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A celeridade processual, a extinção (agregação) de Comarcas ou a humanização dos processos ?



 Por Teófilo Junior*

Não interessa a ninguém nem a sociedade que um processo judicial se torne eterno, esquecido de decisão em uma prateleira de algum cartório ad perpetum, tornando-se símbolo da morosidade da justiça. Por outro lado, não se pode almejar que apenas a celeridade processual se paute como elemento “central” a ser perseguido na difícil tarefa de distribuir justiça nesse país.

Hoje, o que parece se desnudar ante o volume de ações a serem enfrentadas pelo Judiciário brasileiro é que os processos judiciais no Brasil estão correndo um sério risco de perderem a humanização e se transformarem apenas em números, em metas estatísticas, onde o que vigora é a necessidade de extinguir o processo, preencher formulários de sentença,  julgar a ação, diminuir o número dos processos, embora isso nem sempre represente a extinção do conflito que o originou. Processo findo, nem sempre representa garantia da boa prestação judicial. Sentença prolatada não é certeza de resposta humanitária e se não é humanitária não é distribuição de justiça, é letra fria escrita no tecnicismo do mármore formal do judiciário brasileiro.   

Com efeito, a exclusão jurídica assim como a social, fragiliza e transporta o homem a condição de invisível, divorciado da conjuntura jurídica vigente, ignorando a boa percepção do homem pelo homem e afrontando os direitos naturais da dignidade humana que alicerçam fundamentos constitucionais e até normas de caráter internacionais.

É certo ainda que não se pode abordar o tema da humanização do processo sem invocar a presença das pessoas, atores envolvidos nessa cena, povo, tempo, Estado, conflito, justiça.

Indubitavelmente, todo o princípio doutrinário e jurídico que existe sobre a oralidade do processo e a presença de um juiz é, sem sombra de dúvidas, uma garantia do cidadão a um processo justo, democrático e igualitário. Não se concebe que um processo possa percorrer todos os seus trâmites legais com toda a “agilidade” sem que haja a presença de manifestações orais ocorridas por meio do contato direto e imediato do cidadão com o juiz no universo dos autos.

O que nos parece certo é que enquanto a sociedade clama por ser ouvida, o judiciário brasileiro, em nome de uma celeridade processual arriscada, cada vez mais reduz e mitiga a voz das partes e das testemunhas no processo. Fecham Comarcas sob os mais diversos argumentos, sobretudo, o orçamentário, relegando a segundo plano a  função precípua da acessibilidade do povo clamar por seus direitos. 

Há magistrados, inclusive, que têm extrema facilidade de dispensar as oitivas das testemunhas e das partes, como se elas nada tivessem a acrescentar, a dizer de relevante para a solução dos conflitos. Evidente que para a sociedade a leitura que se faz disso é a de uma sensação de um constante distanciamento entre o judiciário e o povo, que ganha força ante o excesso de formalismo dos tribunais. Isso tudo gera um conflito pautado na ausência de legitimidade ante o descompasso entre o que judiciário oferece ao cidadão e o que este suscita esperar do judiciário. Um dilema muito mais sério que o da morosidade da justiça.

Não raramente o que se vê é que o processo não passa de mais um número arábico lançado num sistema eletrônico de acompanhamento processual. Primeiro, as partes perdem o nome e ganham números como identificadores. Os processos caminham, a passos largos, em direção a perder-se do seu cunho humanitário, tornando-se cadernos estatísticos, dígitos que precisam de celeridade, quase sempre em sacrifício das angústias e essência humana que os permeiam.

Agora, já se pleiteia até a substituição de Servidores por decisões tomadas pela inteligência artificial, a máquina substituindo o homem, o foco é o orçamentário e a automação. Justiça e humanidade é questão do povo. Se para o Estado o processo significa dispêndios, de outro modo, para a pessoa, para as partes, ele é, quase sempre, único, indivisível, o fio de esperança, a oportunidade da pessoa se expressar numa audiência com seus anseios, pleitos, e principalmente de se posicionar defronte a um juiz.

Tem o cidadão o direito de falar e o judiciário por sua vez o dever de considerar toda manifestação oral no processo, isso representa, no mínimo, um processo justo, humano e democrático. Mas não se espantem, brevemente máquinas preencherão modelos pré-definidos, algoritmos sentenciarão processos.

O juiz precisa, antes de tudo, ser muito mais que um técnico prestador de respostas judiciais. O Magistrado deve ser um ente “orgânico”, vertebrado, capaz de somar aos elementos frios do processo a fervura das emoções, transformar-se numa simbiose mútua em que possa mostrar-se organicamente uno com as questões que afloram aos reclames dos autos do processo. E saber ouvir, oportunizar a audição é um passo muito importante nessa direção simbiótica. A inteligência artificial jamais fará isso! 

A oralidade tem o condão de trazer a frieza dos papéis aspectos muito mais humanos. É possível através da oportunidade das inquirições se acolher uma série de elementos, inclusive de cunho emocionais das partes que podem interferir diretamente no resultado da ação. Ali, a testemunha ou as partes são homens que falam ao juiz, com todas as suas prerrogativas, aflições, medos, emoções, expectativas. Suas falam não afastam a celeridade das ações, mas possibilitam uma prestação célere sem que se afaste a possibilidade de uma efetiva participação no processo.

O fechamento (agregação) de Comarcas e o distanciamento da Justiça será um duro golpe para aquele João da Silva,  cidadão comum, homem do povo, carente de recursos e de conhecimento, sem voz, preso em suas impossibilidades de reclamar o seu direito. Distante da suntuosidade dos palácios.  A ausência de sua oralidade no corpo do processo representa outro meio incontestável de exclusão judicial vigente. As pessoas têm muito a dizer e querem dizer. O que falta é a humanização dos processos, o enxugamento das formalidades e do preciosismo tão presentes no Judiciário brasileiro.

Teófilo Júnior

Teófilo Júnior
*Jurista, Escritor, Cronista e Poeta
A celeridade processual, a extinção (agregação) de Comarcas ou a humanização dos processos ? A celeridade processual, a extinção (agregação) de Comarcas ou a humanização dos processos ? Reviewed by Clemildo Brunet on 10/12/2019 08:52:00 AM Rating: 5

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