CARDOSO VIEIRA: O HOMEM E O SEU TEMPO
Capítulo I
Quando entro numa livraria sinto-me tomado pelo desejo de comprar o máximo de livros. Por isso quero ver a maioria dos títulos que estão expostos nas gôndolas de conformidade com a minha escala de preferência. É muito gostoso ter em sua frente centenas de livros de autores diversos.
O ambiente de uma livraria me fascina a ponto de sentir-me qual uma criança perdida numa loja de doces. É isso mesmo, pois quero levar a maioria dos livros, mas, só posso comprar alguns, posto que, a minha disponibilidade orçamentária para financiar encargos dessa natureza tem lá os seus limites.
Numa ocasião estava na livraria do saudoso amigo Luiz, aqui na galeria Augusto dos Anjos. Sentei a mesa, pus-me a ler a orelha de um livro de teoria econômica o que habitualmente costumo fazer. Na mesma mesa sentou-se um senhor com o mesmo propósito. Não sabia quem o era.
Pôs-se a ler um livro de gênero diferente, que não me lembro bem de qual autor. Alguns minutos depois começamos a falar sobre o prazer que a leitura nos proporciona, não só como lazer, mas como fonte inesgotável de acumulação de novos conhecimentos.
Não nos identificamos para sabermos quem era quem, neste primeiro encontro. Continuamos a nos encontrar no mesmo lugar, pois estávamos sempre a procurar novos títulos nas prateleiras, ainda degustarmos o saboroso cafezinho, que era oferecido aos costumeiros freqüentadores do ambiente.
Depois de sucessivos encontros, o amigo em formação, identificou-se: eu sou Eduardo Martins. Da mesma forma identifiquei-me: eu sou Ignácio Tavares. Foi um momento em que duas pessoas estavam a formar uma amizade duradoura.
Ao me olhar com ares de admiração falou: ah, você pertence a uma estirpe de intelectuais renomados do nosso Estado, não é? Fiquei sem jeito, pois jamais ousei fazer parte do seleto grupo de intelectuais paraibano. Perguntou-me: já ouviu falar de Lira Tavares, Eurípedes Tavares, Tavares Cavalcante, Epominandas Tavares de Araujo?
Confirmei que tinha conhecimento da existência dessas criaturas, principalmente Epominandas que era parente próximo do meu pai, o senhor José Tavares de Araujo. Acrescentei: acontece que sou também da família Cardoso. Quero dizer que não sou apenas Tavares.
Você é da família Cardoso? Ora, por que tanto espanto? Perguntei-o. Respondeu-me: é porque estou a fechar a biografia de Manoel Pedro Cardoso Vieira. Completei: o nome desse cidadão é bastante citado na tradição oral da minha família. A conversa ficou mais animada.
O que o seu povo fala sobre ele? É o seguinte: no fim da década dos anos oitenta do século XIX, esse rapaz ocupava um importante cargo na administração do Estado. A família Cardoso de Pombal, sabedora desse fato, em razão da seca de 1877, enviou um mensageiro, a fim de obter gêneros alimentícios, pois, o governo estava a distribuir alimentos pras regiões castigadas pela seca.
Ele atendeu? Respondi: claro que sim. Não só atendeu como também procurou saber se os irmãos João Ignácio Cardoso D’Arão e Francisco Ignácio ainda estavam vivos, pois os dois eram primos legítimos do seu pai, Pedro Cardoso Vieira.
O mensageiro enviado pela família, no meio familiar, era conhecido por Caboclo Liberato. Outras viagens foram realizadas, o que permitiu uma aproximação maior entre os dois. Em razão desse relacionamento, Manoel Pedro convidou Caboclo para ingressar na Guarda Nacional, o que de pronto foi aceito.
Em seguida, José Sátyro de Sousa, também da nossa família e avô da minha mãe, ingressou na Guarda Nacional. Por fim, Abel Ignácio Cardoso, irmão de Benigno Ignácio Cardoso ingressou na corporação, da mesma forma, sob os auspícios do ilustre parente Cardoso Vieira.
Ao contar esses fatos, Eduardo Martins, conhecedor da vida de Cardoso Vieira, confirmou as possibilidades das nomeações terem ocorridas, posto que Manoel Pedro, naquela ocasião, era o todo Poderoso chefe da Guarda Nacional, pois, estava a ocupar a Secretaria do Interior e Segurança do Estado, quando correu a seca de 1877.
Quem era o cidadão Eduardo Martins? Foi incansável pesquisador, bibliófilo, jornalista, historiador, sobretudo um homem do bem. A partir desse encontro nos tornamos amigos íntimos. Os encontros tornaram-se mais recorrentes, sempre no mesmo lugar, seja a Livraria do Luis.
Em razão dessa amizade aos poucos fui repassando mais informações sobre a origem da nossa família. Mesmo assim as perguntas sobre a família Cardoso continuaram. Quis saber como eles foram parar em Pombal, bem como as razões pelas quais eles migraram pra o sertão paraibano. Quanto mais respondia mais perguntas eram feitas.
Pra ele foi um deslumbre tudo a que estava a escutar sobre a referida família. Muito do que lhe falei, em parte ele já sabia. Chegou até pensar que não existisse mais nenhum parente de Cardoso Vieira, pelo menos aqui no Estado da Paraíba. Isso porque boa parte da família fixou residência em Recife, outros migraram pra o sertão cearense, enquanto outra parte dispersou-se pelo Brasil afora.
Eduardo me parecia engraçado. Olhou pra mim e falou: você apresenta um leve traço fisionômico de Cardoso Vieira. Esbocei um riso de dúvidas, pois não conhecia nenhuma fotografia do dito cujo. Pensei: Eduardo está querendo me agradar ou então está querendo gozar da minha cara.
Depois que ele me mostrou a fotografia, vi que tinha algo a ver, porem, não tanto o quanto estava a pensar o saudoso amigo. No próximo capítulo tentarei definir o perfil de Cardoso vieira segundo Eduardo Martins. Aguardem.
OBRA DE EDUARDO MARTINS
Era um apaixonado pela trajetória de vida de Cardoso Vieira. Jovem de inteligência rara, irrequieto, por isso um intelectual precoce. Ingressou na Faculdade de Direito de Recife, ainda quase adolescente. Foi da mesma turma de Joaquim Nabuco, Castro Alves, entre outros expoentes, dos quais falarei depois, que no futuro tornaram renomados intelectuais da Nação Brasileira.
No próximo capítulo falarei sobre a obra de Eduardo Martins, cujo título é ¨O Bossuet da Jacoca¨. A Jacoca era a fazenda do seu pai Pedro Cardoso Vieira, onde hoje se localiza o município do Conde. Alem do relato sobre a sua infância, a vida como estudante na velha Faculdade de direito de Recife, Eduardo conseguiu resgatar a maior parte dos discursos proferidos por Cardoso Vieira no plenário da Câmara Federal, enquanto representante da Paraíba, no ano de 1879. Aguarde, tem mais.
João Pessoa, 06 de março de 2012
*Economista e escritor pombalense*
CARDOSO VIEIRA: O HOMEM E O SEU TEMPO
Reviewed by Clemildo Brunet
on
3/06/2012 04:08:00 AM
Rating:
Nenhum comentário
Postar um comentário