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MINHA INFÂNCIA PELO VÉU DA SAUDADE

Francisco Vieira

Francisco Vieira*

Oh! Quão grande é a saudade de Pombal da minha infância e adolescência.
As primeiras lembranças se remetem aos amigos com os quais dividi sonhos e aventuras. Hoje, sexagenário, sinto o peso da idade, contudo, carrego as recordações que o tempo, com o tempo não apagou.
A imagem do espelho, comparada ao retrato na parede desbotado pelo tempo, denuncia minha idade marcada pelos sulcos da face. Atônito, o coração bate descompassado com saudades da criança viçosa e do jovem sonhador daquela época. Entretanto, daria tudo para viver tudo outra vez.   
Queria sem temor, caminhar sossegado pelas ruas de Pombal, raridade nos dias de hoje, temendo apenas as investidas de desajuizados como Mané Doido, Barrão Setenta, Açoite e outros. Poder saborear os cavalinhos de goma do Cego Roseno, os pastéis de D. Petronília, o pão com creme de Toinho da Bodega e a bolacha peteca de Seu Napoleão.
Sob um véu da imaginação me vejo com os velhos amigos de infância a jogar bola de meia, soltar pipa, puxar carrinhos, brincar de bang-bang, tomar banho de chuva ou mergulhar nas águas do Rio Piancó.   
Revivo o tempo das Lojas Paulista, Casas Bandeira, Loja dos Pobres, A Calçadeira, Camisarias Ideal e Gouveia, Império das Novidades, Casa Borborema, oferecendo as últimas novidades da moda em roupas, calçados e miudezas. Eram irresistíveis as fragrâncias de Acapulco, Madeira do Oriente, Promesa, Charisma, Toque de Amor, Topázio. Que elegância calçar sapatos Vulcabrás, cavalo de aço, kichute, conga, sete vidas e vestir camisas ban-lon, Fio Escócia, etc. Preferir o Café Dácio, Fubá Piragibe, Sal Adonai e Macarrão Martoci era valorizar os produtos da terra, além dos armazéns Irmãos Josias, Irmãos Assis, Padaria Vitória de Napoleão Brunet, Luis Barbosa e as tradicionais mercearias A Triunfante de Antonio Vieira, Toinho da Bodega, Seu Nezinho, Juca Arruda, Otacílio da Cocada e outros. E, prevenindo a saúde, consultar com Dr. Atencio, Avelino, Porfírio, Isaias Silva, Otávio Maia, Ademar Pereira, Saraiva e Antonio Pedro e aviar a receita na Farmácia Queiroga, Seu Nem Formiga, Possidônio ou Zé Maximiano.   
Vejo Pombal no tempo do Grande Hotel de Chicó e Hotel Central de Chico Caetano, paradas obrigatórias da Viação Gaivota, Andorinha, Expresso de Luxo e todos que cruzavam a cidade.
Como era chic jantar no Restaurante Manaíra de Cabine, o melhor cardápio da cidade. Poder saborear abacatada no Bar de Zé Preto, degustar o doce de leite no Café de Madalena e a cocada de Maria Batista.
A mente aguçada não me permite esquecer a Festa do Rosário, Vaquejada, Semana Universitária, chegada do Parque Maia, o circo do Palhaço Batatinha erguer seus mastros para uma temporada, o cartaz do cinema anunciando em duas sessões “Coração de Luto”, enquanto o carro de propagandas convidava os desportistas para o jogo São Cristovão e Pombal Esporte Clube no Estádio Vicente de Paula Leite.
Ainda ouço emocionado Ray Conniff, Poly, Saraiva, cantores românticos e da Jovem Guarda que me remetem imediatamente ao Cine Lux e aos anos sessenta. Literalmente me vejo nos “assustados” e festas do Pombal Ideal Clube e AABB dançando ao Som dos Águias e bailando com Lenice como uma caravela cearense.
Numa apologia ao humor, ter de volta Saturnino Santana, Zezinho Sapateiro, Pedro Corisco e João Lindolfo, com o mesmo espírito lúdico fazer sorrir até mesmo o mais circunspecto dos homens. Sem eles nossa história seria incompleta e sem graça.
Ainda recordo o Ginásio Diocesano e o Colégio das Freiras com sua farda de saias plissadas envolvendo lindas garotas. Que pena que o Grupo Zé Avelino, DNER, Cine Lux, Casa do Altinho, Brasil Oiticica, Praça do Pirarucu existem apenas na lembrança de pombalenses que lamentam como eu a destruição de parte de nossa história.
Numa alegria tão minha, queria ver as Praças Getúlio Vargas e Centenário como em outros tempos, livres de agressões ao projeto arquitetônico original, fazendo jus ao conceito de mais bonito espaço público do estado.
Por força do pensamento, vejo Zé Bigodão e Valério trocando lâmpadas, Diasa, Raimunda de Aristides e Doutor Cambista passando jogo, o Mudo vendendo revistas, enquanto Ciço Bem-bem oferece “peixe fresco” e Ribinha, faz acrobacias na bicicleta no meio da feira.
O passado é tempo vivido. Se nostálgico ou não, nada importa,  pois nosso passado em Pombal é comum a todos e dele não desvencilhamos.
Na vida alguns dias passam despercebidos, outros ficam marcados, por isso, sempre lembrados, daí a assertiva: para não esquecer é preciso lembrar, mesmo que seja pelo véu da saudade.
Desculpe, vou parar. Estou ouvindo o som da Pedra do Sino.
Pombal, 18 de Outubro de 2018.
*Professor e Escritor pombalense.
MINHA INFÂNCIA PELO VÉU DA SAUDADE MINHA INFÂNCIA PELO VÉU DA SAUDADE Reviewed by Clemildo Brunet on 10/20/2018 12:16:00 PM Rating: 5

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