma
instituição particular. Pagava-se mensalidade. A partir de então a cidade e
toda região ganhavam uma unidade de ensino superior pública e gratuita. Não se
pode avaliar o bem e a grandiosidade deste gesto. Em pouco tempo o orçamento do
Campus V era superior ao da Prefeitura Municipal de Cajazeiras. A amizade
conquistada pelo Padre Gualberto, junto ao Reitor da UFPB, quando o mesmo ainda
era um dos diretores do MEC, em Brasília, professor Linaldo Cavalcanti, foi
fundamental para esta importante mudança. Linaldo e Gualberto se irmanaram na
consolidação da interiorização do ensino superior no interior da Paraíba.
Estes são apenas alguns fatos e atos da
vida deste homem que dedicou mais de 40 anos de sua vida a serviço do povo de
Cajazeiras e da região. Uma vida pautada na honradez de caráter, na honestidade
dos atos e ações, na fidelidade e obediência ao seu sacerdócio, no reconhecer a
gratidão dos que lhe ajudaram, num sertanejo que se sentia agredido ao ver a
miséria e a fome, de conversa inteligente e saudável e sempre de palavra
confortadora e alegre.
Foram muitos os momentos, nos trinta e
oito anos de convivência e que privei da sua amizade e tive a felicidade de
beber no cálice de sua sabedoria. Eu e minha esposa Antonieta tivemos a grata
satisfação de tê-lo como padrinho do meu primogênito, Sávio, que se orgulhava
de ser seu afilhado. É apenas um testemunho de um grande admirador. Com certeza
a história lhe fará justiça e Cajazeiras lhe será grata pelos grandes
benefícios praticados aos seus filhos e a sua gente. Resta-nos a sua lembrança
e uma imensa saudade.
*Professor
e Diretor Presidente do Sistema de Comunicação Rádio Alto Piranhas e Gazeta do
Alto Piranhas
DEZ ANOS SEM O MONSENHOR LUIS GUALBERTO DE ANDRADE
Reviewed by Clemildo Brunet
on
6/24/2017 09:39:00 AM
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